O último Relatório Global de Competitividade (RGC), publicado pelo Fórum Econômico Mundial, traz uma novidade sobre o Brasil: pela primeira vez, a má qualidade da infraestrutura supera a elevada carga tributária como limitante à competitividade das empresas aqui instaladas. Infelizmente, essa alteração de classificação diz mais sobre a contínua deterioração da infraestrutura do que sobre a nossa carga tributária, uma das maiores entre as economias emergentes. De fato, nesse quesito o Brasil aparece no relatório na 130ª posição, entre os 144 países pesquisados, ficando na 144ª no tocante à extensão e efeitos da tributação.
A contínua piora relativa da infraestrutura pode ser avaliada comparando a classificação do Brasil nesse item em diferentes edições do RGC: 45ª em 2002 (entre 80 países), 79ª em 2006 (125 países), 104ª em 2011 (142 países) e 107ª em 2012 (144 países). A péssima qualidade da infraestrutura de transportes explica esse quadro. Assim, no RGC de 2012 o Brasil ocupava a 100ª, 123ª, 134ª e 135ª posições em relação à qualidade das infraestruturas ferroviária, rodoviária, aeroportuária e portuária, respectivamente, ainda que tivesse a 52ª maior renda per capita.
É com esse pano de fundo que se deve ler a notícia veiculada ontem no “Valor” (pág. A16), de que em breve o governo terá em mãos um detalhado estudo sobre a situação dos portos brasileiros e, imagina-se, propostas de como atacá-los. Três pontos do estudo citados pela matéria são dignos de nota.
Primeiro, a maioria dos portos sofre com a má gestão oferecida pelas empresas estatais que os administram, que trabalham com quadros de pessoal inchados e fracos resultados financeiros. Ainda que a matéria no jornal não se refira a isso, parece haver muito pouco controle e supervisão sobre essas empresas, em parte devido à interferência política que, segundo o estudo, as caracteriza.
Segundo, em todas as regiões do país os portos estão próximos da saturação. Analisando-se os dados disponíveis, vê-se que isso é resultado de uma combinação de baixos investimentos com forte alta na movimentação de carga, fruto do grande crescimento do comércio exterior nos últimos 10 anos. Nesse período, o investimento no setor portuário foi de apenas 0,033% do PIB, enquanto o total de carga movimentada aumentou 5,9% ao ano. Não fica claro no artigo se é a má gestão ou a falta de investimentos que explica outro problema aí apontado: o elevado tempo para atracação dos navios nos portos, que encarece o comércio exterior brasileiro, pela ociosidade que gera no uso dos navios.
Terceiro, o estudo aponta a necessidade de investimentos nos portos organizados do país de pelo menos R$ 43,6 bilhões em uma série de projetos a serem executados até 2030. Cifras como essa parecem altas, mas na verdade correspondem a apenas 0,037% do PIB. Não obstante, se efetivamente esses investimentos forem realizados, será um avanço, considerando que, aparentemente, esse total não inclui as inversões que venham a ser realizadas em terminais privativos.
No geral, portanto, o estudo dará uma contribuição importante para a discussão dos problemas que afligem o setor portuário. No todo, porém, as propostas aí contidas não parecem suficientemente ambiciosas e abrangentes.
O investimento proposto basicamente mantém o ritmo atual de inversões, sendo insuficiente para transformar de forma significativa o setor. Além disso, como mostram os outros planos lançados nos últimos anos, a execução desses investimentos em geral atrasa e nem todos são de fato realizados. Considerando-se que o estudo ainda precisa ser transformado em programa público, depois os projetos licitados, e que apenas na obtenção das licenças ambientais se consumirá de um a três anos, esse é de fato um programa para o próximo governo.
A matéria no jornal também não faz menção aos dois temas regulatórios que afetam o setor e de cuja solução dependem vários desses investimentos: a decisão sobre a renovação das concessões portuárias e a definição sobre a movimentação de carga de terceiros em terminais privativos de uso misto. A possibilidade de que, como ocorreu no setor elétrico, se aproveite para, na resolução dessas pendências, promover uma forte redução de tarifas é outro fator de incerteza que pode atrasar os investimentos. Por fim, como mostra o estudo, é preciso ir além de listar projetos de investimento e também cuidar da gestão dos portos.
Fonte: Correio Braziliense, 31/10/2012
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