Uma das perguntas subjacentes ao Fórum Nacional de 21-22 de setembro era se, diante do imaginado início da recuperação econômica, em seguida à maior recessão de nossa história, e do programa de recuperação estadual recentemente aprovado (mesmo que apenas para o Estado do Rio), os estados sairiam mais facilmente da crise financeira atual.
Um resumo das discussões está no “Globo” de 29 de setembro, mas um maior detalhamento só sairá nos respectivos anais, onde se dirá que, em parte por falta de empenho de Brasília, nem o programa aprovado para recuperar o Rio conseguiu decolar, o que piora bastante as coisas na complicada metrópole carioca, nem são animadores os sinais de recuperação. Tais indícios apontam para um crescimento muito fraco do PIB em 2018, o último ano dos mandatos dos atuais governadores.
A saída de última instância é atrasar pagamentos tanto de fornecedores como de servidores, e ir empurrando o problema com a barriga. Mas como a lei exige que os passivos de curto prazo (“restos a pagar”) sejam quitados antes de os atuais gestores passarem os respectivos bastões para seus sucessores, isso significa que de agora até o final de 2018 será uma caça desesperada a quaisquer novas fontes de recursos, deixando tudo o mais de lado. E rezar para chegar vivo no final do mandato…
Pezão disse com razão no Fórum que não só as contas são muito rígidas, como era impossível prever a brutal recessão que desabou sobre o país. Sem falar que os remédios previstos em lei servem pouco, pois há impedimento legal para aplicá-los.
Ajustar o gasto estadual como muitos imaginam é, de fato, praticamente impossível, pois o que sobra de orçamento para o governador, após deduzir os quinhões dos verdadeiros “donos” da peça orçamentária, é muito pouco. E ele tem de pagar com o orçamento residual a gigantesca conta da Previdência pública, que inclui os gastos com inativos e as contribuições patronais de todas as secretarias (supondo que essas tenham sido criadas), e as despesas das secretarias menos prioritárias, incluindo o investimento público.
Quanto ao mais, comparo a situação dos estados à das concessionárias de rodovias aprovadas no apagar do primeiro governo Dilma sob hipóteses de crescimento real da receita de pedágio apoiadas em projeções bem mais otimistas de evolução do PIB do que de fato ocorreu de lá para cá.
Estados não são concessionárias de serviço público junto à União, mas é como se fossem. Da mesma forma que as concessionárias deveriam receber autorização para reequilibrar seus contratos, os estados precisariam de apoio da União para pôr em prática o equacionamento da Previdência pública, enquanto a brutal recessão estivesse por aí. O “brutal” é para lembrar que, tanto na distribuição de riscos das concessões como do relacionamento financeiro União-estados, não se pode deixar para as concessionárias e administrações regionais, hoje completamente interligadas ao motor financeiro das autoridades financeiras de Brasília, o ônus de absorver desassistida os custos adicionais de uma recessão cuja magnitude exceda níveis razoáveis.
Desde 2013, quando foram feitas as licitações no âmbito da 3ª Etapa do Programa de Concessões de Rodovias Federais, o ambiente macroeconômico se alterou drasticamente. Até 2013 (inclusive), havia clara percepção que a economia havia se desacelerado em relação ao governo Lula: entre 2011 e 2013, o Brasil cresceu, em média, 3% ao ano, cerca de um ponto percentual abaixo do observado durante os oito anos Lula. Mas a situação corrente, bem como as expectativas quanto ao futuro, em nada se assemelhava à forte contração que tivemos desde 2015.
Em janeiro de 2013, as expectativas de crescimento para 2015 e 2016 eram de taxas positivas, respectivamente, de 3,60% e 3,55%, de acordo com a Pesquisa Focus, coletada pelo Banco Central junto a cerca de cem instituições do mercado financeiro e consultorias.
Como se sabe, o resultado para o biênio 2015/2016 foi catastrófico, pois totalizou uma queda de 7,3% no período. Trata-se da maior contração do PIB desde 1900, quando se iniciou a série de tempo respectiva. Antes do biênio 2015/16, o pior biênio da história havia ocorrido em 1931, quando o PIB contraíra 5,3%.
Ou seja, o resultado da economia nos últimos anos foi o pior de nossa história. Em verdade, qual a probabilidade que alguém, em 2013, pudesse imaginar que, nos três anos seguintes, teríamos o pior desempenho da economia dos últimos 116 anos?
Assim, como não há como alterar as fatias dos protegidos do Orçamento no curto prazo, qualquer programa que deixe de contemplar o verdadeiro equacionamento da Previdência pública tenderá a morrer na praia. Tal equacionamento deverá contemplar tanto a participação das “secretarias/demais poderes protegidos” no financiamento das despesas relacionadas com previdência, como a destinação de ativos e recebíveis ao fundo previdenciário que for criado. (Para ver os detalhes da solução que venho defendendo há algum tempo, basta solicitar por e-mail a raulvelloso45@gmail.com).
Fonte: “O Globo”, 09/10/2017.
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