A Operação Lava-Jato deu uma dupla demonstração de força, depois de acuada nos últimos dias pela publicação de diálogos atribuídos ao então juiz Sérgio Moro e o coordenador dos procuradores de Curitiba Deltan Dallagnol.
Em São Paulo, numa investigação do ramo carioca da operação, foi preso o “doleiro dos doleiros” Dario Messer, foragido há um ano. No Rio, mas devido a uma ação do Ministério Público em Curitiba, foram presos vários executivos da Cervejaria Petrópolis, acusada de servir de canal de suborno para o grupo Odebrecht. O proprietário da empresa, Walter Faria, está foragido.
O procurador Eduardo El Hage, chefe da operação no Rio, disse que a prisão de Messer é um marco no combate ao crime organizado no país. Para os procuradores da Lava-Jato no Rio, o poder econômico de Messer, que controlava uma grande rede de doleiros, e a influência no submundo do crime, permitiram que nunca fosse preso.
De fato, o “doleiro dos doleiros” nunca havia sido preso antes, apesar de estar enrolado com a polícia desde o caso do Banestado, quase 20 anos atrás.
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Caso, aliás, em que o procurador Deltan Dallagnol trabalhou pela primeira vez com o então juiz Moro. Há outra coincidência nas operações de ontem: tanto a Cervejaria Petropólis quanto o doleiro Messer estão envolvidos em casos de corrupção e lavagem de dinheiro do ex-governador Sérgio Cabral, que recebia uma “mesada” de R$ 500 mil da cervejaria e usava o doleiro para enviar dinheiro para o exterior. Por essas e outras, Cabral está condenado a mais de 200 anos de cadeia. A prisão do doleiro, embora fosse o alvo das investigações, aconteceu ontem por acaso. Os policiais foram ao apartamento para fazer busca e apreensão de documentos, e encontraram Messer.
Sempre que sofrem uma derrota, os procuradores da Lava-Jato buscam dar demonstração de que a operação está forte e em atividade. Encontram um jeito de mostrar a resiliência da operação de combate à corrupção. A operação contra a cervejaria Petrópolis já devia estar madura, como várias outras estão, como disse o procurador Roberto Pozzobon, o que pressupõe que várias outras ações estão sendo preparadas.
Repete-se assim um método de atuação para mostrar que a Lava-Jato não se intimida diante de retrocessos provocados por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) ou do Congresso. Foi assim na prisão do ex-presidente Michel Temer, acontecida dias após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de enviar para a Justiça Eleitoral os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e assemelhados conexos ao de caixa 2.
Para fugir das restrições impostas pelo STF, a acusação contra Temer passou longe do caixa 2 e de financiamentos eleitorais. É o modus operandi da Operação Lava-Jato dar o troco para deixar a impressão de que não são passíveis de controle. Cada vez que sofrem uma derrota, dão o troco alto. A partir daí, os procuradores passaram a fazer as denúncias retirando a acusação de caixa 2, focando nos crimes comuns como corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, e outros, que são julgados pela Justiça Federal.
Foi assim com a prisão do então governador Luiz Fernando Pezão, logo depois da decisão do Supremo de permitir que o presidente Temer utilizasse a prerrogativa do indulto de fim de ano para anistiar presos de maneira quase irrestrita, o que ameaçava a atuação da Lava-Jato. Atitude similar ao que fizeram quando o STF proibiu a condução coercitiva de suspeitos. Os procuradores passaram então a usar a prisão temporária, de duração de cinco dias, prorrogáveis por mais cinco.
Como agora, no caso dos hackers presos acusados de terem invadido mais de mil números de celulares de autoridades, principalmente os ligados ao caso de Lula, confessadamente entregues ao site The Intercept Brasil, que controla o conteúdo a ser divulgado e o compartilha com outros jornais e revistas.
Fonte: “O Globo”, 01/08/2019