O Senado aprovou, nesta terça-feira, em primeira discussão, o texto-base da reforma da Previdência – 56 parlamentares votaram a favor; e 19, contra. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) aprovada segue as linhas gerais do projeto que foi definido pela Câmara, mas houve desidratação: a manutenção das regras do abono salarial. O benefício é concedido aos trabalhadores que no ano anterior tenham tido três meses de contrato formal de trabalho e cuja remuneração individual é de até dois salários mínimos. A PEC restringiria o benefício para pessoas que têm renda salarial de até R$ 1.364,43, mas as regras atuais permaneceram. Com isso, a previsão de economia, que era de R$ 876 bilhões em dez anos, caiu para R$ 870 bilhões.
Em entrevista ao Instituto Millenium, o economista Paulo Tafner considerou boa a aprovação da Reforma da Previdência no primeiro turno, mas lamentou a manutenção das regras atuais do abono salarial. “O primeiro aspecto é positivo. Aprovaram o relatório e isso é bom. Porém, a questão do abono é uma pena, sobretudo porque a proposta havia sido aprovada na Casa Legislativa com tramitação mais difícil, que era a Câmara”. Ouça!
Tafner explicou que, além do prejuízo às contas públicas, a concessão do abono como é feita hoje é injusta, uma vez que não abrange a grande maioria dos trabalhadores. “Do ponto de vista técnico, o abono salarial atinge muito pouca gente em situação de pobreza ou extrema pobreza. É um benefício caro e que não atende o enorme conjunto de desempregados no Brasil ou quem trabalha no mercado informal, que representa 42% da força de trabalho. Então, atende quem? Atende quem já está protegido. Lamentavelmente, não houve maioria suficiente”, disse.
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Especialista em Previdência, Tafner ressaltou que a proposta não tem o condão de reduzir desigualdades. “Se uma família de classe média tem um filho jovem que ganha R$ 1,7 mil, ele terá direito ao abono ainda que seja de classe média ou alta. O abono atinge famílias pobres? Atinge, mas atinge os ‘não pobres’ também. Estamos tratando de um grupo que é um terço da força de trabalho. O que se propunha era focar um pouco mais no combate à pobreza, mas não foi isso que o Senado escolheu”, disse.
Apesar da desidratação, a aprovação da Reforma da Previdência é uma boa notícia, na visão de Tafner. “O resultado é positivo e sinaliza para toda a sociedade que o governo vem tentando fazer um controle dos gastos e, portanto, reduz a pressão sobre a dívida, que já bateu 80% do PIB, muito além do que é em países semelhantes ao Brasil. A perspectiva é que a gente conviva com déficit por alguns anos, com impactos negativos sobre juros e outras políticas públicas, mas deixamos de lado um caminho explosivo no gasto previdenciário. Isso é positivo”.
Tafner destacou, ainda, a importância da inclusão de estados e municípios na nova Previdência – uma PEC paralela à proposta principal tramita no Senado. “Tem que dar uma resposta para os governos estaduais e municipais. Alguns governadores vão tentar aprovar suas reformas e outros não, e isso vai ser ruim, pois teremos vários tipos de brasileiros sob a ótica previdenciária. O servidor da União vai ter uma regra e os estaduais terão regras muito mais generosas, ainda que os estados estejam à bancarrota, como é o caso do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Goiás e Minas Gerais”.
Primeiro passo da agenda de reformas
O especialista do Instituto Millenium destacou que, superada a questão previdenciária, é hora de seguir em frente com a agenda de reformas do Brasil. “É preciso ter a abertura de espaço para o setor privado. O Estado não tem mais condições de suportar a economia. É necessário deixar os empreendedores, de todos os tamanhos, gerarem riqueza no país. Para isso, é necessária uma série de questões. A primeira é uma reforma tributária que, além de simplificar, sinalize no médio prazo para redução da carga de impostos”, destacou.
Para Tafner, outro ponto fundamental é privatizar, deixando o governo focado em serviços públicos essenciais. “Ao fazer isso, se impõe dinâmica de busca de performance, de melhoria e de atividade no setor privado. Uma coisa é uma estatal atendendo a objetivos múltiplos, inclusive de compadrio político; outra é o setor privado, preocupado com os ganhos da sua atividade”, disse, destacando também a importância de o Brasil abrir a economia e estar mais inserido no cenário global.
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Outra agenda essencial, na visão do economista, é uma reforma do Estado. “Hoje, o governo consome 40% do PIB. A saúde é precária, com filas enormes. A segurança pública não atende à demanda das pessoas que querem ter um pouco de paz no país. Na Justiça, um caso simples demora um ano para ser resolvido, o que gera uma ineficiência no sistema enorme, além de criar insegurança jurídica. Não é mais possível que o cidadão pague este total e a gente tenha um serviço de péssima qualidade”, disse.