Chefe de gabinete e secretária de Fazenda estão entre os que recebem acima do teto de R$ 27,4 mil; prática é permitida pela lei. Prefeitura ressalta que cortou em R$ 14 milhões despesas com encargos.
Apesar do discurso da austeridade desde a posse em janeiro, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, tem sido generoso com parte de sua equipe. Sete dos cargos comissionados nomeados pelo político têm salários acima do teto constitucional, segundo levantamento feito pelo G1 com base em dados do site de transparência do município.
Os sete nomeados por Crivella são os únicos dos 1.131 profissionais com cargo comissionado com os chamados “supersalários”. Na lista dos que recebem acima do teto, estão seu chefe de gabinete, Ailton Cardoso da Silva, e a secretária de Fazenda, Maria Gouvêa Berto, que tem como uma das principais funções conter as despesas do governo carioca.
A Prefeitura do Rio afirma que reduziu em R$ 14 milhões as despesas com pagamentos de encargos nos três primeiros meses deste ano, na comparação com os três últimos meses da administração anterior. Além disso, informa que cortou 1,5 mil cargos em comissão. Mesmo assim, ameaça atrasar salários por falta de recursos e culpa a gestão anterior pelas dívidas.
Entre os servidores de carreira, 709 ganham mais do que o teto de R$ 27.422,30. O valor é estabelecido pela Lei Municipal nº 3881, de 2004, e equivale a 81,22% do salário dos ministros do STF.
Prática não é ilegal
Apesar de passarem do teto, não há ilegalidade nos pagamentos. Não são considerados no cálculo da prefeitura rendimentos por gratificações, empregos de confiança, encargos especiais, jetons, verbas indenizatórias e outros encargos. Todo o salário dos cargos comissionados, por exemplo, sai dessas rubricas. Na prática, portanto, não há limite.
O salário bruto do chefe de gabinete do prefeito, por exemplo, foi de R$ 33,8 mil em março. Desse valor, R$ 12,1 mil foram enquadrados como emprego de confiança e R$ 21,7 mil como encargos especiais e jeton. Nenhuma das rubricas é considerada no cálculo do teto.
O mesmo acontece com os outros comissionados com supersalários nomeados por Crivella. A maioria está lotada na Secretaria de Fazenda. Além da chefe da pasta, com salário de R$ 30,8 mil, recebem mais que o teto a subsecretária de Orçamento, Andrea Ferreira de Araújo (R$ 32,3 mil), o subsecretário de Gestão, Rodrigo Fernandes Barbosa (R$ 29,4 mil), e a diretora financeira da Subsecretaria do Tesouro Municipal, Felicia Weiner (R$ 27,8 mil).
Completam a lista a secretária de Cultura, Nilcemar Nogueira (R$ 29,1 mil), e a subsecretária de Comunicação Governamental, Inni Vargas (R$ 28,3 mil). Já o prefeito recebe menos que o teto: R$ 18,9 mil. O salário mais baixo foi estabelecido na gestão anterior.
Ao todo as gratificações, jetons e outros benefícios somam R$ 164 milhões por mês e respondem por 38% de toda a folha de pagamento municipal.
Custo dos altos salários
Os supersalários custam R$ 22,4 milhões mensais à Prefeitura. Fiscais e engenheiros encabeçam a relação dos cargos mais bem pagos, mas há técnicos, enfermeiros, médicos, professores e até um astrônomo.
Enquanto o salário médio dos servidores municipais foi de R$ 4,9 mil em março, os supersalários foram em média de R$ 31,3 mil.
O fiscal de rendas Antonio Fernandes de Figueiredo e Sá ganhou o maior salário bruto de março: R$ 75,8 mil. Quem recebeu mais dinheiro na conta foi o engenheiro civil Sérgio Ferreira de Araújo, que retirou R$ 42 mil líquidos no mês.
No grupo dos que recebem mais que o teto, há também servidores cedidos à Câmara Municipal, mas que são pagos pela Prefeitura. Pelo menos cinco estão nessa situação, com salários de até R$ 32 mil.
Brechas na lei
O especialista em administração pública Paulo Calmon, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol/UnB), afirma que falta uma regra comum para definir o limite dos salários do funcionalismo público. Atualmente, explica, as câmaras municipais têm liberdade para definir os valores e cada município interpreta de uma forma o que teto ou extrateto.
“Não há uma interpretação única sobre o que deve ou não ser considerado no cálculo do teto constitucional”, diz. “Na prática, cada governo acaba interpretando a lei da forma que acha mais conveniente.”
O Senado aprovou no fim do ano passado um projeto de lei para limitar os supersalários no funcionalismo público. O PLS 449/2016 determina que os rendimentos de qualquer servidor ativo ou aposentado não poderão exceder o dos ministros do STF, atualmente de R$ 33,7 mil. O teto vale para a soma de todos os salários ou aposentadorias combinadas, inclusive de diferentes fontes pagadoras.
A proposta aguarda votação na Câmara dos Deputados desde 15 de dezembro de 2016. Atualmente, está em análise na Comissão de Trabalho, de Administração e de Serviço Público.
O que diz a Prefeitura
A Prefeitura do Rio informou que reduziu em R$ 14 milhões as despesas com pagamentos de encargos nos três primeiros meses deste ano, na comparação com os três últimos meses da administração anterior. Além disso, informa que cortou 1.500 cargos em comissão.
“Os números mostram, por exemplo, que a atual administração pagou em janeiro R$ 3,4 milhões em encargos. Em fevereiro, R$ 4,9 milhões e em março R$ 4,3 milhões, que somam no primeiro trimestre R$ 12,7 milhões. Só a nível de comparação, em outubro passado foram gastos com esses pagamentos R$ 9 milhões, em novembro R$ 8,9 milhões e em dezembro R$ 9,1 milhões, totalizando R$ 27 milhões”, informou em nota. “Na gestão anterior, o maior salário era de R$ 72 mil.”
A Procuradoria Geral do Município afirmou que o teto do funcionalismo municipal obedece à Constituição Federal e está amparado por decisões de tribunais superiores. Em nota, informou que para, fins de cálculo do teto, não devem ser somadas as seguintes rubricas: emprego de confiança; encargos especiais/jeton; gratificações; e verbas indenizatórias.
“Essas rubricas são verbas devidas em razão de atividades não abrangidas pela remuneração do cargo. Tal exclusão está prevista em decisão do Tribunal de Contas do Município, assim como na jurisprudência dos tribunais superiores nos julgados sobre o tema, em inúmeras ações envolvendo servidores municipais, bem como estaduais e federais.”
Informou ainda que, em cumprimento à Lei da Transparência, as informações disponíveis no portal da Prefeitura “têm como objetivo apresentar os rendimentos brutos dos funcionários da Administração Pública. Portanto, as rubricas ali apresentadas são um detalhamento adicional e os critérios usados na exibição seguem regras de controle administrativo interno”.
Fonte: G1
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