Principal pauta econômica do segundo semestre, a reforma tributária já tem ao menos cinco versões. Diferentemente da reforma da Previdência , o debate sobre a mudança no sistema de impostos não se concentra em apenas um texto enviado pelo governo.
Cada proposta busca contemplar os interesses de vários grupos que podem ser afetados pela medida. O setor de serviços defende tributação sobre movimentação financeira, a indústria é favorável a um imposto simplificado sobre a produção e estados e municípios temem perder mecanismos de incentivo. Em paralelo, o governo tenta aliar interesses.
Na Câmara: IVA substitui cinco tributos
Prevê a substituição de cinco impostos por um só, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Nesse modelo, os seguintes tributos seriam unificados: PIS, Cofins, IPI (federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal). A proposta de emenda à constituição (PEC), baseada no trabalho do economista Bernard Appy, foi apresentada na Câmara pelo deputado Baleia Rossi (MDB) e já foi aprovada pela Comissão e Constituição e Justiça (CCJ). O texto também prevê o fim de qualquer tipo de incentivo fiscal. A transição completa seria de 50 anos, e a arrecadação ficaria a cargo de um comitê formado por União, estados e municípios.
Como o nome sugere, o IBS incidiria sobre bens e serviços, ao longo de toda a cadeia. Empresários poderão deduzir, na hora do recolhimento, os gastos com insumos. Esse tipo de tributo é chamado de Imposto sobre Valor Adicionado (IVA). O setor de serviços tem resistências a esse tipo de modelo, porque as empresas do segmento compram poucos insumos. Ou seja, há risco de que a compensação seja menor. Já a indústria apoia pelo motivo oposto: teria a ganhar com a possibilidade de gerar crédito tributário com as despesas com insumos.
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Outro grupo de resistência é o dos estados. Governadores temem perder arrecadação com a inclusão dos tributos regionais no IBS. O fim dos incentivos fiscais previsto pela reforma também causa apreensão de estados, principalmente fora do eixo Sul-Sudeste.
Alternativa no Senado: IVA com mais impostos
A proposta segue a mesma linha da elaborada por Appy e também prevê a simplificação de impostos por meio do IBS. A principal diferença é a quantidade de tributos afetados, que seriam nove, em vez de cinco. São eles: IPI, PIS, Cofins, IOF, Salário-Educação, Cide, CSLL (todos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal). O texto também prevê mudanças no IPVA, que passaria a ser de competência municipal (hoje, é estadual) e incidiria também sobre aeronaves e embarcações.
O texto tramita no Senado e é uma cópia da proposta elaborada pelo ex-deputado Luiz Carlos Hauly, que chegou a ser aprovada em Comissão Especial da Câmara, mas acabou não indo a plenário.
Empresários: apoio à tributação sobre pagamentos
Defendida principalmente pelo setor de serviços, a proposta cria um tributo que incide sobre movimentação financeira, nos moldes da extinta CPMF. O chamado Imposto Único Federal (IUF) substituiria todos os tributos hoje em vigor, com exceção do Imposto de Renda (IR) e tributos regulatórias, como contribuições sobre comércio exterior.
A ideia foi apresentada pelo presidente do PSL, Luciano Bivar, na forma de emenda à PEC que tramita na Câmara. No início de julho, um grupo de empresários liderado pelo Movimento Brasil 200 divulgou manifesto apoiando o modelo. Eles afirmam que a tributação sobre movimentação financeira é a mais adequada para novos modelos de negócio, como serviços digitais, que não têm produção física.
Essa também é a ideia que mais agrada o secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, que defende o modelo há cerca de 30 anos. No governo, Cintra já admite ceder e propor um modelo híbrido.
Proposta do Governo
O governo ainda não formalizou a sua proposta, nem como o texto será apresentado — se será uma emenda ou um projeto separado. No entanto, Cintra já indicou que caminho deve seguir. A equipe econômica trabalha com a ideia de criar um imposto do tipo IVA, mas para substituir apenas impostos federais. Estados e municípios ficariam de fora, a menos que desejem ingressar no novo modelo.
Em paralelo, seria proposta um imposto sobre movimentação financeira para substituir a contribuição sobre folha de pagamento, destinada a financiar a Previdência. A ideia do governo é, ao mesmo tempo, reduzir o custo para empregadores e propor uma base de tributação mais ampla. Os técnicos afirmam que o objetivo da reforma é simplificar tributos para melhorar o ambiente de negócios, mas o presidente Jair Bolsonaro já disse que tem como meta reduzir a carga tributária, hoje acima dos 30% do PIB.
A reforma em elaboração pelo governo também prevê ainda mudanças nas regras do Imposto de Renda. Está na mesa, por exemplo, simplificar as regras do IRPJ, pago por empresas, e criar o chamado IR negativo para pessoas físicas, em que mais pobres receberão do governo, em vez de recolher tributos.
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Alternativa dos estados
Em paralelo, secretários de Fazenda elaboraram uma proposta alternativa de reforma, inspirada na PEC que tramita na Câmara. A ideia é fazer alterações ao texto que garantam a autonomia de estados e busquem resolver a questão do fim dos incentivos fiscais. Assim, o grupo propôs a criação de fundos de desenvolvimento regional, que substituiriam os benefícios tributários. A transição seria encurtada de 50 para dez anos.
Os governadores também consideram propor a unificação apenas de tributos regionais (ICMS e ISS), caso avance a ideia do governo de criar um IVA federal. Essa possibilidade, no entanto, ainda não está formulada, porque os representantes estaduais não viram a proposta do governo nesse sentido.
Fonte: “O Globo”