Trabalho com previdência privada desde 2005, ano em que foi introduzida a alíquota regressiva de IR para os planos PGBL e VGBL. Lancei o primeiro fundo multicarteira independente (não ligado a um banco ou corretora), e, por alguns anos, liderei a área de previdência privada da Gávea Investimentos.
No meu dia-a-dia, sempre encontrei pessoas que contribuíram para o fundo de pensão de sua empresa e que, ao se desligarem do emprego, descobriram o quão ruim foi sua decisão de contribuir para aquele plano.
Porém, o que me faz escrever esse artigo é o discurso dos atuais dirigentes da Abrapp — a Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar — que ouvi num evento recente.
Os diretores da Abrapp comemoravam duas inciativas que são um perigo para os participantes, as fundações e a economia brasileira (nesta ordem).
A primeira iniciativa é o trabalho feito pela Abrapp para conseguir a aprovação da ‘Adesão Automática dos Funcionários’ ao plano de pensão das empresas; a entidade cita como exemplo o sucesso dessa iniciativa em países desenvolvidos.
O que a Abrapp não diz é que a experiência internacional está longe do que a entidade está propondo aqui. De fato, a adesão automática é muito boa para os empregados de vários outros países, mas não para os brasileiros. Por quê?
Diferentemente do Brasil, os governos daqueles países incentivam as empresas de lá a acabar com seus próprios planos de pensão e substitui-los por um cardápio de planos de previdência privada (PGBL & VGBL) de diferentes instituições financeiras — o que aumenta o nível de informação sobre os investimentos disponíveis, a diversificação dos investimentos dos participantes e evita acordos comerciais entre as empresas.
É a velha estória do “core business”: o que uma empresa de minério ou cimento sabe sobre gestão de investimentos e metas atuarias?
Entendo a Abrapp não querer incentivar as empresas a oferecer PGBL e VGBL de seguradoras em vez de fundos fechados, o que faria a própria entidade perder sua relevância. Mas é um absurdo lutarem pela adesão automática antes de trabalharem para resolver uma questão que prejudica financeiramente a grande maioria dos colaboradores: aqueles que fazem a declaração simplificada do IR.
Hoje, quando um funcionário contribuiu para o fundo de pensão de sua empresa e faz a declaração simplificada do IR, ele não pode usar sua contribuição para redução do IR a pagar naquele ano e, quando sacar esse fundo fechado, vai pagar o IR novamente. Ou seja: existe sim uma bitributação de IR para todos os que fazem a declaração simplificada e contribuem para um fundo fechado. Isso dá milhões de brasileiros.
Se o investidor perde até 27,5% na entrada e até 27,5% sobre o total na saída, é muito difícil essa aplicação render, em termos líquidos, mais do que qualquer outra com o mesmo perfil de risco.
A segunda iniciativa da Abrapp é uma parceria para realizar investimentos junto com o BNDES. Vejam que absurdo: um fundo de previdência tem como obrigação rentabilizar o dinheiro dos seus cotistas. Já o BNDES existe para fomentar empresas ou setores emprestando recursos de longo prazo a taxas historicamente abaixo do mercado.
Qual a lógica dessa parceria para o participante? Perder dinheiro?
Ao se desligarem da empresa, os colaboradores dos fundos fechados não têm só alegrias: eles descobrem duas surpresinhas desagradáveis.
Descobrem que existe uma regra de tempo de casa que limita o valor a que eles têm direito da parcela que a empresa contribuiu. Aquilo que foi dito no passado — “contribua porque a empresa coloca o mesmo valor” — pode ser uma mentira, porque há fundações onde o máximo que o colaborador tem direito é 90%, independente do tempo de casa.
Descobrem também que não podem mudar para o regime regressivo de IR caso estejam no regime compensável ou progressivo.
Mas o pior mesmo é descobrir que, em muitos casos, eles não podem resgatar o dinheiro que investiram no fundo, e que serão obrigados a converter em renda para usufruir do seu dinheiro.
Imagine o funcionário fez uma aplicação no fundo de pensão da empresa, vai pagar IR duas vezes, não pode mudar o regime de IR, pode não ter direito a 100% da parte que a empresa contribuiu, e ainda tem que trocar seu saldo por um pecúlio, que sempre é uma decisão financeira muito arriscada.
Se esse exemplo, que é bem comum, se encaixa na sua situação, cuidado: você está perdendo dinheiro.
As armadilhas dos fundos fechados lembram aquela recomendação que o Ministério da Saúde faz sobre certos medicamentos: “Antes de consumir, consulte um especialista.”
Fonte: Brazil Journal, 17 de julho de 2017.
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