Beatriz Salumoni*
Para aqueles que acompanham minimamente a política brasileira, as eleições municipais são uma importante ferramenta de análise para se ter uma amostra dos rumos da política nacional. *Beatriz Salumoniprimeiro turno das eleições municipais oferecem um retrato sobre o cenário político atual e indica possíveis tendências para as eleições estaduais e federais que ocorrerão em 2026.
Este panorama pode ser analisado a partir de quatro grandes temas vinculados aos espectros políticos predominantes: o fortalecimento do centrão, que saiu como o principal vitorioso; a permanência da direita, sendo a força política contemporânea mais expressiva do país; as sucessivas derrotas da esquerda, que enfrenta claros desafios para manter sua governabilidade e liderança; e as perspectivas da direita pós-bolsonarista, com a possível tendência de uma ascensão gradual de correntes mais moderadas desse campo político.
As urnas nos confirmam: o “centrão” foi o grande vitorioso dessas eleições, mantendo seu controverso papel de uma espécie de checks and balances próprio do sistema político nacional. O PSD de Gilberto Kassab, foi o vencedor com 882 prefeitos eleitos em primeiro turno, MDB com 856 – o qual dominava o ranking desde 2000 – e o PP de Ciro Nogueira com 748 prefeituras. Esse cenário privilegiado deixa o campo da esquerda dependente no curto prazo para negociações e pressionado para Lula aumentar sua popularidade a fim de atrair mais aliados. Nessa eleição, a política tradicional acabou levando a melhor, mesmo com uma dominância maior da direita e das ideologias que a compõe, como o conservadorismo e o liberalismo.
As dificuldades da esquerda ficam ainda mais evidentes nessas eleições, com o partido apostando em um cenário mais polarizado e figuras relevantes do partido, como Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, minimizando os pontos de preocupação dos partidos deste campo após os resultados. A decisão de Lula em não atuar como um cabo eleitoral também contribuiu para esse cenário: o PT não venceu nenhum pleito em primeiro turno nas capitais e naquelas em que avançou para segundo turno, não lidera nas pesquisas, correndo o perigo de repetir o resultado de 2020, quando não alcançou nenhuma prefeitura de nenhuma capital.
A esquerda vem sentindo sucessivos baques ao longo da última década, com um grande suspiro na eleição de Lula para um terceiro mandato. A canalização da liderança da esquerda para somente a figura de Lula foi um dos fatores que mais prejudicou o desempenho no longo prazo, aliado ao momento histórico em que o mundo vive, onde o seu auge já foi ultrapassado, até o momento. No entanto, mesmo em um de seus piores momentos, a capacidade de articulação de um campo que dominou a política na maior parte do tempo pós-redemocratização não pode ser negligenciada. Afinal, como disse Kassab a CNN: “Desprezar Lula é para quem não conhece a política”.
A permanência do bolsonarismo e a continuidade da guinada à direita no Brasil também é um fator a ser evidenciado, com o PL elegendo 512 prefeitos em primeiro turno, mais que o dobro do PT, com 248 prefeituras. O PL também obteve vitórias em primeiro turno em 2 capitais e avança para segundo turno em outras 9, em 7 larga na frente de acordo com as pesquisas.
A onda antipetista, iniciada há um pouco mais de 10 anos atrás com seu auge no governo anterior, ainda está longe de acabar, graças a uma relevante mudança cultural pela qual o Brasil passou. No entanto, é importante salientar que o horizonte da direita não é um completo céu de brigadeiro: esta se encontra rachada em algumas regiões, com o caso mais relevante sendo o de Pablo Marçal em São Paulo. Da mesma forma que a escassez de lideranças é um problema na esquerda, o excesso delas pode ser um problema a médio ou longo prazo para a direita, que precisaria se unir para conseguir resultados ainda mais expressivos.
A situação da direita pós-bolsonarista é um questionamento de muitos especialistas e entusiastas da política nacional. A reversão da inelegibilidade de Bolsonaro é vista por alguns como uma possibilidade, mas pouco provável. No entanto, nomes dentro da direita não faltam. Um eventual nome de centro ou centro-direita pode retirar de Lula alianças muito importantes. E esse nome pode ser Tarcísio de Freitas, tido por Gilberto Kassab como o maior nome da renovação política nacional, em entrevista para a CNN. Tarcísio é um dos grandes vencedores destas eleições: derrota Marçal, leva Ricardo Nunes para o segundo turno e sai ainda mais fortalecido para uma reeleição para governador ou até mesmo uma eventual empreitada para a presidência. Nesse contexto, também vemos uma vertente mais moderada da direita ganhando seu espaço, resultado do amadurecimento do debate nesse campo ideológico.
*Beatriz Salumoni é graduanda em Administração de Empresas pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV – EAESP) e ex-diretora de Formação do Instituto de Formação de Líderes Jovem de São Paulo (IFL Jovem SP).