É sabido que a economia brasileira encolherá em 2015, se é que já não encolheu um tanto no ano passado.
Também não é segredo que a inflação persistirá alta e deverá superar a registrada em 2014, ultrapassando também o limite superior permitido pela sistemática de metas para a inflação.
Já o mercado de trabalho provavelmente registrará piora visível, liquidando com o último argumento em favor da política econômica prevalecente durante o primeiro mandato da presidente.
Trata-se, enfim, de uma combinação nada invejável. Não chega a ser surpreendente, pois, que ninguém esteja disposto a assumir o fracasso retumbante da “nova matriz macroeconômica”. A vitória, já se disse, tem muitos pais; a derrota, porém, é órfã.
Não é outro o motivo para que economistas que apoiaram abertamente as políticas adotadas nos últimos anos venham a público agora afirmar terem feito “inúmeras críticas” a elas.
[su_quote]Jogar a culpa do mau desempenho da economia no suposto “austericídio” revela completo desconhecimento dos dados[/su_quote]
Contudo, no começo de 2014, quando meus 18 leitores já viam as inconsistências aqui apontadas, membros da mesma tropa não tiveram o menor problema em afirmar que acreditavam “em um crescimento do PIB em torno de 4% para 2014 (…), [pois] o investimento está acelerando neste ano, recuperando o ano passado”. E projetavam uma taxa de inflação “entre 4% e 5%”.
Como se pode ver, eram previsões que refletiam uma visão profundamente crítica da política econômica então vigente. Só que não…Isto dito, eu seria injusto se não mencionasse as críticas que de fato foram feitas. A principal, de longe, é a acusação de “austericídio” fiscal, mesmo em face da maior expansão orçamentária em, pelo menos, 18 anos.
Como já notado neste espaço, o governo Dilma registrou simplesmente o maior avanço do gasto federal no Brasil desde que esses dados passaram a ser compilados (mais de R$ 200 bilhões a preços de hoje, ou 2,7% do PIB). Nesse mesmo período o superávit primário veio em queda, registrando valores menores a cada ano desde 2011, culminando com o registro de um deficit primário em 2014, mesmo pelos números oficiais, que, como se sabe, têm sistematicamente puxado a brasa para a sardinha do Tesouro. Apenas um habitante da Dimensão Z, alheio a tudo o que acontece neste quadrante da galáxia, poderia sugerir que o Brasil passou por qualquer processo que se assemelhasse a um aperto fiscal. Ao contrário do que afirmavam os “keynesianos de quermesse”, foi a falta, não o excesso de rigor fiscal, que jogou nossa dívida pública a 63,4% do PIB em 2014, exatos dez pontos percentuais do PIB a mais do que o registrado em 2010.
Nesse contexto, jogar a culpa do mau desempenho da economia no suposto “austericídio” revela completo desconhecimento dos dados, ou diagnóstico preconcebido.Trata-se de mais uma instância de desonestidade intelectual: ou porque a conclusão é mantida apesar dos fatos discordantes ou, ainda pior, porque se arrogam o direito de chegar a conclusões sem se preocupar em saber se Sua Excelência, o dado, se mostra minimamente coerente com o argumento. A verdade é que esses economistas aplaudiram de pé a “nova matriz macroeconômica”, no máximo opondo-se a um aperto fiscal que jamais existiu. Foram signatários de documentos que pediam a manutenção da política adotada no primeiro governo da presidente, apesar de sinais inequívocos de deterioração do crescimento econômico, da inflação e das contas externas. Não se opuseram à maciça intervenção governamental no domínio econômico, que resultou em forte queda do ritmo de expansão da produtividade e em desarticulação de setores importantes da economia, como o energético e o sucroalcooleiro. Os custos dessas políticas estão expressos na lamentável combinação de crescimento e inflação de 2015.
A honestidade intelectual requereria profunda autocrítica acerca dessas consequências, mas é melhor tocar a vida do que esperar por um milagre nessa área.
Fonte: Folha de S. Paulo, 25/2/2015
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