Lula e Dilma inventaram os truques para aumentar o gasto público e a dívida total. O resultado aparece na inflação mais alta, no baixo crescimento, na falta de investimentos, no Custo Brasil recorde, e na situação delicada de estatais
Ouvi Eduardo Campos falar para empresários e investidores de São Paulo — e o pessoal gostou muito do que o governador contou sobre sua administração em Pernambuco e sobre sua visão de Brasil. Não estavam no grupo aqueles nomes tradicionais, tipo chapa-branca, que, no fundo da alma, não gostam do PT, mas, do fundo do bolso, desgostam mais ainda de brigar com o governo. E acham que sempre se pode arrumar negócio bom mesmo numa administração ruim e/ou hostil ao capital privado.
Estavam no grupo pessoas de dinheiro, é claro, preocupadas, por exemplo, com o imposto sobre grandes fortunas. Aliás, perguntaram ao governador e adoraram a resposta. Campos disse: há impostos demais no Brasil; é preciso reduzi-los e torná-los mais progressivos; ricos devem pagar mais, mas não se pode esfolar o investidor e a empresa; e, finalmente, que o imposto sobre grandes fortunas é tecnicamente ruim, arrecada pouco e cria muita desconfiança. Ou seja, muito barulho ideológico para pouco dinheiro.
Perguntaram também sobre o chavismo e os bolivarianos. Campos aproveitou bem a deixa para mostrar seu lado “gauche”. Atacou ferozmente as velhas oligarquias venezuelanas (e, por tabela, as latino-americanas) que enriqueceram à custa de privilégios e verdadeiros assaltos ao Estado. Esse contraste entre uma elite muito rica e um povo muito pobre deu origem a Chávez e seus seguidores. Trata-se de um caminho equivocado, um atraso contra outro atraso, disse Campos, mas a forma de escapar disso é um regime moderno, democrático, capitalista e social.
Me lembrei de Tony Blair. Ou Bill Clinton. No Velho Continente, existia (ainda existe) uma esquerda socialista, estatizante, que se opunha à direita liberal tipo Thatcher. Blair inventou aí a Terceira Via: economia de mercado, ambiente de negócios amigável ao empreendedor, liberdade financeira, com forte investimento estatal nas áreas sociais, sobretudo saúde e educação. Mas, atenção: o setor público deve seguir as regras de eficiência do privado, com metas e meritocracia.
Campos encantou aquela plateia quando falou de sua gestão nas escolas de Pernambuco — diretores, professores e alunos premiados por bom desempenho, medido e avaliado regularmente — e nos hospitais, vários entregues à gestão privada.
Nos EUA, Clinton claramente colocou-se entre Ronald Reagan, seu antecessor, e a esquerda do seu Partido Democrata, esta representada por seu vice, Al Gore, e agressivamente contra o que chamava (e chama) debig money e suas variações (big oil, big pharma etc.).
FHC e Lula, o do primeiro mandato, ajudaram a formar essa Terceira Via por aqui, ainda que em condições bem diferentes. Nunca tivemos nossa Thatcher (ou nosso Reagan), de modo que FHC, um social democrata europeu, teve que tocar boa parte da agenda liberal para conquistar a estabilidade macroeconômica (metas de inflação, abertura comercial, câmbio flutuante, privatizações, responsabilidade fiscal). Começou também os programas sociais — Bolsa Escola, por exemplo, e o aumento real do salário mínimo —, seu lado esquerdo. Mas perdeu o ímpeto reformista no segundo mandato.
Lula, de origem, digamos, mais socialista, foi obrigado a manter a base da estabilidade e, ainda, sob influência de Palocci, avançou nas reformas microeconômicas, especialmente nas leis e regras que garantiram a concessão e ampliação do crédito. E mais o Bolsa Família e os aumentos do salário mínimo.
No segundo mandato e depois da crise de 2008/09, Lula começou a estragar tudo, tarefa seguida por Dilma Rousseff. Inventaram os truques para aumentar o gasto público e a dívida total, sem o confessar, e expandiram a intervenção estatal — da regulação e controle cada vez maior do setor privado ao avanço forçado das estatais, incluindo bancos, e à tentativa de aceleração de grandes obras. Sem contar o ambiente de incerteza criado por decisões do governo e dos tribunais que a todo momento criam novas obrigações e custos aos negócios. Cabe aqui a mão pesada do Fisco na interpretação e criação de regras que geram impostos e multas bilionários, numa ação ao mesmo tempo hostil ao grande capital e com o objetivo de gerar receita perdida com os subsídios aos setores privilegiados.
O resultado aparece na inflação mais alta, no baixo crescimento, na falta de investimentos (pela desconfiança do setor privado e ineficiência do setor público), no Custo Brasil recorde, na situação delicada de estatais como a Petrobras e as elétricas.
É curioso: quando se apresenta como terceira via entre PT e PSDB, Campos, na verdade, parece querer recuperar os lados positivos de FHC e Lula e mais a agenda de reformas que ficou pelo caminho. Como? Com Marina?
Fonte: O Globo, 10/10/2013
Sem um partido de direita, mesmo um democrata-conservador, que represente não só os valores micro e macroeconômicos, mas também os valores políticos, econômicos e sociais, estaremos fadados a uma situação de armadilha da renda média. Pois um governo não tem como tarefa única a questão distributiva, que é importante, mas também a questão alocativa, via concessão, ppp etc, que está ligada á eficiência, e a gulação.
Não só isso. Como Eduardo (ou Marina) vai compatibilizar a execução prática do programa de seu partido que visa a socialização dos meios de produção e ao mesmo tempo atender as demandas dos empresários, donos desses meios e portanto defensores da propriedade privada? Este seria o principal antagonismo que deveria ser esclarecido, ou não? Porque um exclui o outro, a médio prazo e longo prazo. Se não ficar claro já, será a hipocrisia da mesma laia do discurso fajuto do PT. Cadê a novidade? Depois reclamam que o “povo” vende o voto…