Passados cinco anos do auge da crise do subprime americano, a ação governamental na área econômica encontra-se sob intenso tiroteio.
Na raiz de tudo, o governo demonstra trabalhar com a meta de inflação anual de 6,5%, quando o centro do intervalo oficial de metas é de 4,5%, enquanto os resultados fiscais vêm se deteriorando sistematicamente, e não há nenhum sinal claro de reversão. A indústria, a despeito de todas as políticas de apoio oficial adotadas, está estagnada desde a crise e os déficits externos vêm crescendo seguidamente. Como a taxa de investimento parou de crescer desde a crise, o PIB estacionou e não parece capaz de ultrapassar a faixa de 2% a 2,5% ao ano. Só falta bater no emprego. Não é por outro motivo que, antecipando a iminente piora na classificação de risco do Brasil pelas agências internacionais, os mercados vêm subindo paulatinamente a taxa do risco Brasil, relativamente à dos nossos pares no mundo emergente.
Há, contudo, o lado positivo dos recentes leilões de concessões nas áreas de infraestrutura rodoviária e aeroportuária. Estradas e aeroportos importantes foram passados à iniciativa privada em certames que, no primeiro exemplo, tinham começado mal, e agora parecem estar entrando nos eixos.
No caso das rodovias, após dois leilões fracassados – o primeiro nem chegou a ocorrer -, o governo sentou-se à mesa com os candidatos, ao longo do último ano, e debateu as objeções que havia em relação a cada item sob disputa nos estudos técnicos oficiais. A baixa qualidade desse material era flagrante, conforme se conclui de várias declarações das partes envolvidas. Aos poucos, as dúvidas foram dirimidas, com tarifas-teto mais realistas fixadas para os leilões. Até agora, o número de competidores tem sido expressivo e, para a satisfação oficial, os deságios dos lances ganhadores, bastante elevados.
Vejo dois pontos vulneráveis nos leilões citados, que podem implicar, no futuro, negócios de baixa qualidade. Um é que a diferença entre o deságio mais baixo e o mais alto de cada certame parece muito elevada, sinalizando o chamado comportamento oportunista ou propensão excessiva ao risco. O outro é a dispensa – inexplicavelmente imposta pelo próprio poder concedente – dos respectivos planos de negócios. Como se sabe, esses planos são essenciais, pois mostram como o vencedor vai executar o que está no edital, quais os parâmetros relevantes – a exemplo da taxa interna de retorno original -, etc. Conforme discuti com colegas em livro sobre o tema, disponível para download na página www.raulvelloso.com.br, trata-se de contratos muito complexos. Suas bases originais precisam ficar bem claras, inclusive para que eventuais desequilíbrios futuros sejam equacionados pela agência regulatória que estiver operando anos à frente.
Fico pensando como o BNDES, tradicionalmente exigente em suas análises, poderá, sem os planos de negócios originais, examinar a viabilidade do financiamento de 70% desses projetos, sob a modalidade project finance, em que é a receita futura do empreendimento que garantirá os recursos nele aportados. Quem viver verá.
No setor de energia elétrica, não sei se dá para ostentar o mesmo grau de moderado otimismo diante do que vem acontecendo. Com a colaboração da equipe mencionada anteriormente, estou prestes a concluir estudo análogo ao realizado sobre transportes. Apesar da maior tradição de planejamento, no afã de buscar menores tarifas o governo federal tem utilizado preços-teto excessivamente baixos, especialmente para hidrelétricas. Quando isso ocorre, a atratividade dos empreendimentos cai e, com isso, reduzem-se a competição entre os agentes e a possibilidade de essa competição derrubar os preços. Ou seja, se a remuneração não for atraente, o capital privado não aparece, expondo a atividade a um duro e longo aprendizado à custa das frustradas expectativas de maior crescimento do emprego e renda da população.
Fonte: O Estado de S.Paulo
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