Do ponto de vista de expectativa econômica, 2020 começa melhor do que 2019 na visão de 12 empresários de grandes companhias consultados pelo GLOBO ao longo de um mês. Atuando em diferente setores — de consumo e educação a agronegócio e transporte —, eles preveem para este ano um crescimento mais robusto e a retomada dos investimentos.
Não se trata de um otimismo de torcida. As apostas de expansão da economia estão em linha com as projeções feitas pelo mercado no começo deste novo ano: o país deverá crescer algo entre 1,5% e 3%, ainda índices modestos, mas mais expressivos do que o registrado nos últimos três anos — 1%.
— O importante é olhar no retrovisor e ver que o Brasil afastou-se, definitivamente, da crise que marcou a segunda metade da década passada — diz André Clark Juliano, presidente da operação brasileira da Siemens, conglomerado industrial com negócios nos setores de energia, automação e saúde, entre outros.
“A burocracia e a aversão ao risco são tragédias para a produtividade”
Esse otimismo está calcado em uma mudança fundamental: o investimento está sendo direcionado ao setor produtivo. Com a taxa básica de juros no patamar de 4,5%, o Brasil perde a atratividade para os investidores que vinham especular e ganhar com taxas elevadas. A perspectiva para este ano é de mais recursos para melhoria das condições de produção, como ampliação de fábricas e treinamento de mão de obra.
— Já sentimos mais disposição para investimentos em inovação na nossa cadeia de fornecedores, o que é positivo para a produtividade no varejo — diz o francês Noël Prioux, presidente do braço brasileiro da varejista global Carrefour.
O bom humor do empresariado, contudo, não significa cegueira para riscos. O cenário externo é o maior fator de incertezas, com o impasse nas negociações comerciais entre Estados Unidos e China e as dúvidas sobre o novo governo argentino. Estes fatores podem atrapalhar as ambições brasileiras de vender mais a esses mercados. Semana passada, a crise entre EUA e Irã surgiu como nova preocupação.
No capítulo dos riscos internos, está o ritmo de andamento da agenda de reformas. Os empresários cobram celeridade especialmente na tributária. Se avançar, é grande a chance de o empresariado terminar o ano ainda mais otimista do que começou.
Confira a seguir a visão dos empresários.
Modernização da frota e aumento da oferta
Jerome Cadier, presidente da Latam no Brasil
O executivo começou o ano mais aliviado do que entrou 2019. Para o executivo, a aviação civil superou o fim da Avianca Brasil, que tirou aviões de circulação e encareceu as viagens aéreas. Este ano, a empresa planeja investir US$ 250 milhões na modernização da frota brasileira. A oferta de assentos aqui deve crescer 9%, acima da média global da companhia: 5%.
— O Brasil ganhou relevância para a Latam — comenta Cadier, que prevê uma alta de 2% no PIB em 2020, puxada pela retomada da confiança de empresas e famílias.
Para o executivo, o otimismo só não é maior por causa da lentidão das reformas, que, na sua opinião, podem andar de lado por causa das eleições municipais.
Eventos são termômetro do momento positivo
Chieko Aoki, presidente da Blue Tree Hotels
A empresária costuma antever as tendências da economia a partir de um indicador bastante peculiar: o volume de eventos de negócios realizados nas 22 unidades da rede hoteleira Blue Tree, que fundou em 1992. A julgar por este termômetro, a perspectiva para 2020 é positiva.
— O ano de 2019 terminou num ritmo de reservas bem mais elevado do que começou — diz Chieko, que prevê uma alta de 2,2% do PIB para 2020, puxada pela maior disposição ao consumo por parte de famílias e empresas.
Para aproveitar o bom momento, Chieko está de olho em oportunidades para expandir a rede em São Paulo e no Nordeste:
— A região tem muito potencial turístico ainda inexplorado.
Otimismo com reformas e juro baixo
André Clark Juliano, presidente da multinacional Siemens no Brasil
Para ele, a economia pode crescer 3% em 2020. É bem acima do esperado pelo mercado — a projeção do Boletim Focus, do Banco Central, está em 2,3%. Na origem de tanto otimismo está a queda da taxa de juros, que abriu margem para as empresas trocarem dívidas caras por mais baratas.
— O dinheiro que sobra está sendo reinvestido, o que é bom para o país — diz. — O Brasil deve atrair capital externo com o avanço de reformas como o novo marco do saneamento.
Se a economia decolar, o plano da Siemens de aportar € 1 bilhão no Brasil até 2025 pode ser antecipado em um ou dois anos, comenta o executivo.
Abertura de unidades e aquisição de concorrentes
Rodrigo Galindo, presidente da Cogna
À frente do grupo de educação dono de marcas como Somos (ensino básico) e Kroton (superior), Galindo espera crescimento de 2,5% para a economia este ano, na esteira da queda no desemprego e do aumento no consumo. Expansão em ritmo mais rápido, contudo, só com o avanço de reformas como a tributária.
“Transformação da mídia dá protagonismo para think tanks”
Ainda assim, com o que está posto para a economia em 2020, a Cogna deve investir R$ 600 milhões na abertura de unidades de ensino e em novas tecnologias para a educação à distância.
— Além disso, está no radar a aquisição de concorrentes — diz.
É uma mudança de estratégia num negócio que sofreu com perda de alunos e receitas na esteira do endurecimento das regras do Fies.
Crescimento com a redução da Selic
Camila Farani, fundadora do G2 Capital
A investidora está em um dos setores que mais comemoram a queda dos juros. Fundadora do G2 Capital, fundo de capital de risco que financia start-ups, e sócia de outros dois fundos dedicados a negócios maiores, Camila vê uma migração de recursos da renda fixa, que perde lucratividade com a Selic baixa, para investimentos como os dela. Em 2019, o setor movimentou R$ 8,9 bilhões, alta de 40% sobre o ano anterior.
— Esse número deve aumentar pelo menos 30% em 2020 — diz.
Para aproveitar o bom momento, os fundos geridos por Camila devem investir cerca de R$ 155 milhões em dois anos. Entre os setores que a investidora está de olho estão tecnologias para o varejo e inteligência artificial.
Fonte: “O Globo”