O futuro ministro da Economia está quieto. Depois das falas polêmicas e de manifestações que sugeriram conhecimento pouco profundo dos desafios fiscais, Paulo Guedes sabiamente se recolheu e reagiu bem aos alertas. Está quieto, mas não inerte. Seus movimentos recentes foram precisos, como na nomeação de Marcelo Guaranys, Rogério Marinho e Leonardo Rolim, que são profissionais com perfis complementares e fazem jus a um título de “time dos sonhos”. Combinou-se conhecimento da máquina pública, experiência política e domínio técnico do tema que é prioritário, a reforma da Previdência.
Seria importante Guedes conter as falas ambíguas e equivocadas de Bolsonaro e do núcleo duro que o cerca. A retórica alimenta a percepção de que o presidente eleito não tem suficiente clareza sobre a insustentabilidade da Previdência e suas regras injustas. Adquirir esse conhecimento será parte de sua missão de defender politicamente essa agenda. Caso contrário, será improvável o apoio do Congresso. Na política, as palavras têm peso.
Escolhas precisam ser feitas. Mais complicado ainda é fazê-lo em um ambiente de incertezas. O que é melhor: (1) propor uma reforma ambiciosa que viabilize o cumprimento da regra do teto e o ajuste fiscal dos Estados, mas correndo o risco de ter uma tramitação lenta e desgastante politicamente, ou (2) uma reforma diluída, como sinalizado pelo presidente eleito, com trâmite mais rápido, mas com risco fiscal elevado?
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É possível que se opte pelo meio do caminho, fatiando a reforma, separando as matérias constitucionais das infraconstitucionais, o que é positivo, e também avançando por etapas nos diferentes regimes de militares, policiais, servidores e setor privado, como proposto por Paulo Tafner e outros especialistas. Porém, o risco de o Congresso só aprovar uma ou outra fatia, e não o todo, resultando em uma reforma insuficiente, precisa ser considerado pelos estrategistas políticos.
A escolha de Bolsonaro será o primeiro teste de sua convicção sobre a necessidade da reforma. A capacidade de diálogo no Congresso, o teste principal. Não temos essas respostas. O ambiente de incertezas, portanto, ainda vai prevalecer por um tempo.
O que Bolsonaro precisa evitar são os erros de Macri e Macron, ambos presidentes com perfil reformista, eleitos em uma onda de renovação da política e contando com apoio popular. Agora ambos sofrem grande desgaste.
O argentino Mauricio Macri iniciou o mandato corrigindo importantes distorções na política econômica. No entanto, por contar com uma base estreita de apoio no Congresso – menos de 30% dos parlamentares quando iniciou seu mandato em 2016 –, foi forçado a negociar com governadores e a ceder. O gradualismo no ajuste fiscal parecia o único caminho possível naquele momento. Nas eleições parlamentares de 2017, Macri conseguiu aumentar seu apoio no Congresso e aprovar uma reforma da Previdência aguada. O resultado é o desarranjo do ambiente macroeconômico, com inflação acima de 40% e mais um acordo com o FMI.
O francês Emmanuel Macron, impulsionado pelas mídias sociais e com apoio no Congresso, conseguiu avançar com seu ímpeto reformista. Agora sofre o desgaste decorrente da percepção da sociedade de que ele protege os mais ricos. A elevação do preço de combustíveis, decorrente do imposto sobre carbono, penalizou uma classe média que se sente desprestigiada pelos políticos. Faltou diálogo e o devido cuidado com políticas que mexem diretamente no bolso dos eleitores. Protestos eclodiram. Macron recuou, mas a insatisfação persiste, enquanto outras reformas, como da Previdência, ficaram comprometidas.
Bolsonaro necessita de uma estratégia precisa para a reforma da Previdência. Não pode ser nem muito tímida nem muito desigual. E diálogo é essencial. Grupos que se sentem injustiçados podem reagir. O gradualismo e o tratamento desigual podem ser convenientes no curto prazo, mas cobram seu preço adiante.
Fonte: “Estadão”, 13/12/2018