Pessoas pouco treinadas no ‘modo econômico de pensar’ (economic way of thinking) aceitam com facilidade os conceitos equivocados de ‘atividade essencial’ e ‘atividade não essencial’. São incapazes de perceber a complexidade e a interdependência dos mercados, bem como a sua fragilidade. Isso para não mencionar a imoralidade de se considerar o trabalho honesto de alguém uma atividade menos nobre que outra qualquer. Mas, neste pequeno texto, vamos focar no aspecto econômico apenas.
Não se pode simplesmente desligar na marra a maior a parte da economia e achar que as demais – no caso aquelas que os burocratas de plantão consideram essenciais – conseguirão dar conta do recado sem maiores problemas. Eu poderia aqui dar inúmeros exemplos, mas ficarei num que já foi bastante comentado.
Ninguém discute que os produtores rurais de alimentos, principalmente os pequenos agricultores que nos suprem diariamente com produtos frescos como hortaliças, frutas, legumes, ovos, leite, etc.. Esses pequenos produtores, assim como qualquer empresa, remuneram seu trabalho a partir de cálculos econômicos, como produtividade marginal, ‘break even point’, lucros e perdas, ainda que alguns possam nem se dar conta disso, porque o fazem de modo intuitivo e baseados na experiência de longos anos. Eles sabem por exemplo, que dado um determinado preço de mercado e os custos de produção, precisarão vender uma quantidade acima de X (break even) para que comecem a lucrar com seu trabalho.
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Seus consumidores finais são os feirantes, os supermercados, os restaurantes, as escolas. Com o fechamento de boa parte desses estabelecimentos, principalmente restaurantes e escolas, a queda nas vendas tem sido absurda. Alguns agricultores estimam perdas por volta de 70% e muitos estão sendo obrigados a jogar fora grande parte da sua produção. Com isso, seus prejuízos serão enormes e, mesmo com aumentos nos preços de venda, já que a produção terá de ser certamente menor, provavelmente não conseguirão sequer igualar os custos de produção, levando muitos à falência ou à paralisação, pelo menos até que o mercado volte ao normal.
Quem frequenta o supermercado ou as feiras livres já sentiu um bom aumento dos preços em vários produtos da cesta básica, como cenoura, batata, cebola, tomate, alho, leite, ovos, etc. – e, em alguns casos, a própria escassez nas prateleiras. Analistas apressados atribuem a alta dos preços ao aumento da demanda nos supermercados, mas esta conclusão é absolutamente equivocada. O aumento dos preços se deve principalmente à redução da oferta, pelos motivos acima.
Esses aumentos de preços ainda não se fizeram sentir nos índices de inflação porque itens importantes no seu cálculo, como combustíveis e lubrificantes, fretes e produtos industrializados, principalmente bens duráveis, cujos estoques das indústrias, que estão vendendo apenas pela internet, ainda estão altos.
Enfim, como na maioria das engrenagens complexas, como um relógio, por exemplo, a ausência de qualquer peça, ainda que muito pequena, interfere no bom funcionamento do mesmo.