Ainda não foi assimilado nem esquecido o triste espetáculo de que foi protagonista o honrado senhor presidente da República na ilha de Fidel. Voltou a Cuba, desta vez para uma visita reverencial ao velho caudilho que, na metade do século passado, comandara a demolição da torva ditadura de Fulgêncio Batista, para dar lugar à sua, tão ditadura como a anterior.
Chegado ao poder por via das armas, sem demora surpreendeu o mundo ao integrar-se ao bloco soviético, então em pleno fastígio. No continente americano, converteu-se no escritório de luxo do estalinismo. E ia tudo de vento em popa quando Kennedy enfrentou a emergência de maneira a não deixar dúvidas, e as armas atômicas a serem instaladas nas imediações dos Estados Unidos tiveram de retornar às estepes. Uma longa troca de palavras sem haver diálogo se estendeu no tempo, e Cuba – e seu caudilho – continuou a ser o que passara a ser. O muro de Berlim foi erigido e desfeito, e Cuba continuou como era. A cortina de ferro dividiu a Europa e enferrujou, e Cuba prosseguiu inamovível. O estalinismo, que chegou a ser a maior força internacional, acabou entre o sangue dos seus crimes e a podridão da venalidade, e Cuba se manteve impertérrita. O comandante Fidel, mundialmente festejado pela esquerda mais exacerbada, conservou todo o instrumental dos países totalitários, até que, visivelmente envelhecido, recolheu-se a uma bela vivenda, onde recebeu as afetuosas homenagens do presidente do Brasil e de seus confrades mais chegados; em prova de familiaridade, serviu do fotógrafo da visita, esquecido de que era chefe de Estado e o presidente é presidente em qualquer lugar e especialmente quando fora do seu país. Mas, afinal, o presidente é “o cara”, e “o cara”, afeito a fazer o que lhe apraz, não se sujeita às regras da decência da função. Eis senão que, aconteceu o que Machado de Assis chamou de “uma espécie de deus avulso”, o imprevisto. O pretenso porta-bandeira dos “direitos humanos”, inadvertido, quem sabe, de que em Cuba os “direitos humanos” são de fabricação estalinista, emudeceu em todas as línguas no exato momento em que um preso político morria na prisão ao cabo de 85 dias de greve de fome. O Granma, ou seja, o jornal oficial da ilha, não publicou uma palavra a respeito, e de contrapeso cem pessoas foram presas para que não pudessem comparecer ao enterro de Orlando Zapata.
Mas o fato serve para testemunhar o fenômeno de servilismo mental a que se reduzem certos segmentos humanos, a despeito dos bem-dotados. Finda a guerra, servida por sua quinta-coluna, a URSS se apoderou de largos territórios além dos Urais, e Stalin foi endeusado em prosa e verso como “o guia genial dos povos”; o sinistro Muro de Berlim foi saudado como um monumento à liberdade, e muitas pessoas, intelectuais inclusive, jornalistas sem conta, durante anos repetiram os ditirambos ao “pai dos povos”, até que os deuses de barro ruíram como suas estátuas de bronze, enquanto pessoas ilustradíssimas, estalinistas até a véspera, parece terem ganho óculos novos e passaram a ser antiestalinistas de corpo e alma. Eu vi isso, todo mundo viu. Mutatis mutandis, o fenômeno se repete, repete-se monotonamente.
O presidente do Brasil permaneceu mudo enquanto pôde, e depois que o sota-comandante Raúl declarou que a morte do preso político em greve de fome “era lamentável”, parece ter usado as mesmas palavras, “era lamentável” e mais não disse.
Agora, digo eu, foi uma visita lamentável, muito lamentável.
Esperto foi aquele frei contra a transposição do São Francisco, sacou logo que ia morrer pq ninguém tava nem aí pra ele. Assim tb foi Garotinho,pessoal até deu força para ele manter a greve.
Paulo Brossard não foi Ministro no Governo Sarnei? Ah, então tá…..