Aos 16 anos, Bruno Dornelas de Castro tinha um emprego no comércio. Mas não era isso que sua mãe queria para ele. Achava que o mais importante, naquela idade, era o foco nos estudos. Bruno atendeu ao pedido da mãe, deixou o emprego e se formou no ensino médio no ano passado. Havia chegado a hora de entrar na faculdade. Mas as coisas mudaram desde então. Com a inflação em alta atingindo em cheio o orçamento da família, o rapaz, hoje com 18 anos, agora precisa voltar a trabalhar para bancar os estudos.
A realidade de Bruno é a mesma de milhares de brasileiros que, de repente, se viram na obrigação de voltar ao mercado de trabalho para ajudar nas despesas domésticas. Essa mudança é provocada tanto pela disparada dos preços, que corrói a renda, quanto pelo desemprego de membros da família, o que compromete o orçamento. Só em maio deste ano, o número de chefes responsáveis pelo sustento do domicílio que estavam desempregados subiu 54,4% em relação a igual mês de 2014, segundo a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE. Com isso, a procura por trabalho aumentou, principalmente entre jovens e mulheres.
Mas achar emprego não tem sido uma tarefa fácil. Bruno, por exemplo, está inscrito no site Vagas.com desde novembro do ano passado, mas ainda não obteve sucesso. “Fiz algumas entrevistas, mas tive resposta apenas de duas (empresas), e uma delas explicou que a resposta era negativa porque estava cortando gastos”, conta o rapaz, que vive com a mãe e o irmão mais velho na Vila Erna, zona Sul da capital paulista. “Mas preciso do trabalho para continuar minha formação.” Em maio, a taxa de desemprego medida pela PME para todas as faixas etárias subiu para 6,7% – um ano antes, estava em 4,9%. O aumento de 1,8 ponto porcentual foi o maior já observado na pesquisa.
O economista Rodrigo Leandro de Moura, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), calcula que 65% dessa diferença é explicada pela maior procura por emprego. “O principal motivo é a piora do mercado de trabalho e a perda na massa de rendimentos da família. Isso vem forçando cada vez mais pessoas a procurar trabalho para recompor a renda da família”, diz.
Mesmo assim, o desejo persistente dos pais de que os filhos estudem ainda tem funcionado como linha de defesa. Em alguns casos, as mulheres têm voltado ao mercado de trabalho antes dos jovens. Prova disso é que a taxa de participação (número de pessoas ativas, trabalhando ou procurando emprego, em relação ao número de pessoas em idade de trabalhar) já está crescendo entre as mulheres, de 47,8% em maio do ano passado para 48,2% em maio deste ano.
Mas o jovem não escapa da nova missão de salvar o orçamento da família. A taxa de desemprego entre pessoas de 18 a 24 anos, que era de 12,3% em maio do ano passado, saltou a 16,4% em igual mês deste ano. “O jovem não necessariamente vai deixar de estudar. Mas ele pode voltar (ao mercado de trabalho) para ajudar na renda”, explica Moura.
O economista projeta uma contribuição cada vez maior da busca por trabalho para a elevação da taxa de desemprego, que deve atingir, segundo ele, 6,5% neste ano e 8,0% em 2016 pela PME. A busca pelo incremento na renda das famílias brasileiras mostrou-se necessária diante do aumento do desemprego. Ao todo, 479 mil chefes de família estavam na fila por uma vaga em maio, 169 mil a mais do que em igual período do ano passado. A taxa de desemprego neste grupo, considerando as seis principais regiões metropolitanas do país, subiu de 2,7% para 4,1%.
“Todas as vezes em que temos problema no mercado de trabalho, começamos a perceber queda no emprego com carteira assinada e na renda. Com isso, a estabilidade do seio familiar fica ameaçada”, explica Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE. “Nessa situação, a perda de emprego do chefe é o que afeta o seio familiar. Se o pai não conseguiu manter o emprego, o filho vai ter de ir para a fila do desemprego.” Com isso, outros membros da família precisam cada vez mais somar esforços para pagar as contas e quitar as dívidas da casa. Em um ano, cerca de 285 mil pessoas neste grupo passaram a buscar emprego – quase metade não trabalhava anteriormente.
A taxa de desemprego de outros membros da família deu um salto ainda maior, de 6,8% em maio do ano passado para 9% em maio de 2015. Mas especialistas acreditam que o número ainda pode ir além. Com a grande formalização dos trabalhadores nos últimos anos, chefes de família dispensados recentemente contam com a “proteção” do FGTS e do seguro-desemprego. No entanto, se o mercado de trabalho demorar a retomar o fôlego, o fim dessas reservas financeiras pode jogar ainda mais gente na fila do desemprego.
No caso dos jovens, a volta ao mercado de trabalho tem um outro ingrediente: o imbróglio envolvendo o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). O corte no volume de recursos disponíveis para o programa deixou estudantes preocupados sobre sua capacidade de bancar as mensalidades, o que fez muitos partirem para a distribuição de currículos na tentativa de evitar o abandono da universidade.
“A maior limitação do Fies, no âmbito do ajuste fiscal, é mais um impulso para fazer com que pessoas que estavam antes paradas voltem ao mercado de trabalho”, afirma Rafael Bacciotti, economista da Tendências Consultoria Integrada. O movimento vai na direção contrária do cenário verificado há apenas um ano, quando a inatividade era impulsionada por idosos e jovens que optavam por não trabalhar nem procurar uma vaga.
Fonte: Época.
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