Adam Smith escreveu A Riqueza das Nações há 239 anos, mas parece falar sobre o Brasil de 2015. Um pequeno trecho do livro explica pelo menos duas notícias desta semana. O trecho é este:
[su_quote]O pior dessas conspirações contra o público é que elas são vencedoras[/su_quote]
As pessoas envolvidas na mesma atividade raramente se encontram entre si, mesmo para confraternização e diversão, mas [quando isso acontece] a conversa termina numa conspiração contra o público, ou em alguma manobra para fazer subir os preços.
Difícil achar um exemplo tão bem-acabado dessa conspiração contra o público quanto a guerra dos taxistas contra o Uber. Por pressão das cooperativas de táxi, os vereadores de São Paulo aprovaram ontem uma lei para proibir os aplicados de carona paga. Não importa que milhares de passageiros estejam cansados dos táxis e se sintam mais seguros em carros do Uber: os taxistas acreditam ter o direito de proibir uma empresa, um modelo de negócio, e impedir que as pessoas escolham o serviço que preferem.
Também como Adam Smith antecipou, editores e livrarias se reuniram e tentam aprovar no Congresso uma lei para fixar um preço mínimo dos livros. Querem evitar a concorrência de grandes lojas online, que cortaram custos e conseguem vender por preços mais baixos. É difícil imaginar uma ação pior para o incentivo à leitura que proibir o consumidor de comprar um livro por um preço menor. Mas o debate avança no Senado como se a ideia fosse razoável.
O pior dessas conspirações contra o público é que elas são vencedoras. Como a Teoria da Escolha Pública mostrou nas últimas décadas, pequenos grupos de interesse conseguem impor sua vontade mesmo quando isso prejudica o grosso da população. A maior parte das pessoas até gostaria de ter acesso a outros tipos de táxi ou a livros mais baratos, mas esses interesses são difusos, apenas dois entre tantos outros desejos. Já os taxistas e livreiros têm um interesse forte e concentrado o suficiente para organizarem protestos e pressionarem políticos. O 1% consegue se impor contra a vontade dos outros 99% da população.
Fonte: Veja 01/07/2015.
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