Se há dois anos a discussão era se o Brasil vivia uma situação de pleno emprego, hoje os indicadores de demissões preocupam. Em maio, a taxa de desocupação fechou em 6,7%, a maior para um mês de maio desde 2010, quando o desemprego foi de 7,5%, segundo o IBGE. Sem conseguir uma recolocação, parte desses trabalhadores tem no empreendedorismo uma alternativa.
O que deve ocorrer no futuro, na visão dos especialistas, é um impacto dessa movimentação na taxa do empreendedorismo por necessidade, aquele buscado quando não existe melhor opção de trabalho ou renda. O risco está na tomada de decisões precipitadas e sem planejamento e o desafio é transformar necessidade em oportunidade.
Em 2014, a taxa de empreendedorismo por necessidade ficou em 29,1% ante 28,6% em 2013. Para a coordenadora da pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM), Simara Greco, é provável que o desemprego influencie essa participação, mas isso deve ser percebido, de fato, nos próximos anos.
Ainda mais no Brasil. Por aqui, 31% da população se enquadra em um perfil ‘situacionista’, segundo pesquisa da Endeavor. Isso quer dizer que apesar de muitos sonharem em ter o próprio negócio, na prática, eles só o fazem se de alguma forma forem levados a isso – pelo desemprego ou por uma oportunidade que ‘caiu no colo’.
“Na nossa visão, não é necessariamente ruim o fato do mercado não estar aquecido e (haver) essa necessidade adicional de abrir um negócio. Tudo depende do que o empreendedor faz com isso. De forma geral, a necessidade pode se tornar uma grande oportunidade. Cabe ao empreendedor identificar o desafio”, destaca Pamella Gonçalves, diretora de Pesquisa e Mobilização da Endeavor.
Foi o que fez Jorge Alberto da Silva. Mas apenas na segunda tentativa e com a ajuda da mulher Lúcia. Em 1992, Silva, então diretor industrial de uma multinacional, se viu sem emprego e resolveu montar um pequeno mercado – desistiu devido aos assaltos constantes. Depois, ele apostou na ideia da mulher de investir nos bombons regionais. Ele chegou a desconfiar da ideia, afinal, a concorrência era alta na área, mas Lúcia o convenceu a ir em frente e aproveitar a experiência adquirida na multinacional para efetivamente empreender.
“Eu lembro que minha ideia era montar o negócio, deixar que ela trabalhasse para eu conseguir outro emprego. Mas a coisa começou a crescer de tal modo que não deu mais para sair”, lembra Silva, fundador da Bombons Finos da Amazônia, que hoje produz 12 toneladas por mês. Quando começou a empresa familiar, a média era de 300 quilos por ano. Como tinha um salário alto, Silva teve dificuldades de recolocação após a demissão. “Você fica sem rumo. Imagina trabalhar 13 anos em uma empresa. De repente você sai e acha que não sabe fazer mais nada.”
No caso de Agnes Martins, o negócio próprio começou após duas demissões, a última quando era auxiliar de faturamento. Após essa primeira experiência negativa, Agnes comprou uma máquina de costura, mas só começou a atuar após sair do emprego de analista de crédito. O dinheiro da rescisão foi utilizado para comprar linhas e tecidos para produzir bolsas. “Tudo começou como um hobby e uma fonte alternativa de renda. Era uma alternativa porque estava difícil de arrumar emprego”, conta Agnes, que depois se especializou, montou ateliê e hoje dá cursos.
Perigos
O risco de empreender após a perda do emprego está justamente em tomar decisões precipitadas. “O empreendedor tem um planejamento menor e toma decisões em um momento emocionalmente frágil, pressionado pela família e pelas pessoas que estão em volta dele”, pontua o professor de empreendedorismo do Insper, Marcelo Nakagawa.
Opinião
O presidente do Sebrae, Luiz Barretto, engrossa o coro dos que acreditam na transformação do empreendedorismo por necessidade em oportunidade. “Ficar desempregado pode fazer com que o empreendedor analise o mercado e perceba nichos que ainda não foram explorados ou ainda novos campos para expandir. Além disso, com capacitação e planejamento, é possível transformar a qualidade e o tipo do empreendedorismo”, afirma.
Fonte: O Estado de S.Paulo.
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