Por Fábio Medina Osório
Se olharmos as origens mais remotas do conceito de cidadania, teremos de relembrar o desenvolvimento das cidades-estado gregas, as célebres poleis, entre os séculos VIII e VII a.C. São mais de 2.500 anos de História de um conceito que se transformou radicalmente, e nessa trajetória vem adquirindo contornos dinâmicos e cada vez mais inclusivos e complexos.
Um conceito moderno, desde o Iluminismo, com a revolução intelectual do século 18, foi aproximando a cidadania dos ideários de igualdade e liberdade, permitindo aos cidadãos participar da construção do coletivo onde se encontram inseridos. Os direitos passam a ter uma maior proteção pelo Estado, com a perspectiva de que a qualidade de cidadão conferia ao seu titular a prerrogativa de usufruir da proteção oficial em determinada dimensão.
Na civilização contemporânea, não há dúvida de que todo cidadão deve atuar em prol da sociedade, na defesa dos direitos inerentes à sua condição local e também à ampliação do espectro da cidadania no âmbito internacional. O título de cidadão, além de incluir direitos, também impõe deveres e obrigações. E ninguém ignora que nos dias de hoje a proteção estatal se estende para muito além da rede de cidadania em sentido estrito, dentro do que se pode designar como um estatuto de cidadania universal.
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É preciso entender que não há direitos naturais num contexto de cidadania, porque se trata de conquistas alcançadas a duras penas e no decorrer dos séculos, na medida em que os direitos são fenômenos sociais, produtos históricos, inclusive mutáveis no tempo e no espaço, parcialmente ligados ao próprio conceito de cidadania.
É importante notar que, ainda hoje, muitos direitos tidos como indiscutíveis para alguns, em realidade, continuam a ser plenamente controversos para outros, sendo a própria corrupção um valor que adquire maior ou menor peso, conforme a concepção ideológica de cada um.
Note-se que no Congresso a discussão do caixa 2 eleitoral foi postergada para uma segunda etapa do pacote anticrime, dentro da ótica do Supremo de que a ocorrência de irregularidade na campanha política não significa automaticamente a prática de crime conexo de corrupção.
Da mesma forma, enquanto se defende que o combate à corrupção deve ser pressuposto de qualquer agenda econômica sustentável, há também quem proponha que se aja com cautela para não atrapalhar o desenvolvimento econômico.
Tudo isso envolve direitos civis e políticos, intimamente associados ao alcance da cidadania. Quer dizer, o exercício da cidadania depende muito das opções políticas formuladas livremente por qualquer nação, num regime democrático. O princípio majoritário ainda é importante, e sempre será, para validar a vontade do povo.
No Brasil, a opção política recente foi por uma cidadania compromissada com a inclusão cada vez maior do combate à corrupção, para agilizar a erradicação da pobreza e da desigualdade, dentro de pautas de liberalismo econômico.
Atualmente, a concepção de cidadania, para além de alargar a participação política das pessoas, tende a restringir a participação de corruptos na vida pública. Essa é uma tendência global, não apenas no Brasil.
De certo modo, percebe-se que a corrupção é um câncer que destrói as bases mais elementares de uma civilização, enfraquecendo os laços de confiança que unem os cidadãos e os detentores de poderes decisórios da esfera pública e privada.
Como dizia Eduardo García de Enterría, a corrupção acaba por corroer os próprios regimes democráticos, na medida em que mina a confiança dos cidadãos nas instituições. Os eleitos não ganham um cheque em branco para governar, mas sim um mandato nos termos das leis e da Constituição.
Fonte: “O Globo”