SÃO PAULO – Os exchange traded funds (ETFs) estão ganhando popularidade no mercado brasileiro, após uma onda que já dura décadas nos Estados Unidos. Também conhecidos como fundos de índice, os ETFs são fundos que replicam índices que vão do conhecido Ibovespa até um de mercados asiáticos emergentes e outro da criptomoeda Bitcoin.
Os ETFs já movimentaram R$ 153 bilhões na Bolsa de Valores brasileira em 2021. Mas gestoras como a Investo acreditam que essa cifra pode ser bem maior.
A Investo anunciou nesta segunda-feira (5) a captação de um aporte de R$ 15 milhões para começar a oferecer seus próprios ETFs. A gestora especializada e independente está primeiro de olho nos mercados internacionais – como as empresas americanas de tecnologia. O InfoMoney conversou com Cauê Mançanares, cofundador da Investo, sobre o potencial dos fundos de índice e os planos após o investimento na gestora.
O que são ETFs?
Um ETF nada mais é do que um fundo de investimentos – ou seja, representa uma espécie de “condomínio” de investidores que aplicam seus recursos em conjunto. No entanto, o exchange traded fund tem algumas características específicas que o distingue dos fundos tradicionais.
Os ETFs sempre são atrelados a um índice de referência, e seu gestor tem o trabalho passivo de usar os recursos dos investidores para comprar as mesmas ações incluídas na carteira do índice (como o Ibovespa). Assim, a taxa de administração de um ETF costuma ser menor do que a de um fundo de investimentos com gestão ativa.
Outra diferença é que as cotas dos ETFs são negociadas no pregão da Bolsa de Valores como se fossem ações. Seu desempenho oscila conforme a performance dos papéis contemplados pela sua carteira e responde à oferta e demanda pelas cotas no mercado.
É preciso pagar uma taxa de corretagem para a corretora que intermediar a operação e, além disso, algumas taxas de negociação à B3 (conhecidas como emolumentos). Os ETFs estão sujeitos ainda à incidência de Imposto de Renda. A alíquota é a mesma aplicada sobre o mercado de ações em geral: 15% sobre os ganhos, com exceção do ETF de fundos imobiliários, no qual a alíquota é de 20%.
ETFs dos Estados Unidos para o Brasil
A Investo foi criada no começo de 2020 por Cauê Mançanares, Gabriel Lansac e Silvio Junqueira. Lansac e Junqueira trabalharam em gestoras como Rio Bravo. Já Mançanares foi supervisor de instituições não bancárias no Banco Central. “Vimos a chegada e o crescimento de instituições que depois seriam chamadas de fintechs. Elas focavam não apenas em novas tecnologias, mas em novos modelos de negócios que promoviam mais acesso a produtos e serviços financeiros”, diz o cofundador.
Durante um MBA na Universidade de Harvard, Mançanares teve contato com o mercado americano de investimentos – e com a onda dos ETFs. “O ETF ajudou a democratizar o acesso a aplicações financeiras nos Estados Unidos. O investidor individual consegue acessar estratégias de investimento de forma fácil e transparente. É um produto listado em Bolsa de Valores, adquirido em bancos e corretoras que os clientes conhecem e seguem índices consagrados. Nos Estados Unidos, são mais de 2 mil ETFs. Mas o Brasil tem apenas cerca de 40 ETFs listados.”
Existem diversos tipos de ETFs de renda fixa e de renda variável atualmente, inclusive no Brasil. Os mais conhecidos por aqui são os que refletem o Ibovespa, índice que reúne as ações mais negociadas na Bolsa de Valores brasileira, a B3. Mas os três empreendedores fundaram a Investo com o objetivo de trazer o acesso a mercados internacionais.
“As empresas internacionais são parte da vida do brasileiro, e queremos que elas também façam parte dos seus investimentos. Ele pode participar desse crescimento global e diversificar seus ativos”, diz Mançanares. Para facilitar o acesso aos ETFs, eles serão locais: negociados por meio de bancos e corretoras brasileiras e listados na B3. “O investidor a fricção de mandar ou resgatar dinheiro entre países e nem incidência do IOF.”
ETFs negociados por aqui não têm distribuição de dividendos, como acontece com ETFs americanos. Mançanares afirma que os dividendos são incorporados e reinvestidos – o cotista verá um aumento no valor da sua cota a cada companhia que distribuir dividendos e estiver presente no índice acompanhado.
Mançanares também ressalta que os fundos de índice serão negociados em diversos bancos e corretoras nacionais – mesmo que eles tenham seus próprios ETFs.
“Existe uma lacuna grande para cobrir até o brasileiro ter o mesmo acesso que o americano a fundos de índice. Estamos junto com essas empresas para desenvolver esse mercado e dar mais liquidez aos ativos. Nós incentivamos alguns índices, e eles outros. Somos uma gestora independente que busca estar plugada em todas as casas de investimento, aproveitando a parceria para acessar a base de clientes deles.”
A empresa foi incorporada justo na semana dos primeiros lockdowns por conta da Covid-19. Os fundadores decidiram então passar o resto do ano focados em formar parcerias e obter aprovações regulatórias. O capital externo viria apenas na fase de lançar produtos e escalar a empresa.
O Credit Suisse atua como formador de mercado dos ETFs, garantindo liquidez. Já o BNP Paribas é o administrador e custodiante, garantindo segurança. A Investo tem aprovação da Anbima e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para atuar como gestora. “Não dá para ser uma startup de garagem no segmento financeiro”, resume Mançanares.
A Investo lista apenas um ETF em seu site oficial por enquanto. O USTK11 replica o ETF VGT (Vanguard Information Technology), listado na NYSE. O VGT tem US$ 40 bilhões sob gestão investindo em mais de 300 empresas americanas de tecnologia. Alguns exemplos são Apple, Microsoft, Nvidia, PayPal e Zoom.
Assim como o VGT, o USTK11 seguirá o índice Morgan Stanley Capital International – MSCI US Investable Market Information Technology 25/50 Index. As principais composições do fundo de índice brasileiro serão hardware e armazenamento (22%), software (20%), chips semicondutores (17%), processamento de dados (15%) e aplicações digitais (14%).
O USTK11 acompanhará a variação do dólar americano. A taxa de administração prevista total é de 0,74% ao ano, o que inclui a taxa de administração de 0,10% ao ano cobrada pelo ETF VGT. A data de início do fundo de índice ainda depende de aprovação na CVM e na B3.
Aporte semente e planos de expansão
A Investo anunciou nesta segunda-feira um investimento anjo de R$ 15 milhões. O aporte veio de pessoas físicas como Rene Kern, ex-conselheiro da BM&FBovespa (hoje B3) e diretor no fundo de private equity General Atlantic.
“Ele participou do board de diversas empresas e têm insights tanto sobre estratégias de crescimento quanto sobre o desenvolvimento do mercado de capitais nos Estados Unidos e no Brasil. Compartilhamos da visão de democratizar o acesso dos brasileiros a investimentos globais”, diz Mançanares.
O dinheiro será usado para melhorar a infraestrutura da Investo. “O mercado financeiro demanda robustez de processos, de infraestrutura e segurança. Temos de conectar as pontas de diversas empresas com regulações rígidas. Por isso, recebemos um investimento semente maior do que se costuma ver no mercado de startups”, diz o cofundador. É comum que um aporte seed no país fique em torno de US$ 1 milhão (R$ 5 milhões).
Outro objetivo com o aporte é criar conteúdos de educação financeira, inclusive em associação com os bancos e corretoras que disponibilizarem os ETFs da Investo.
O USTK11 deve ser o primeiro passo. A gestora pretende fechar este ano com doze fundos de índice listados na B3, e com mais de 200 mil investidores.
“Queremos focar na exposição internacional nesses primeiros ETFs. O brasileiro ainda precisa diversificar globalmente. Estamos buscando setores e temas com os quais os brasileiros já tenham familiaridade. Por exemplo, empresas de que eles já consomem e gostaria de investir. Mas estamos olhando também para ETFs internacionais de renda fixa. Isso porque o portfólio deve ser diversificado não apenas entre ativos locais e globais, mas também entre renda variável e renda fixa”, conclui Mançanares.
Fonte: “InfoMoney”, 05/07/2021
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