Onde você estava no momento do atentado de 11 de setembro de 2001? Era uma pergunta frequente até poucos anos atrás. Pois eu estava no Banco Central, em Brasília, atuava como presidente interino. O titular, Arminio Fraga, estava justamente nos Estados Unidos. Os diretores se revezavam nas eventuais substituições do presidente e eu fui premiado com o atentado do Osama bin Laden. O choque com as imagens das torres caindo deu lugar à preocupação com o dia a dia. A exemplo de outros bancos centrais no mundo, essencial era colocar liquidez à disposição do sistema financeiro, mesmo que não viesse a ser usada. Mas os mercados podiam/deviam continuar a funcionar normalmente? Ninguém sabia a extensão do atentado, nem suas consequências. A morte de Osama bin Laden me fez relembrar esse momento. Ter capacidade de absorver choques é essencial para uma economia saudável. E ter instituições fortes é importante para o desenvolvimento econômico sustentável. E, hoje, quase dez anos depois, como está o Brasil nesses quesitos?
A pergunta não é tão simples como parece. É claro que a economia hoje possui mais defesas. Há reservas internacionais abundantes para evitar as consequências negativas de uma “parada brusca”, quando ocorrem saídas fortes de fluxos de capital. E a reação à crise financeira internacional de 2008 (quebra do Lehman Brothers) mostrou que o sistema financeiro é sólido e o governo tem capacidade de implementar políticas anticíclicas (que evitam a recessão profunda). Mas é também verdade que o Brasil se acostumou às favoráveis condições internacionais — o crescimento acelerado da China e outros emergentes elevou os preços da nossa pauta exportada em 142% desde setembro de 2001.
Os maiores problemas hoje são mais de excesso (de fluxos de capital, por exemplo), do que de falta. E o Brasil tem mais a perder. Há pleno emprego, renda crescente numa classe média em ascensão, confiança em alta dos empresários, investidores e consumidores, baixo risco percebido e muitos projetos de investimento a caminho, inclusive aqueles ligados ao pré-sal, à Copa do Mundo e às Olimpíadas.
Mas o que faria o Brasil depender menos das condições favoráveis internacionais?
Países crescem (em especial economias emergentes) quando as condições externas estimulam, mas também quando geram dinâmica própria em função de bases sólidas. Muitas vezes o crescimento é resultado de ambos. No momento, as condições externas têm sido importantes. Na América do Sul, o crescimento elevado ocorreu em quase todos os países em que políticas econômicas e instituições diferem significativamente (pensem na diversidade entre Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela) . Não parece que haja um determinado conjunto de políticas domésticas que explique por si só o desempenho favorável desses países nos últimos anos.
No Brasil dos últimos anos, parece haver sinais de fatores internos e externos. O desenvolvimento nesses anos deve-se à mudança nas instituições no passado, mas também às condições internacionais. Nos fatores internos, o respeito aos contratos, a estabilidade macroeconômica, as reformas econômicas (macro e micro), a maior mobilidade social através da distribuição de renda, a criação das agências reguladoras, entre outros, foram essencias.
Para a frente a questão é relevante. Há incentivo para continuar crescendo, mesmo quando os impulsos externos não forem tão favoráveis (ou mesmo desfavoráveis)? As regras formais e informais estão ainda gerando os incentivos corretos para crescer? E houve avanço adicional das instituições, removendo obstáculos existentes anteriormente?
A morte do Osama bin Laden me fez lembrar do atentado de 11 de setembro, da triste tragédia humana e de sua vulnerabilidade. Mas, também, me fez lembrar da vulnerabilidade das economias. E do esforço necessário para criar os incentivos corretos para o crescimento sustentável, que não dependam das condições internacionais, que podem não ser tão favoráveis como nos últimos anos.
Fonte: O Globo, 03/05/2011
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