“Já temos no Brasil o fundamental para se praticar uma democracia política no seu sentido eleitoral. Há hoje eleições periódicas e relativamente livres”, explicou a cientista política e professora da PUC-Rio Maria Celina D’Araujo, no debate “A democracia no Brasil: limites e desafios”, realizado pelo Instituto Millenium, nesta terça-feira, dia 16 de setembro, no Rio de Janeiro. Participou também do evento o sociólogo e doutor em geografia humana, Demétrio Magnoli. O debate, que foi mediado pelo advogado e professor da UERJ Gustavo Binenbojm, marcou o Dia Internacional da Democracia, celebrado no dia 15 de setembro e instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Maria Celina esclareceu que o papel dos partidos políticos no mundo inteiro é organizar a participação eleitoral. E, depois de eleitos os governos, os partidos dividem o poder de acordo com a participação que tiveram nas eleições. “O que existe de espúrio no Brasil não é o modelo político. Relaciona-se com outras dimensões da democracia como controles, prestação de contas, questões ética-moral e de justiça. O Tribunal de Contas apura informações sobre a investigação da Petrobras, por exemplo, e o Congresso engaveta por hábito. Os grandes problemas da democracia brasileira não têm a ver com a política. Estão relacionados com a impunidade e a corrupção,” defendeu.
Demétrio explicou que o Brasil goza de liberdades políticas plenas, mas não de democracia plena. Para ele, no sistema político brasileiro, não há liberdade partidária, apesar dos 32 partidos existentes. O fato de Marina Silva, que conquistou 20% dos votos nas últimas eleições presidenciais, não ter conseguido fundar seu partido comprova isso. “Os 32 partidos existem porque são reconhecidos pelo Estado e recebem verbas públicas, mas muitos deles não representam ninguém”, disse. Além disso, o sociólogo esclareceu que na administração pública federal brasileira há 30 mil cargos de livre nomeação que são capturados pelos partidos políticos para a obtenção de poder e tráfico de influência. As coalizões partidárias se dão em torno desses cargos e de tempo de TV na propaganda eleitoral gratuita.
A professora da PUC defendeu que a democracia é um processo que se aprende fazendo, que se aperfeiçoa, com ajustes ao longo do tempo. “É importante entender que partimos historicamente da ideia, debatida na década de 1920, de que o Brasil só estaria apto para a democracia quando dispusesse dos pré-requisitos necessários: eleitorado educado, com espírito cívico e sentimento de nacionalismo. O entendimento era que, primeiramente, se devia criar o povo perfeito para então se ter uma democracia boa,” lembrou. Ela ressaltou ainda que a reforma política não vai resolver todos os problemas. O sistema político é complexo e exige mais entendimento e reflexão. “Em todos os países, faz-se coalizões e alianças e se distribui poder. Isso é da política. Os países definem regras para isso e as cumprem. O problema é que, no Brasil, as regras não são cumpridas,” explicou Maria Celina.
Os dois especialistas apontaram que o cidadão brasileiro, como mostrou as manifestações de julho do ano passado, deseja que o Estado faça seu papel, oferecendo à sociedade bens públicos de qualidade: saúde, educação e segurança. “Hoje há o discurso da mercantilização da cidadania”, concluiu Maria Celina.
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