O governo grego anterior ao atual mentiu descaradamente sobre suas contas e ainda tentou, com a ajuda de grandes bancos internacionais, montar operações que mascarassem a dívida pública. Quando a verdade apareceu, mostrando contas estouradas, já sob o atual governo socialista de George Papandreou, os investidores que detinham títulos da dívida grega se assustaram e passaram a exigir juros maiores para continuar financiando a dívida. Parece razoável, não é mesmo?
Não para Papandreou. Ele diz que especuladores internacionais desfecharam um ataque especulativo com o objetivo não apenas de derrubar a Grécia, mas o próprio euro, a moeda comum. Será?
Toda vez que um país chega perto de uma crise, e o mercado percebe, se inicia um processo de especulação. Haverá ou não o calote? Quem especula que sim trata de se desfazer dos títulos de uma dívida duvidosa – e o mercado se move.
Por exemplo: em setembro de 2002, quando o mundo achava que Lula venceria as eleições no Brasil e daria o calote, os títulos da dívida brasileira eram negociados a 35% do valor de face. Ou seja, um papel no qual o governo brasileiro prometia pagar US$ 100 era negociado a US$ 35. Investidores que especulavam o contrário, que não haveria calote, compraram e ganharam um caminhão de dinheiro. Os títulos brasileiros, hoje, são negociados acima do valor de face e pagam juros baixinhos.
No caso da Grécia de hoje, os títulos não caíram tanto nem os juros subiram muito, justamente porque estão em euros. O mercado acha que a União Europeia e o Banco Central Europeu serão como que obrigados a impedir o calote.
Mas o governo continua pagando mais caro para se financiar e vai continuar assim até que prove estar efetivamente fazendo o ajuste das suas contas. Como todo mundo sabe, esse ajuste é politicamente difícil.
Exige, por exemplo, em qualquer cenário, a contenção dos salários do funcionalismo. Exige também regras mais duras para a aposentadoria. Requer ainda cortes de gastos governamentais e aumento de impostos.
Isso tudo é para satisfazer a sanha dos credores/especuladores? Claro que não. Para melhorar a vida dos gregos. Para, por exemplo, facilitar a vida dos gregos que estão nascendo hoje e que serão obrigados a pagar, com impostos, as aposentadorias da atual geração.
Deviam olhar para o Brasil. Pressionado pelas crises de 1997/1998, o governo FHC iniciou um longo e custoso processo de ajuste de contas, cujas bases foram mantidas por Lula. Os frutos hoje estão aí. Mas o Brasil também devia olhar para a Grécia, para se lembrar que um bom momento não dá licença para gastar.
Público, gratuito e ruim. A coluna da semana passada, com esse título, provocou dois tipos de reação de leitores e leitoras. De um lado, muita gente reclamando do preço dos pedágios, especialmente nas estradas paulistas. De outro, a bronca de pessoas que moram e/ou trabalham na região da BR-381, trecho Belo Horizonte-Governador Valadares, estrada federal que estava no programa de concessões e que foi retirada por razões políticas. Essas pessoas esperavam que a concessão finalmente trouxesse investimentos para a rodovia. Mas, em ano eleitoral, o presidente Lula não quer privatizar, muito menos uma rodovia em que o pedágio pode ser caro.
Curioso como os dois lados da história se combinam: o governo desistir da concessão porque o pedágio numa BR-381 privatizada ficaria muito caro, já que a estrada exige investimentos pesados.
É isso mesmo. Se o governo, quando concede uma rodovia (ou ferrovia, porto, aeroporto) e exige melhorias substanciais, o pedágio fica mais caro. Mais ainda: se cobra pela concessão, para fazer caixa, a tarifa sobe mais um pouco.
Por isso estradas paulistas saíram caras. Discutimos esse modelo neste espaço na semana passada e em outras datas (os artigos podem ser encontrados no arquivo aqui do Estadão ou em www.sardenberg.com .br, item Política Econômica).
O importante a ressaltar hoje é que, frequentemente, a opção é estrada boa/pedagiada ou pública/gratuita/ruim. Que é justamente o caso da BR-381, como apontam leitores.
De Paulo Braga: “Esse trecho da BR-381 é conhecido como estrada da morte. E o governo acha que não precisa privatizar?”
De Martinho Rebelo Horta Filho: “Tenho certeza de que todo o Vale do Aço aplaude seu artigo. Moro em Ipatinga há 40 anos e sempre, em época de eleição, somos agredidos pelos políticos com falsas promessas. Não nos causa surpresa a notícia de que não haverá duplicação. É sempre assim, na hora da efetivação há uma desculpa inescrupulosa. Mensalmente, todo dia 13, a população das cidades servidas pela BR-381 faz uma paralisação da mesma, como protesto. Diariamente, temos acidentes com mortos ou feridos. Mas esse fato não altera a indisposição de nossas “autoridades” em solucionar esse grave problema. O presidente só vem à região de avião. Nós o desafiamos a vir de carro, sem os privilégios de batedores abrindo caminho, para que sinta o horror que é a BR-381. Infelizmente, muitas mortes ainda vão ocorrer. Espero que não aconteça conosco.”
Fonte: Jornal “O Estado de S. Paulo” – 15/03/2010
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