A eleição de Donald Trump soou nos mercados financeiros como um alerta para as economias emergentes. A rápida elevação das taxas de juros de longo prazo, antes mesmo dos próximos movimentos do Federal Reserve (Fed) e do Banco Central Europeu (BCE) sobre os juros de curto prazo, anuncia o fim dos tempos do dinheiro barato nos mercados globais de crédito.
O colapso das moedas e das bolsas nos países emergentes revela o receio de fechamento dessa janela de oportunidade. A expansão fiscal de Trump desperta expectativas inflacionárias há muito adormecidas, aumenta os juros de mercado e encurrala a política de dinheiro barato do Fed. A alta dos preços de commodities e a aceleração inflacionária dos preços de bens e serviços empurram para cima os juros em todo o mundo.
Os juros mais curtos, sob controle dos bancos centrais, terão de subir mais rápido que o esperado nos países avançados. Por sua vez, o impacto inflacionário da alta das commodities e da abrupta desvalorização cambial leva o Banco Central do Brasil a baixar as taxas de juros mais devagar. Um país de dimensões continentais como o Brasil não pode se comportar como uma folha aos ventos da economia global e sua geopolítica.
Nosso maior problema é o desajuste fiscal interno, e não Trump. O clima em Brasília sofre rápida deterioração porque os políticos estão desviando otempo que deveria ser usado para aprovar reformas econômicas, em busca de sua própria proteção contra as investigações da Lava-Jato. As propostas contra “abuso de autoridade” e a favor de repatriação “para parentes” e anistia “para caixa 2 não oriundo de corrupção” entopem a agenda do Congresso no exato momento em que a aprovação da reforma da Previdência poderia nos blindar contra as turbulências externas.
O governo Temer já corria contra o tempo antes que as delações da Odebrecht pudessem incendiar o Congresso. A perspectiva de que se encerre o interregno benigno que desfrutavam as economias emergentes agudiza o drama de um governo transitório. É suicida a dissipação do pouco tempo disponível.
Quem aprovar a reforma da Previdência deve ficar com o comando da Câmara e do Senado. Já quem assumir esse comando em fevereiro sem ter aprovado a reforma adquiriu o direito de ser carbonizado primeiro.
Fonte: O Globo, 14/10/2016.
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