O processo eleitoral de 2018 é considerado um dos mais atípicos das últimas décadas. Além de resultados já aguardados pelos analistas, como o segundo turno para Presidência polarizado entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), as urnas reveleram inesperados cenários. Entre eles, as altíssimas taxas de renovação no Congresso Nacional. Na Câmara, esse índice foi o maior desde 1998, alcançando 52%, segundo levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Já o Senado teve a mais alta renovação desde a redemocratização. De cada quatro senadores que tentaram a reeleição, três não conseguiram se manter no cargo.
Em entrevista ao Instituto Millenium, os cientistas políticos Paulo Kramer e Murilo Medeiros analisaram o atual cenário da política no Brasil. Para os especialistas, o alto grau de repúdio à política tradicional e o sentimento “anti-PT” da população favoreceram o resultado do segundo turno para a Presidência. “As eleições foram as mais surpreendentes dos últimos tempos, cheias de simbolismo e quebra de paradigmas. A corrida presidencial foi plebiscitária entre PT e o ‘anti-PT’ e transformou os candidatos do pelotão de trás em nanicos. Pela primeira vez desde 1994, não temos uma polarização na disputa final entre PSDB e PT”, relembrou Murilo. Ouça no player abaixo a entrevista completa com Murilo Medeiros!
A taxa de abstenção também chamou a atenção neste pleito e ultrapassou os 20%. Isso quer dizer que mais de 29 milhões de eleitores não compareceram às urnas. Para Paulo, este é um recado claro da população. “Não existe voto nulo, branco ou abstenção a favor. É um voto contra tudo que aí está”.
As taxas de renovação no Congresso também surpreenderam os analistas, que acreditavam que as atuais regras do sistema eleitoral prejudicaram ainda mais a ascensão de novos nomes ao Legislativo. “O remendo eleitoral aprovado no ano passado para regulamentar a eleições de 2018 centralizou muito os recursos financeiros públicos, dos fundos eleitoral e partidário, nas chamadas direções nacionais dos partidos. Com isso, e também com a redução drástica no tempo de propaganda eleitoral, acreditamos que seria mais difícil para os novatos se tornarem conhecidos. Mas não foi o que aconteceu”, destacou Paulo. Ouça a entrevista completa com Paulo Kramer no player abaixo!
Para Murilo, houve ainda uma mudança no centro político brasileiro. “Grandes figuras, sobretudo do Senado Federal, não conseguiram renovar seus mandatos. Uma onda conservadora varreu vários estados e o centro político do país”.
Outra característica desta eleição é a alta fragmentação do Senado, já considerada a maior da história. Vinte e um partidos ocuparão cadeiras na casa no próximo mandato. Paulo explicou que esse cenário tem reflexos diretos na atuação do próximo presidente. “Isso significa maiores desafios para a negociação da governabilidade. Quanto mais fragmentado é o quadro partidário, tradicionalmente maior tem sido a dificuldade do presidente da República negociar”.
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Passado o momento inicial, o foco agora é a corrida eleitoral para o Palácio do Planalto. Diante da falta de promessas factíveis no primeiro turno, Murilo ressaltou que este é o momento dos candidatos apresentarem aos eleitores o seu plano de governo e qual é o caminho que acreditam ser o ideal para o Brasil nos próximos quatro anos. “Acho muito importante que eles consigam aproveitar o tempo para discutir os reais problemas do país. Estamos presos nesse círculo vicioso onde se discutem nomes, mas não propostas. Essa é uma oportunidade deles mostrarem quais são elas, seja para a área tributária, reforma da Previdência, reforma do Estado etc.”.