O país vive hoje uma grave crise das instituições, que põe em questão tanto a credibilidade das pessoas que as representam quanto a sua eficácia em atender o que se denomina de republicanismo, a saber a medida em que elas servem ao interesse geral ou apenas se voltam a demandas fragmentadas. Sim, na sociedade em rede, não só as corporações se organizam para se apropriar do que deveria ser de todos, mas diferentes grupos de interesse, de forma que a “res” pública acaba desfigurada.
Essa privatização da coisa pública não é recente, há muito que grupos sociais veem no poder público uma maneira de gerar emprego e renda em benefício próprio. O que muda, em tempos de redes sociais, é a pulverização dos agrupamentos que querem participar da partilha. Com isso, a visão de que o papel do Estado é prestar serviços públicos a todos e, em especial, àqueles de que mais necessitam de uma estratégia de nivelamento de diferenças de origem socioeconômica no acesso a oportunidades, perde-se.
A constatação de que pode ocorrer uma pilhagem da máquina pública levou a controles cada vez mais cerrados que, se não coíbem a corrupção ou a captura por parte de interesses corporativistas, dificultam sobremaneira a boa gestão.
Ora, é justamente pela inadequação das regras que exceções acabam sendo toleradas (porém nem sempre reguladas), para não inviabilizar programas, especialmente em pesquisas, saúde ou cultura.
A verve normativa certamente não é o melhor caminho para assegurar o republicanismo limitado das nossas instituições democráticas. Há que se construir um processo de controle social, de transparência de procedimentos, inclusive por meio de simplificação, de punição mais rápida de malfeitos e de educação para a vida em coletividade.
Aliás, esta é uma das funções da educação: ensinar a viver em sociedade. Isso passa certamente por valorizar o que é público, já que é de todos. Há muitos anos Fernanda Montenegro clamava contra o vandalismo que atinge bens públicos, numa compreensão equivocada de alguns jovens de que o que é público não seria de ninguém; na verdade, trata-se exatamente do oposto.
A construção e o fortalecimento do republicanismo envolvem assim a valorização das nossas instituições adolescentes, a criação de um conjunto de regras mais adequadas ao século em que vivemos, a responsabilização dos que conspiram contra o que é de todos e uma educação que trabalhe não apenas competências cognitivas, mas valores e atitudes. Precisamos formar jovens autônomos, responsáveis com o coletivo e engajados na construção de um país mais justo, democrático e republicano.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 08/09/2017
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