O quadro econômico frágil embute riscos elevados. E desta vez não há gordura a ser queimada. Uma recessão agora implicaria custos sociais muito maiores do que os de 2015, pois o desemprego está em patamares recordes de alta.
Crescem as recomendações para a adoção de políticas de estímulo com aumento dos gastos públicos, visando evitar um mal maior. No entanto, a busca de atalhos e saídas fáceis seria contraproducente, especialmente porque a crise econômica tem origem nos rombos fiscais. A cautela na condução da política econômica e o senso de urgência no avanço de reformas precisam ser redobrados.
Uma economia estagnada pode cair facilmente em recessão, pois é mais vulnerável a acidentes de percurso. Os economistas tratam os choques que impactam a economia como aleatórios, podendo ser favoráveis (como o bom clima favorecendo a safra agrícola) ou adversos (o contrário), mas sem prevalência de um ou de outro. Não se trata disso. O que discuto é que uma economia fraca acaba sendo gatilho para eventos desfavoráveis que agravam o quadro. Por exemplo, a insatisfação popular pode engrossar paralisações e greves, que machucam as finanças e a confiança de empresários e consumidores. Outro exemplo: a frustração com a arrecadação compromete a oferta de serviços públicos e programas de transferência de renda, e também alimenta a percepção de risco fiscal pelos investidores.
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Nesse contexto, qualquer volatilidade no exterior acaba potencializando o contágio doméstico, aumentando as incertezas do cenário econômico.
Além disso, a superação de choques e eventos adversos torna-se mais difícil. A crise da Argentina, por exemplo, tem impacto muito mais intenso sobre uma indústria que perdeu competitividade e pouco cresce. Imagine uma empresa operando no limite da viabilidade econômica, com margens deprimidas e custos fixos elevados – algo inevitável diante do custo Brasil. Uma redução das vendas pode ter efeito devastador, com demissões e encerramento de atividades.
As propostas para aumentar gastos públicos preocupam. Desviar do caminho para a disciplina fiscal seria uma escolha bastante arriscada e, no melhor dos casos, de benefício duvidoso.
Primeiro, expandir os gastos em um país com as finanças avariadas, com endividamento elevado que destoa da experiência de países parecidos e com reputação abalada só geraria mais desconfiança de investidores, tornando o esforço inócuo ou até negativo, dependendo do impacto sobre a taxa de juros.
Segundo, ocorreria a violação de regras fiscais: Lei de Responsabilidade Fiscal (novas despesas exigem definição de fonte de recursos); regra de ouro (disciplina o crescimento do endividamento) e regra do teto (limites ao aumento de gastos). Esta última foi essencial para trazer a inflação para baixo e a taxa de juros do Banco Central para patamares inéditos. Mudanças nas regras não são recomendadas. Algumas serão inevitáveis, como na regra de ouro. É crucial evitar, porém, sua desconfiguração. Abrir precedentes é sempre perigoso no Brasil, um viciado em gastança.
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Terceiro, é notável a baixa eficiência do gasto público, mesmo em investimento. Apesar dos muitos talentos na esplanada dos ministérios, falta um norte ao governo. Direcionar recursos para programas, sem um plano estruturado, seria desperdício.
Ameaçar ainda mais a confiança no Brasil, que está cada vez mais isolado na cena mundial, é risco que não se pode correr.
O que fazer, então, para reduzir os riscos de curto prazo? O ano de 2016 serve de guia. Mesmo antes de o BC cortar os juros e de reformas serem aprovadas, a recessão foi interrompida. A razão era uma agenda econômica clara e a capacidade política de entrega.
Sem agenda estruturada, as falas do presidente Bolsonaro têm sido na contramão do discurso de Paulo Guedes, enquanto os erros na política se acumulam. Sim, as palavras têm peso.
Fonte: “Estadão”, 16/05/2019