Há mais de 20 anos, o país discute o tema da reforma da Previdência, sem encarar de frente o tamanho deste problema para as finanças públicas. Tanta procrastinação resultou em um déficit bilionário e em gastos previdenciários que somam cerca de 60% do Orçamento primário da União. O resultado é uma conta que cresce em ritmo alarmante, fruto de tamanha inércia. Na iminência de uma grave crise fiscal e social, o economista Pedro Nery, autor do livro “Reforma da Previdência – Por que o Brasil não pode esperar?”, escrito em parceria com Paulo Tafner, um dos maiores especialistas na área, explica os motivos que fazem esta matéria ser tão urgente. Ouça a entrevista no player abaixo!
A Previdência Social brasileira é uma das mais generosas do mundo na medida em que facilita que pessoas de renda elevada se aposentem com mais facilidade, além de conceder pagamentos altos e não compatíveis com a real missão de um sistema social deste porte para alguns grupos de trabalhadores, como políticos e outros integrantes do funcionalismo.
Por tratar-se de um direito adquirido, a Previdência é uma despesa obrigatória da União. Para não deixar de arcar com seus compromissos financeiros, sob pena de punição, o governo vai perdendo cada vez mais sua capacidade de investir em saúde, educação, segurança e outros serviços básicos para a população, sobretudo os mais pobres,. como explica Nery:
“A Previdência rivaliza com outras despesas que não obrigatórias. Não existe obrigação para policiar uma rua, asfaltar uma estrada ou construir aeroportos e hospitais. Sem a reforma, em dez anos, os benefícios previdenciários vão chegar a 80% das despesas primárias. Nos estados e capitais, passamos por uma situação parecida, sendo que é ainda mais grave. Se não reformarmos, tendemos a ter cada vez menos médicos para contratar, hospitais em situações piores, menos policias nas ruas, menos equipamentos na educação etc”.
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O economista lembra ainda que, hoje, entre 30% a 40% das crianças brasileiras vivem abaixo da linha da pobreza e precisam destes recursos, que poderiam ser distribuídos de forma mais eficaz entre as gerações.
Apesar de possuir uma população relativamente jovem, a folha de pagamento do sistema previdenciário brasileiro é uma das maiores do mundo. Para o economista, se compararmos com outros países que possuem características demográficas semelhantes, deveríamos desembolsar cerca da metade do que é investido atualmente. “A gente já gasta 14% em proporção ao PIB, que é mais ou menos o que a Alemanha ou o Japão gastam. Estamos falando em rediscutir uma escolha de uma sociedade, que talvez não seja muito consciente, de priorizar somente uma geração e ter uma Constituição de um direito só: a Previdência”.
A relação com a economia
A cada segundo, a Previdência gasta cerca de R$ 26 mil reais, de acordo com o economista. Uma despesa que cresce R$ 50 bilhões a cada ano. Tudo isso aumenta a perspectiva de elevação da carga tributária, além do medo de uma dívida pública impagável. “Nesse cenário de incerteza e insegurança, é muito difícil investir. Existe um bom momento internacional que o Brasil poderia se beneficiar em termos de investimento estrangeiro, até mesmo no âmbito do investimento privado brasileiro. É como se tudo estivesse em compasso de espera para saber se o país vai quebrar ou não”, explica.
A reforma é urgente
A reforma da Previdência não resolve todos os problemas do país de uma hora para outra, mas é de fundamental importância para a conquista do equilíbrio discal. Além de eliminar desigualdades do atual sistema, em médio e longo prazos, as mudanças teriam capacidade de aumentar o nível de investimento público e privado, e estimular a criação de mais vagas de emprego.
Hoje, já há um consenso entre os especialistas de que o projeto será, de fato, aprovado na Câmara e no Senado. Na opinião de Pedro Nery, a questão agora é quando e qual texto será escolhido pelos parlamentares. O economista salienta que é historicamente normal reformas deste tipo terem uma tramitação longa nas casas legislativas, embora a proposta de Jair Bolsonaro esteja sendo analisada de forma mais lenta se comparada as de presidentes anteriores, como FHC, Lula e Temer.
“A perspectiva é que, dada à urgência do tema, a reforma se acelere e consiga ser aprovada no Congresso Nacional e promulgada até o fim de 2019. O risco de ficar para o ano que vem é que talvez os mercados não tenham paciência de esperar. Em 2020 acontecem eleições municipais, o que pode dificultar um pouco a tramitação”, reforça.