“Sem altas expectativas de aprendizagem para todos, o Brasil não chega ao século XXI”, alerta Claudia Costin. Nesta segunda parte da série de entrevistas especiais sobre educação, a Doutora em Administração Pública, professora e diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) lista quatro questões que devem ser tratadas como prioridade pelo Ministério da Educação (MEC). Para ela, é preciso urgentemente melhorar o ensino de crianças e adolescentes no Brasil, mas também dar atenção à formação dos professores. Ouça!
1. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
A BNCC define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagem essencial para todos os alunos da educação básica. Tanto a parte de educação infantil, quanto a dos ensinos fundamental e médio já foram aprovadas. Segundo Claudia Costin, os próximos passos envolvem a conclusão da tradução do conteúdo referente à educação infantil e ensino fundamental em currículos estaduais e municipais, já realizada em algumas regiões. Depois, é importante dar andamento à tradução da base no currículo do ensino médio que, de acordo com a especialista, é muito mais complexa pela diversidade dos chamados “itinerários formativos”, que permitem ao estudante optar por uma especialização como linguagem, matemática, ou ainda uma formação técnica ou especializada em áreas científicas.
“Com a reforma do ensino médio, em vez do jovem cursar 13 matérias em quatro horas de aula, o que acaba não aprofundando em nada, ele vai poder escolher um itinerário formativo, e as redes estaduais, municipais e as escolas privadas poderão se organizar para oferecer dois ou mais itinerários. Isso tudo precisa ser detalhado, com materiais de apoio aos professores para a sua implementação”, destaca.
Esse trabalho, no entanto, deve ser feito com um olhar de altas expectativas de aprendizagem para todos os estudantes, sem exceção, com a finalidade de gerar igualdade de oportunidade e dotar os jovens com competências demandadas pelo século XXI e suas mudanças nos postos de trabalho, oriundas da quarta revolução industrial:
“Hoje, infelizmente, temos uma estratégia de ensino muito tradicional e de baixas expectativas em relação aos alunos de escolas públicas, como se o fato deles viverem em meios mais vulneráveis justificasse ter uma educação de segundo nível. O desafio que a base nos coloca é finalmente definirmos o que é esperado, inspirado nos melhores temas educacionais do mundo, mas a gente quer, ao mesmo tempo em que pensamos em excelência, pensar também em equidade”, alerta Costin.
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2. Formação de professores no ensino superior
A preparação dos professores nas universidades também é algo que precisa ser revisto, segundo Costin. Para ela, os cursos no Brasil são muito teóricos, focados em disciplinas como sociologia, história e filosofia da educação, com pouca ênfase na formação de uma profissão de fato. “Na Finlândia, por exemplo, a formação de professores é profissionalizante, o que quer dizer que se ensina como o cérebro aprende, melhores estratégias de aula para cada disciplina, como se assegurar uma alfabetização bem feita, inclusive para crianças com deficiências intelectual ou auditiva etc”. Essa questão soma-se ao fato de que, no país, a profissão é desvalorizada, com baixos salários e reconhecimento, o que acaba atraindo os alunos com menos desempenho no ensino médio para a carreira.
O ex-ministro da educação, Ricardo Vélez, paralisou o andamento da Base Nacional Docente, preparada pelo MEC durante o governo Temer para formar melhor os professores nas universidades. A especialista reforça que esta discussão deve ser retomada urgentemente.
3. O financiamento da educação
O fundeb, fundo de recursos para melhorar a educação do país, tem validade até 2020. Isso significa que o Congresso terá de fazer uma nova votação para definir o futuro desta questão. Na opinião de Claudia Costin, o MEC deve exercer um papel de liderança nessa negociação, resolvendo gargalos do antigo modelo. Um dos pontos que podem ser revistos, por exemplo, é a insuficiência distributivista. “Temos, de alguma maneira, que pagar mais aos estados mais pobres, porque eles têm uma população menos envelhecida do que São Paulo e Rio de Janeiro, e precisam de mais recursos para avançar”.
Para a especialista, além de mais recursos, também é preciso geri-los de forma eficaz. “Hoje, o gasto como porcentagem do PIB é superior que a média da OCDE e isso faz as pessoas pensarem que a gente pode cortar despesas em educação básica. Infelizmente, quando olhamos para o gasto por aluno, ele é muito inferior ao que a organização pratica e, além disso, estamos em outro momento em termos de transição demográfica. Quando temos uma população envelhecida, é mais fácil gastar menos em educação, e não é a nossa realidade ainda”, destaca, ressaltando que há muitos jovens no Brasil.
4. Avaliando a educação
Há um paradoxo no país quando se trata de avaliar a educação. Por um lado, o Brasil é referência internacional na produção de estatísticas e avaliações de qualidade, como o SAEB, Sistema de Avaliação da Educação Básica, e o próprio Enem. No entanto, segundo Costin, o país falha na hora de aplicar esses dados. “Precisamos capacitar os gestores educacionais e escolares em como usar os dados da avaliação para melhorar o desempenho de cada escola”.