Estamos fechando o primeiro mês do governo provisório de Michel Temer e se torna premente uma avaliação do período, mais marcado por crises políticas do que por avanços concretos na governabilidade e na gestão econômica.
Não é nada fácil esta travessia. E o pior é que o prazo de governo é bem apertado. Na agenda política temos a votação do impeachment no Senado em meados de agosto, entremeada pelas Olimpíadas e logo depois as eleições municipais de outubro. O tempo para o governo Temer é extremamente exíguo e sem garantias de continuidade, dado o placar apertado na votação do Senado. Pesquisas recentes indicam uma votação de 37 favoráveis a 18 contrários, sendo o resto, de senadores “indecisos”, na certa, no aguardo por definições na acomodação por cargo.
Para piorar, a Lava-Jato segue causando estragos no “circo político brasileiro”, ainda mais depois do ex-presidente da Transpetro, Sergio Machado, em ligações telefônicas, ter obtido uma série de “denúncias” contra personagens do Congresso e do ministério do presidente Temer. Já foram dois os demitidos, com especial destaque para o Senador Romero Jucá, um dos principais articuladores do presidente.
O problema é que nada garante que tenhamos alguma tranquilidade até o desfecho da votação no Senado. Serão dias tensos, permeados por alguns avanços na área econômica e muitos embates políticos. A equipe econômica até mostra alguma capacidade de responder ao momento, mas como avançar se a agenda política segue se impondo? Num panorama de só se conseguir governar com amplo apoio parlamentar, chamado de “presidencialismo de coalizão”, o desafio maior é obter maioria folgada nas duas casas, Câmara e Senado, sem grandes desgastes, ou riscos de inviabilizar a adoção de medidas. Concluiríamos então que uma profunda reforma política seria a solução? Talvez, mas como pensar nisso se os próprios políticos seriam os responsáveis por deliberar sobre as decisões a serem tomadas. O ideal, na verdade, é que uma comissão de notáveis fosse formada para tanto.
Na seara econômica até temos alguns avanços. O primeiro foi a constatação de que a meta fiscal deste ano teria que ser a mais realista possível, refletindo uma economia “derretendo” e a arrecadação em queda (mais de 6% neste ano), assim como despesas mais rígidas, não passíveis de corte. Neste contexto, a meta acabou revisada, passando a R$ 170,5 bilhões neste ano, o que dá algum espaço de manobra para a criação de medidas, tanto voltadas ao ajuste de curto prazo, como visando mais o longo prazo. Importante, salientar, que tendo Mansueto Almeida como formulador, estas medidas devem ir sendo divulgadas aos poucos, sem solavancos. Segundo ele, “não teremos mais medidas de caráter setorial, tendo uma amplidão horizontal, ou seja, sendo linear para toda a economia”. Os empresários querem mais previsibilidade e não ficar dependendo de algum burocrata de Brasília.
Sobre as medidas, algumas vitórias devem ser ressaltadas, assim como reveses. Nas primeiras, o governo conseguiu aprovar a prorrogação e ampliação da DRU, mecanismo que permite ao governo gastar livremente parte da sua arrecadação. Neste caso, esta passou de 20% para 30%. Em paralelo, no entanto, Temer acabou cedendo às pressões dos sindicatos dos servidores, tradicionalmente ligados ao PT, e autorizou o reajuste salarial para diversas categorias do serviço público, o que deve gerar um impacto de cerca de R$ 59 bilhões sobre as contas públicas num prazo de cinco anos. Foi uma bola fora. Marcos Lisboa, inclusive, um dos formuladores do plano “Um salto para o futuro”, acha um absurdo. Num momento de crise, de desemprego em 11 milhões, “é um contra-senso autorizar um reajuste que pode custar uma CPMF”.
Neste desgaste, Temer resolveu compensar, endurecendo nas negociações por cargos nas diretorias e presidências das estatais e fundos de pensão. Aguardando a “Lei das Estatais”, que tem como pré-requisito a necessidade de competência técnica para estes cargos, Temer, no entanto, acabou desagradando sua sustentação política, colocando mais uma vez em dúvida sua capacidade de atravessar estes próximos meses.
Foi anunciada também uma das medidas mais importantes da agenda Temer, a que limita a variação do crescimento das despesas da União à inflação do ano anterior. Ainda deve passar pelo Congresso, havendo expectativas sobre a inclusão das áreas da saúde e da educação, mas já considerada por muitos, um dos “vetores de disciplina fiscal previsível no longo prazo”. Lembremos sobre algo parecido quando Antonio Palocci, no primeiro governo Lula, chegou a sugerir um “regime fiscal de longo prazo”, logo cortado pela então Chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, por considerá-lo algo “rudimentar”.
Para as próximas semanas, novas medidas devem ser adotadas, num processo cuidadoso e pré-anunciado de divulgações. Há de se lembrar também a ótima impressão deixada por Ilan Goldfajn, assumindo o BACEN nesta semana, e o chanceler José Serra, mais pragmático na política exterior e na abertura de novos mercados para o País.
Nada disso, no entanto, terá validade se o cenário político continuar turvo.
A gestão econômica é até razoável, digna de elogios. Isto bem se reflete na melhoria dos Índices de Confiança, depois de terem atingido o fundo do poço entre o final do ano passado e o início deste. A seriedade da equipe econômica e algumas boas medidas adotadas bem contribuem para isto.
No entanto, o “nó górdio” da cena política, do espalhamento de denúncias de corrupção entre os vários partidos da base, o PT e o próprio PMDB, segue complicado e pode colocar tudo a perder. Estejamos atentos.
Não será uma travessia fácil, mas esperamos que chegue a um “porto seguro”. Que assim seja.
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