Há muito acompanho as enormes desigualdades educacionais no Brasil. Segundo o Iede-Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional, o Brasil é um dos países que participaram do último Pisa com maior diferença de desempenho entre alunos ricos e pobres.
Não será possível construir uma nação preparada para a chamada Revolução 4.0 e apta para evitar a violência e o populismo que emergem em contexto de desigualdade social crescente se a política educacional não for um potencial nivelador de diferenças de origem socioeconômica na vida futura dos jovens. Mas, infelizmente, naturalizamos aqui uma visão de que a educação para os mais pobres deveria ter baixas expectativas de aprendizagem.
Nesse contexto, pareceu-me um risco de aumento ainda maior das desigualdades, o tempo de afastamento da escola dos alunos brasileiros, que já passa de 50 dias. Certamente não havia alternativa, dada a grave crise sanitária que vivemos, mas ações de mitigação serão necessárias, tanto em aprendizagem emergencial remota quanto no retorno dos alunos às aulas.
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Venho acompanhando o esforço de estados e municípios para garantir que alunos de escolas públicas tenham seus direitos de aprender assegurado, mesmo em meio às dificuldades impostas pela pandemia. Não tem sido fácil, mas uma combinação de ensino online, para quem tem acesso à internet, com aulas por televisão e materiais impressos enviados aos estudantes tem sido uma estratégia para evitar que as desigualdades que vive o Brasil aumentem demasiadamente.
Embora sejamos bem mais desiguais que outros países, a realidade enfrentada pelas nações afetadas pela pandemia é parecida com a nossa: jovens de meios mais afluentes passam seu tempo de isolamento em lares em que os pais têm um repertório cultural maior, livros, acesso à internet de alta velocidade e julgam fundamental que seus filhos frequentem o ensino superior.
Os mais vulneráveis vivem uma realidade distinta e contam sobretudo com a escola. Por esse motivo, na maior parte dos países, os ministérios de Educação adiaram a data para a realização dos exames de acesso à universidade e simplificaram seus conteúdos, conforme mostra pesquisa recente realizada pelo Instituto Unibanco.
Nesta situação, o adiamento do Enem —tal como fizeram muitos outros países— torna-se ainda mais importante. Não queremos que o acesso à universidade seja restrito aos atuais 21% dos adultos de 25 a 34 anos, uma das piores taxas de ensino superior entre os membros ou parceiros da OCDE —e, para piorar, com uma participação ainda mais limitada de jovens que não tiveram sorte na vida.
Fonte: “Folha de São Paulo”, 15/5/2020