Uma startup paulistana está inovando no gerenciamento de resíduos sólidos urbanos e industriais, um problema que atormenta todo o planeta. Baseada na tecnologia blockchain, o software como serviço Plataforma Verde, criado pela Green Plataforms, integra todos os envolvidos na gestão de lixo e de materiais remanescentes da produção industrial e da atividade comercial, em um sistema transparente, compartilhado e de corresponsabilidade.
A plataforma permite todo o rastreamento online, desde a geração até a destinação final dos resíduos, ajudando a inibir aterros irregulares, pontos de descarte viciados e a atuação de empresas não autorizadas.
A Plataforma Verde começou a operar em janeiro de 2017 e já conta com 1500 clientes e 25 mil empresas cadastradas, entre geradores, transportadores e receptores. O sistema inclui módulos para cada um dos elos da cadeia – indústrias, comércios, transportadores, aterros e recicladores.
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Pelo software na nuvem, as empresas têm um canal de comunicação direto, fazem a gestão de todo o processo, incluindo prazos, documentos, receitas e despesas, e emitem relatórios detalhados. “A Riachuelo usa em todas as lojas. Conseguimos consolidar os dados por região, por tamanho de loja e por faturamento. A Basf faz o controle por linha de produção”, exemplifica Chicko Sousa, 39 anos, fundador e CEO da Green Plataforms.
As empresas pagam uma mensalidade para usar o SaaS, que varia de R$ 399 a R$ 3 mil, de acordo com a posição na cadeia, a visualização e as funcionalidades. Para os municípios com mais de 500 mil habitantes, a empresa doa o sistema de fiscalização. O objetivo é aumentar a vigilância e, com isso, garantir maior adesão à Política Nacional de Resíduos Sólidos. A primeira beneficiada com esse programa foi a cidade de São Paulo.
Confiabilidade com blockchain
Quando começou a desenvolver a solução, Sousa e sua equipe partiram do princípio de que o resíduo e seu peso são os mesmos em uma cadeia de gerenciamento, o que mudam são as relações comerciais e as entradas e saídas. Então criaram um sistema em blockchain onde o banco de dados é único e as informações são compartilhadas e validadas entre os diferentes elos da cadeia.
Se uma empresa gerou 15 toneladas de resíduo, o transportador valida que 15 toneladas foram transportadas e a empresa que recebe também precisa atestar essa informação. Se chegarem apenas 14,5 toneladas ao destino, o receptor precisa comprovar essa informação eletronicamente e ela retorna para os demais elos da cadeia para validação.
O valor inicial de 15 toneladas não é apagado, porque o blockchain não permite a eliminação de informações, mas o novo dado é acrescentado e passa a valer para fim de relatórios.
Em junho, a Plataforma Verde foi uma das 61 empresas premiadas como pioneira em tecnologia pelo Fórum Econômico Mundial. “A inclusão de todo o ecossistema de resíduos em uma única plataforma e a tecnologia de não repetição de dados e de chaves criptografadas entre os entes de uma cadeia foi o que levou o World Economic Forum a reconhecer nossa solução”, diz Sousa.
Além do prêmio, a Plataforma Verde passou a integrar dois grupos de trabalho do organismo internacional, um que atua na definição dos indicadores de produção limpa, que serão assinados em Davos em 2020 e, mais recentemente, o que se propõe a discutir a questão da força de trabalho na chamada quarta revolução industrial.
Formado em engenharia mecânica, Chicko Sousa atuou em projetos de sustentabilidade na Volvo e na Mili Papéis, do grupo Kapersul. Neste último, trabalhou na criação de 13 unidades de reciclagem e gerenciamento de resíduos ao longo de 11 anos. “Para realizar esse trabalho, passei o ano de 2002 aprendendo sobre reciclagem lá fora, tendo como benchmarks a Áustria, a Alemanha, a Itália e a Espanha”, diz.
Entre o fim de 2013 e o início de 2014, ele deixou o grupo para se dedicar ao projeto que se transformaria na Plataforma Verde.
Em 2015, a empresa começou a executar o piloto da plataforma com as concessionárias urbanas da cidade de São Paulo para rastrear toda a coleta seletiva de lixo e o atendimento legal do processo. “Logo percebemos que havia ali um produto, além de software de fiscalização e de rastreio”, conta Sousa. “Então, procuramos a Renault do Brasil, mostramos o projeto e a empresa se interessou em ser o primeiro usuário privado.”
Versão comercial
Em 2016, a montadora começou a usar a solução da Green Plataforms em seu processo industrial e contribuiu com o aprimoramento da ferramenta do seu ponto de vista de geradora de resíduos.
No meio do ano, a Renault disse que cancelaria o contrato com seus antigos gerenciadores de resíduos se a Green Plataform dissesse que manteria o sistema em funcionamento, já que ele estava atendendo suas necessidades. “Tínhamos então o nosso MVP (produto viável mínimo) e começamos a operar em 2017”, lembra Sousa.
Logo começaram a entrar várias empresas no processo, solicitando soluções de gestão para seus problemas, entre elas outras empresas de geração, transporte e tratamento de resíduos, até que a Plataforma Verde ganhasse a configuração atual.
Sousa conta que o faturamento da Green Plataforms em janeiro de 2017 foi de apenas R$ 450 e que a empresa fechou o ano com R$ 1,080 milhão de receita. A meta para 2018 é triplicar o faturamento. “Sabemos escalar a tecnologia, mas ainda temos que aprender a escalar a comercialização”, diz.
Segundo ele, a demanda é grande e o crescimento do negócio é 100% orgânico, ou seja os clientes cadastram as empresas com as quais trabalham na plataforma e essas empresas acabam entrando em contato para aderir ao processo. A Green Plataform tem uma equipe de 22 pessoas, entre as quais não há nenhum vendedor.
Desde o início do desenvolvimento, Chicko Sousa fez um investimento pessoal de R$ 2 milhões de reais na empresa. Para atender à demanda de clientes pela internacionalização da plataforma, ele está conversando com alguns fundos de investimentos.
Hoje, a Plataforma Verde está com estudos e pilotos em Andhra Pradesh, na Índia, Dongguan, na China, e em Chicago, nos Estados Unidos, como resultado do trabalho desenvolvido junto ao Fórum Econômico Mundial. Um dos clientes da plataforma no Brasil também está usando a solução em uma de suas unidades no Chile. “A questão é estruturar a empresa de forma correta”, diz. “O bacana de tudo isso é que estamos eliminando as fronteiras da digitalização de resíduos.”
Fonte: “Pequenas Empresas & Grandes Negócios”