Na economia, são três as grandes e urgentes tarefas à frente. Uma é resolver a grave crise financeira estadual, talvez a maior de todos os tempos, especialmente a dos entes de maior peso econômico na Federação. Isso terá de acontecer o mais rápido possível, como se explica a seguir, e no centro de tudo está o equacionamento do passivo atuarial da previdência pública.
Depois, é necessário aumentar de forma sustentável a taxa de crescimento do PIB per capita, o que leva à necessidade de alterar o modelo de crescimento do Brasil, com maior ênfase na formação da poupança doméstica, o que viabilizará maiores taxas de investimento e, portanto, de crescimento da produtividade e do emprego. Nesse contexto, o investimento em infraestrutura é essencial para garantir um maior aumento da produtividade no longo prazo, e, com isso, do PIB per capita.
A partir de agora, e particularmente no fórum nacional de maio, tratarei de todos esses temas em minhas colunas, mas aqui o espaço só permitirá abordar o primeiro deles.
Veja também de Raul Velloso:
Tirar governadores não resolve
“Não podemos desistir de fazer uma reforma da Previdência mais completa”
Muito choque na Previdência
Nos três primeiros anos dos atuais mandatos (2015-17), a totalidade dos estados acumulou deficits orçamentários de R$ 35 bilhões, em contraste com os superavits que haviam acumulado em todo o mandato precedente (2011-14): R$ 11 bilhões. Ou seja, em apenas três anos, deu-se uma virada para pior de R$ 46 bilhões. Uns poucos lograram evitar deficits em 2015-17. A grandíssissima maioria terá não apenas de evitar novos deficits em 2018, como gerar uma sobra de pelo menos os R$ 35 bilhões de 2015-17, sob pena de pesadas punições legais, já que a lei proíbe a transferência de insuficiências financeiras para os mandatos seguintes.
Como tenho mostrado, há fatores explicativos tanto de ordem conjuntural como estrutural. Entre os primeiros estão a pior recessão de nossa história e a desabada dos preços do petróleo. Nos segundos, destacam-se os elevados e crescentes deficits previdenciários. Com base numa arrecadação deprimida, de 2015 a 2017, o custo, para o conjunto dos estados, dos regimes próprios de previdência passou de 17% para 22% da receita corrente líquida (RCL), um aumento de 47% em apenas dois anos. Em MG, por exemplo, subiu de 23% para 38% da RCL em 2017, aumento de não menos que 65%.
Outra questão relevante que tenho repetido nos meus discursos é que somente uma parcela pequena do orçamento pode ser usada para pagar aposentados, ou seja, a que sobra para os “primos pobres”, que, em Minas, representavam algo ao redor de 36% da receita corrente em 2016, último dado que pude apurar. E veja-se que a área de segurança pública, somente há pouco reconhecida como de alta prioridade pelo governo federal, pertence aos primos pobres. Ou seja, com o pagamento de aposentados deixado para o fim da fila, a conta não fecha. Chocante. Como os deficits acima indicados tornam evidente, a despesa orçamentária “empenhada” (ou autorizada) todos os anos fica muito acima da receita total que ingressa nos cofres estaduais. Só resta assim aos gestores atrasar pagamentos e rezar para uma solução mágica ocorrer antes que os mandatos se encerrem. Caso contrário, sanções duríssimas se seguirão.
A saída é concentrar esforços no equacionamento da previdência pública, conforme tenho enfatizado em vários textos escritos sobre o assunto, que o espaço limitado deste artigo não permite detalhar, e que possibilitará resolver os problemas conjuntural e estrutural de uma “cajadada só”.
A proposta permitirá retirar o gasto líquido da previdência pública (benefícios menos contribuições dos servidores) do orçamento, para ser pago num fundo à parte, deixando em seu lugar apenas a contribuição patronal que, a exemplo do que faria qualquer patrocinador de plano previdenciário, o setor público tem de bancar.
Nesse contexto, o atual ministro da Fazenda, que sinaliza largar o ministério nos próximos dias para concorrer nas eleições de outubro, tem deixado os estados ao “deus-dará”, enquanto financia os gigantescos deficits federais via maciças emissões de moeda.
Quanto aos presidenciáveis em geral, acho, sinceramente, perda de tempo sair por aí pregando reformas e mais reformas, de forma genérica, como costuma ocorrer nessas épocas. Temos de ser mais rápidos, precisos e concretos para ser mais úteis num país, como o nosso, quase em escombros.
Em meio a postulantes com baixa popularidade e/ou desqualificados para a dificílima missão que se apresenta, é difícil não considerar como mais apropriada para essa empreitada a figura do atual presidente da República, na companhia dos atuais titulares do Senado e da Câmara, quem sabe mantendo as mesmas posições que hoje ocupam e onde acumularam em pouco tempo uma notável experiência, demonstrando alta eficiência no trabalho de convencer os congressistas a aprovarem medidas indigestas politicamente. (Sem falar que as complexas mudanças requeridas poderiam ter início de forma imediata, bastando para isso suspender temporariamente a intervenção na segurança do Rio).
Fonte: “Correio Braziliense”, 20/03/2018