Da mesma maneira que o ministro Sérgio Moro e o coordenador dos procuradores de Curitiba Deltan Dallagnol se recusam a dar credibilidade aos diálogos que vêm sendo divulgados pelo Intercept Brasil, os controladores do site também se negam a confirmar que sejam os hackers presos a fonte original do material publicado.
Mesmo depois de Walter Delgatti Neto, um dos presos, ter admitido que deu acesso ao diretor do site, Glenn Greeenwald, ao material hackeado. Delgatti acrescentou que passou os dados sem cobrar ou receber vantagem financeira em troca. Não parece ser o perfil de uma pessoa envolvida em estelionato e falsificação de documentos.
Os três têm a mesma motivação: não querem reconhecer possíveis delitos. Todos dependem de interpretações jurídicas para validar seus atos, como já largamente analisados. Os hackers não escapam de uma condenação, mas dizer não ter vendido o material é uma tentativa de dar um ar político à atuação. O que deve ser facilmente desmontado pelas investigações.
Os crimes imputados aos hackers são de invasão de dispositivo eletrônico e interceptação de comunicação. O crime foi consumado quando eles invadiram os telefones e captaram as mensagens.
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O que impressiona é a amplitude da ação criminosa, a revelar um completo descaso de nossas autoridades com a segurança institucional. Foram hackeados os chefes do Executivo, Bolsonaro e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado Davi Alcolumbre. Também ministros do Supremo, do STJ, e diversas autoridades. Além de destacar brechas no sistema de segurança das telefônicas, cujas listas de números podem ser compradas no mercado paralelo por estelionatários.
Os fatos demonstram também que nem Executivo, nem Legislativo, nem Judiciário têm normas de segurança seguidas por seus líderes. O presidente Bolsonaro diz que só usa o celular pessoal para comunicações não oficiais, esquecendo-se de que qualquer mensagem ou fala do presidente tem caráter oficial.
O uso indiscriminado das redes sociais para propaganda política é tão importante quanto uma nota oficial. E já deu muito problema político por permitir que seu filho Carlos usasse sua senha para mandar recados como se fossem de seu pai.
A utilização do twitter é um hábito que Bolsonaro copia do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, seu grande ídolo. Nos Estados Unidos, a utilização de meios particulares para atividade oficial já deu muita dor de cabeça a Hillary Clinton que, quando Secretária de Estado no governo Obama, dispensou o e-mail oficial para usar o seu privado, mesmo para assuntos de Estado.
O caso provocou o temor de que informações sigilosas do Departamento de Estado circulassem em redes de caráter privado, ou estivessem expostas a ataques de hackers. Durante as investigações, que ocorreram na campanha presidencial, prejudicando-a como candidata, o inspetor-geral do Departamento de Estado afirmou que ela não pediu permissão para adotar um servidor privado. Hillary sofreu com o hackeamento de suas mensagens, alegadamente feito por russos para beneficiar Trump.
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Voltando ao nosso caso de hackeamento, a informação de que as mensagens seriam destruídas, anunciada pelo presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, acabou desmentida pelo ministério da Justiça. Destruir provas é crime, só um juiz pode decidir sobre isso.
Mas se o juiz mandar desentranhá-la dos autos, os hackers podem ser absolvidos por falta de prova. O juiz tem que se basear no que está no processo no momento em que for dar a sentença. Por isso se diz que “o que não está nos autos, não está no mundo”. Se o juiz usar as provas na sentença ele não pode destruí-las depois, porque elas têm que ser avaliadas pelas instâncias superiores.
Fonte: “O Globo”, 26/07/2019