Inovar é preciso
Nos últimos três anos, vivemos a mais aguda recessão da economia brasileira pelo menos desde 1900 – desde quando há dados disponíveis. Razões para isso não faltaram. Uma das principais foi a falta de políticas econômicas voltadas para estimular a competitividade da economia brasileira. Ainda mais grave, a intervenção crescente do governo nas mais diversas áreas e setores da economia criou em muitas empresas a ilusão de que uma relação harmônica com o governo poderia ser mais importante e lucrativa do que investir em inovação. Triste engano.
Por uma série de razões que detalho no meu livro recém-lançado “Depois da tempestade”, salvo o governo Temer mostrar-se incapaz de cortar gastos ou o Brasil ser atingido por uma nova crise global, devemos estar iniciando uma recuperação econômica cíclica muito mais forte do que a maioria imagina. O risco é que, com a recuperação já dando os primeiros sinais de talvez ter começado e devendo se sustentar por alguns anos apenas com a sustentação da recuperação da confiança em função da transição política e ajuste fiscal, mais uma vez, governo e empresas deixem os ajustes de competitividade – os únicos que, ao longo de décadas, efetivamente tornam um país mais desenvolvido e seu povo mais rico e transformam empresas em líderes regionais, nacionais e até globais em seus setores – para lá.
Os frontes de combate são muitos, assim como as oportunidades que oferecem aos que conseguirem avançar. Trato deles em muito mais detalhes no “Depois da tempestade” do que o espaço me permitiria aqui, mas para dar um pontapé inicial na discussão, selecionei a seguir dois breves trechos do livro que tratam de dois temas que me parecem fundamentais:
- a necessidade das empresas de focarem e criarem processos, ambientes e incentivos à inovação;
- por que a indústria brasileira, em particular, deve entrar em um ciclo de recuperação nos próximos anos, mas ele só será sustentado e sustentável no longo prazo por políticas de incentivo à competitividade e inovação.
Além disso, minha empresa, a Ricam Consultoria, está conduzindo junto a um parceiro uma pesquisa exclusiva com as empresas e profissionais reconhecidos por seus pares como os mais inovadores do país para compreender melhor os processos que permitem e estimulam a inovação. Em breve, devemos ter novidades.
República de bananas ou de inovadores?
O termo “República de bananas” nasceu para menosprezar países da América Central dependentes deste produto, facilmente manipuláveis política e economicamente.
Bananas e outras commodities são produtos ou serviços com pouco ou nenhum diferencial, e que por isso podem ser substituídos pelo produto ou serviço oferecido pelo vizinho com facilidade. Cada vez mais, profissionais também têm virado commodities.
A aceleração e a rápida disseminação dos avanços tecnológicos têm colaborado para uma commoditização generalizada. No passado, uma empresa que lançava um novo produto desfrutava de uma vantagem competitiva significativa em relação aos concorrentes por mais tempo. Hoje, na maioria das vezes, concorrentes conseguem lançar produtos similares ou melhores em prazos cada vez mais curtos. Um exemplo é a indústria de celulares. Em poucos anos surgiram novos líderes, e líderes pioneiros sumiram ou encolheram substancialmente.
Para evitar a commoditização de seus produtos, as empresas tentam, com níveis de sucesso variáveis, diferenciar produtos muito parecidos, usando detalhes técnicos, cores e formas distintas.
A menina dos olhos dos pregadores da inovação é provavelmente a Apple. Com produtos de uso fácil e design arrojado, a Apple transformou aparelhos eletroeletrônicos em objetos de desejo e status. Ainda assim, a própria Apple tem sentido cada vez mais a mordida da concorrência, que não só copia suas inovações, mas acrescenta outras.
Inovar sempre é preciso; hoje, ainda mais. De 2004 a 2010, a economia brasileira expandiu-se a um ritmo médio de 5% a.a. incorporando mão de obra ao mercado de trabalho e usando mais a infraestrutura existente. De lá para cá, estes fatores produtivos se esgotaram e nosso ritmo médio de crescimento desceu para 2% a.a. até 2013 e tornou-se negativo desde então. Para crescer de forma acelerada não basta colocar mais gente para trabalhar. O desafio agora é produzir mais sem mais gente. Em resumo, não só está cada vez mais difícil manter diferenciais em relação à concorrência, mas sem estes diferenciais, as empresas instaladas no Brasil estão condenadas a crescer menos.
A solução é inovar. Pode ser na forma de atender o cliente. Seja um produto ou um serviço, toda empresa oferece uma solução para uma necessidade de seu cliente. Como melhor suprir esta necessidade? Mude a forma de encarar seu próprio negócio. Por exemplo, em 1987 a Brasilata, uma empresa de embalagens, implantou um programa pedindo sugestões de melhorias a todos os seus funcionários, que passaram a ser vistos como “inventores”. Em 2008, cada inventor propôs, em média, 145 melhorias.
Está pensando que esse papo de inovar vale só para as empresas, não para você? Pense mais um pouco. A alta dos salários nos últimos anos levará as empresas a substituir funcionários por máquinas, agora mais baratas, o que somado a um crescimento econômico mais lento deve elevar a taxa de desemprego.
Qual o seu diferencial? O que você faz melhor do que os outros? O que o torna único aos olhos de quem o contrata? Por exemplo, segundo meus clientes, no meu caso é a capacidade de transformar conceitos econômicos complexos e que parecem distantes do dia a dia das empresas em algo simples e que as ajuda a desenvolver estratégias que as tornam melhores do que seus concorrentes. Descobriu o seu? Não? Então, pesquise, prepare-se, estude, vá à luta e arranje um bom diferencial. Você não quer virar banana, quer?
Industriais do Brasil, uni-vos!
A produção da indústria hoje está de volta aos níveis de 2006.
O mal desempenho recente da indústria pode surpreender, dada a forte alta recente do dólar, que chegou a atingir R$4,20, que deveria estimular nossas exportações e reduzir as importações. Já notamos um impacto nas importações. O impacto nas exportações, no entanto, é bem mais lento porque as empresas brasileiras precisam retomar mercados e contratos que perderam quando seu preço de exportação estava muito elevado, no período de dólar baixo. Isto leva tempo.
Mais grave do que isso – como o gráfico a seguir deixa claro – ao contrário do que se imagina, a produção da indústria costuma cair quando o dólar sobe, aliás como acontecerá neste ano, e crescer quando o dólar cai. Isto é contra intuitivo porque um dólar mais alto torna nossas exportações mais competitivas e os produtos importados mais caros, favorecendo a indústria nacional.
O problema é que, no Brasil, a taxa de câmbio se valoriza – isto é o dólar cai – quando a economia vai bem, a confiança está alta e as vendas internas da indústria estão fortes e ela se desvaloriza – isto é, o dólar sobe – quando acontece o contrário. Como a economia brasileira é muito fechada, o impacto das vendas internas é predominante. Por consequência, por incrível que pareça, a indústria costuma ter desempenho melhor em momentos de dólar em queda e pior em momentos de dólar em alta.
A questão é que este processo tem limites. Quando o dólar está muito baixo e a competitividade da indústria brasileira também, mesmo um mercado interno forte não garante um bom desempenho da indústria porque parcelas cada vez maiores da demanda interna passam a ser supridas por importações, não beneficiando nossa indústria.
O reverso ocorre quando o dólar fica muito alto, como recentemente e começa a cair, como nos últimos meses. Neste caso, a indústria consegue aproveitar-se da melhora do mercado interno, que normalmente acompanha movimentos de dólar em queda. É bastante provável que vejamos este processo ao longo dos próximos anos, como aliás, aconteceu tanto após a desvalorização do Real de 2002/2003, quanto à de 2008/2009.
Isto tudo para dizer que os problemas que afetam a competitividade hoje, como em 2013 – desde quando as dificuldades da indústria começaram a se agravar – não estão ligados ao nível da taxa de câmbio, mas a problemas estruturais da economia brasileira – custo trabalhista elevado, baixa produtividade da mão de obra, imposto excessivos, infraestrutura ruim, ambiente de negócio desfavorável, etc – mas ao contrário de 2013, um dólar alto hoje e provavelmente em queda nos próximos anos, dá ao Brasil a possibilidade de cuidar destes ajustes nos próximos anos em um ambiente de desempenho da indústria bem mais favorável do que tivemos nos últimos anos.
Isto não é, em hipótese alguma, razão para postergar essas reformas. Aliás, se as tivéssemos feito antes, não teríamos tido a desindustrialização do país que acabamos vivendo nos últimos anos.
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