A Grande Recessão nas economias avançadas explica a celebridade instantânea de “O capital no século XXI” (2014), de Thomas Piketty. Como a queda do Muro de Berlim e os atentados de 11 de Setembro trouxeram popularidade ao Fim da História (1992), de Francis Fukuyama, e “O choque das civilizações” (2001), de Samuel Huntington. Cada época tem seu fenômeno político, midiático e editorial, argumenta o escritor venezuelano Moisés Naím, em artigo no jornal O Estado de S. Paulo de ontem.
Atribuir ao capitalismo a desigualdade econômica em toda parte e através dos tempos é tão simplista quanto atribuir ao diabo todos os males do mundo. Sim, a desigualdade cresce quando a taxa de remuneração do capital é maior que a taxa de crescimento econômico. Se a acumulação de riqueza sob forma de patrimônio imobiliário, ativos financeiros como ações e títulos de renda fixa ocorre a ritmo superior ao do crescimento da renda na economia, uma fatia cada vez maior do bolo está sendo apropriada pelos ricos. Os ricos abocanham também parcelas crescentes da renda se o governo estimula artificialmente os ganhos de capital nos mercados imobiliário e de ações e garante a riqueza acumulada em operações de salvamento de instituições financeiras, enquanto cai a fatia da remuneração do trabalho, que segue travada pela competição asiática. Se há períodos de selvagem acumulação capitalista, há também permanente destruição criativa de indústrias inteiras por inovações, bem como destruição financeira por investimentos excessivos ou em setores equivocados.
Os governos podem também criar ou destruir riqueza, concentrar ou desconcentrar renda. Décadas de combate à inflação sem disciplina fiscal aumentam a desigualdade no Brasil, pois os juros altos garantem elevada taxa de acumulação do capital financeiro e derrubam nossa taxa de crescimento. Por outro lado, o marco regulatório (tucano) que estimulou a ampliação da oferta privada de vagas universitárias e os programas (petistas) de democratização do acesso (Prouni, Pronatec, Fies) garantem a acumulação de capital humano em ritmo muito acima ao do crescimento econômico. Essa redistribuição da riqueza em uma sociedade do conhecimento é uma promessa de erradicação da pobreza, maior produtividade e desconcentração de renda no futuro.
Fonte: O Globo, 19/5/2014
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