Inflação acima da meta e taxa de juros básica de dois dígitos ficaram para trás. O Brasil, aos poucos, supera esse obstáculo ao crescimento. Pena que tardiamente – os países vizinhos da costa do Pacífico há muito operam com juros baixos – e já no fim do bônus demográfico. Este exigirá maior esforço para o País crescer, pois o crescimento da população idosa, fora do mercado de trabalho, já supera o populacional.
O valor que a sociedade atribui à inflação baixa é exemplo de avanço institucional no País, no sentido mais amplo utilizado por Douglass North. A aprovação da reforma da Previdência pode ser vista como reflexo desse amadurecimento. A classe política – destacadamente o “Centrão” – compreendeu a ligação entre desequilíbrios fiscais e inflação. Não convém colocar toda a culpa do atraso nos políticos. Muitos centros acadêmicos pregam que a inflação mais elevada não é um problema e que os juros altos decorrem de incompetência e interesses escusos do Banco Central, enquanto desconsideram a importância da disciplina fiscal.
A inflação está praticamente estável, oscilando conforme a ocorrência de choques, benignos ou adversos; neste último caso, com efeito menos persistente em comparação ao passado. Exemplos disso foram a rápida superação da alta da inflação causada pela greve dos caminhoneiros e os choques de energia e alimentos no início deste ano. Trata-se de um sinal muito favorável.
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Não foi sempre assim. No governo Dilma, pressões transitórias, como na inflação de alimentos, acabavam contaminando outros itens da cesta de consumo, como serviços. Os choques adversos tinham impacto expressivo e duradouro. O que mudou desde então foi o avanço da agenda fiscal aliada aos ganhos de credibilidade do BC.
Isso não significa que a inflação nunca mais subirá ou gerará necessidade de juros mais elevados adiante. Afinal, o desafio fiscal dos próximos anos é grande e a tendência é de redução da ociosidade de fatores (máquinas, infraestrutura e mão de obra) na economia. Mas vale celebrar a retomada da agenda de ajuste fiscal e as consequências benignas sobre a inflação.
Esse quadro vem permitindo a inflação doméstica se beneficiar da inflação mundial mais baixa. Com a política econômica equivocada do passado, isso não era possível.
As taxas de inflação ao redor do mundo seguem ciclos parecidos, ainda que com diferentes patamares, refletindo a própria sincronia dos ciclos econômicos. O Brasil passou anos descolado desses ciclos e com a pior combinação possível: economia fraca e inflação elevada. Surfar a onda mundial não é para todos. Precisa haver acertos internos.
A inflação mundial caiu, inclusive nos países emergentes. Nota-se empiricamente, nesta década, uma menor sensibilidade ao desemprego em queda, que poderia ser fonte de inflação. Além do papel da tecnologia e da globalização, que elevam a competição na economia, é importante considerar a desaceleração do comércio mundial, que reduz a pressão sobre preços de commodities e insumos.
Nesse contexto, abriu-se espaço para nova queda de juros pelo BC, especialmente com o menor risco de uma reforma da Previdência muito tímida, ainda que a exclusão de Estados e municípios preocupe bastante e outras medidas de ajuste fiscal sejam necessárias nos próximos anos para permitir o cumprimento da regra do teto (os gastos públicos não podem aumentar além da inflação).
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A dosagem de corte de 0,5 ponto porcentual, levando a taxa Selic para 6% ao ano, e não um 0,25 ponto porcentual, mais cauteloso, sugere um BC confiante em sua estratégia ou talvez enxergando uma janela de oportunidade para reduzir os juros em meio a incertezas futuras.
Pode haver divergências quanto ao espaço para cortes da Selic. De qualquer forma, juros mais baixos de forma consistente podem ajudar no avanço de reformas que estimulem o investimento e ganhos de produtividade.
Precisamos pavimentar o caminho do crescimento, pois este não virá apenas pelos juros baixos.
Fonte: “Estadão”, 01/08/2019