Desde o agravamento da pandemia causada pelo novo coronavírus, o papel do governo e do Estado brasileiro vem sendo debatido e questionado. Em artigo publicado na última sexta-feira (27), o economista Roberto Luís Troster sugeriu seis grandes medidas que o poder público deveria tomar para debelar a crise, fazendo com que o Brasil amenize as perdas sociais e econômicas e volte ao normal no menor prazo possível. Para o Instituto Millenium, o Doutor em economia explicou as ações e deixou claro: os governos precisam falar a mesma língua, ignorando divergências pontuais. Ouça!
A unidade entre as esferas governamentais foi um dos pontos citados por Troster para que o Brasil retome a normalidade. “Na Argentina, há uma rivalidade muito maior, mas eles [governos federal e da cidade de Buenos Aires, geridos por grupos políticos diferentes] colocaram isso de lado, tomaram as medidas em comum acordo, e executaram. Aqui, é preciso ter definições: quanto tempo vai durar o isolamento, quais as medidas em termos de saúde, e por aí vai. Já estamos no final de março, e ainda não há precisão do que vai ser feito. A primeira providência deve ser adotar um norte”, disse.
Entre as medidas para o enfrentamento da crise, está a adoção do liberalismo na prática. “Liberalismo tem quatro pilares: liberdade, eficiência, igualdade e pesos e contrapesos, equilibrando os demais. É preciso ter uma preocupação de curto prazo, por conta da crise. Essas possibilidades que estão sendo aventadas, como a renda mínima e o microcrédito: como isso vai se dar, para quais pessoas? É preciso definir e ter presente que este é um problema nacional, não de um Estado ou de outro”, disse.
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O economista também defende uma mudança na tributação. Troster acredita que a crise é uma boa oportunidade para alterar a legislação e corrigir distorções que existem atualmente. Corrigir distorções, aliás, é o ponto principal de outra medida que está em análise, também dentro do pacote emergencial de propostas para o combate ao COVID-19: a possibilidade de redução dos salários de servidores (incluindo políticos e funcionários do alto escalão) temporariamente, para subsidiar ações contra a pandemia. “Eles têm estabilidade no emprego e uma série de garantias que os trabalhadores normais não têm”, disse.
Troster também acredita que este é o momento adequado para o uso das reservas cambiais do país, uma vez que a perspectiva é de que esta seja uma das piores crises já vividas pelo Brasil em toda a sua história. O especialista do Instituto Millenium acredita que o cenário atual é uma oportunidade para a extinção de uma série de mecanismos que ele classifica como “entulho inflacionário”. “Não faz sentido que o país tenha vários índices, moeda remunerada, tabelamento… Tem que acabar. Há 26 anos que a hiperinflação terminou, e o lenga-lenga continua”, disse.
Troster também defende mudanças estruturais, uma vez que a crise sanitária fez com que os olhos da sociedade se voltassem, novamente, para questões como a precária rede de saneamento do país.
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Sem contradição com o liberalismo
Em tempos de uma pandemia que gerou uma situação de extrema gravidade em todo o mundo, outro tema entrou em questão: uma presença maior do Estado em ações de emergência coloca o liberalismo clássico em xeque? Na visão de Roberto Luís Troster, não. “O sistema de pesos e contrapesos é justamente para isso. Para que haja a propriedade privada, fundamental em um modelo de economia liberal, é preciso ter leis, direitos garantidos, Judiciário, ou seja, o Estado é importante”, disse.
O necessário, na visão de Troster, é a aplicação e o direcionamento das verbas. “Tem que fazer um gasto bem feito. Não pode economizar em saúde agora, neste momento. Isso não vai contra o movimento liberal. Agora, por que subsidiar um setor específico? É preciso saber onde, quando e como gastar os recursos públicos”, explicou.