Pelo menos oito familiares do traficante Fernandinho Beira-Mar foram nomeados para cargos na Câmara de Vereadores de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, entre 2012 e 2017, com salários que variam de R$ 2.500 a R$ 6.800. Desses, três permaneciam exercendo funções na atual legislatura. Uma nona pessoa ligada ao criminoso também trabalhou na Casa no período. Segundo a Polícia Federal, que desencadeou nesta quarta-feira a Operação Epístolas, responsável por desbaratar uma quadrilha comandada pelo bandido de dentro da Penitenciária Federal de Porto Velho, em Rondônia, todos eram funcionários fantasmas e não davam expediente na Câmara.
Os três nomeados que seguiam ocupando cargos na Casa são Edite Alcântara de Moraes, sogra de Beira-Mar, que trabalhava como assessora do vereador Chiquinho Caipira (PMDB), e Débora Cristina da Costa Teixeira, irmã do traficante, que ocupa posto similar no mesmo gabinete. Ambas foram nomeadas no Diário Oficial publicado em 30 de março, a contar a partir do dia 1º daquele mês, e recebiam salário de R$ 6.800 mensais — já considerando uma gratificação de 70% sobre os vencimentos. Além delas, Thuany Moraes da Costa, filha do criminoso, era assistente de presidente de comissão, indicada pela vereadora Leide (PRB), desde o dia 1º de janeiro deste ano, com salário de R$ 4 mil por mês.
O presidente da Câmara, Sandro Lélis (PSL), afirmou ao “Extra”, nesta quinta-feira, que já assinou a exoneração dos três funcionários. A publicação da medida no Diário Oficial do município deve ocorrer até o fim da semana. É o nome de Lélis que aparece chancelando todas as nomeações — segundo o vereador, apenas por ele atuar como um “ordenador de despesas”.
— Todas essas nomeações são de responsabilidade dos vereadores que as indicaram. A frequência e a escolha dos cargos é da competência de cada vereador que os nomeou — frisou o presidente da Casa, acrescentando que criará uma norma que obrigue que toda nomeação passe a exigir apresentação de ficha criminal, com uma certidão de nada consta no que diz respeito a antecedentes.
Já o vereador Chiquinho Caipira, eleito para o sexto mandato e atualmente secretário municipal de Pesca de Caxias, negou ter conhecimento sobre o parentesco dos nomeados em seu gabinete com Beira-Mar, bem como o fato de serem funcionários fantasmas. Além dos dois que acabaram exonerados, outras três pessoas ligadas ao traficante já trabalharam diretamente com o parlamentar (veja mais na lista abaixo).
— Conheço o ex-marido da Alessandra (irmã de Beira-Mar), que já foi candidato duas vezes e já ajudou muitos candidatos de Caxias, inclusive eu. Eu tinha o compromisso de nomear duas pessoas indicadas por ele — alegou Chiquinho, afirmando que as nomeações em mandatos anteriores se deram por indicação da mesma pessoa: — São nomeações legais, mas imorais.
A vereadora Leide , que nomeou uma filha de Beira-Mar e a companheira de um sobrinho do traficante, também alegou desconhecer que os funcionários eram ligados ao bandido.
— Tenho um trabalho no Parque das Missões, aqui em Caxias. Um amigo suplente me indicou a Nicole (companheira do sobrinho de Beira-Mar). Ela precisou sair em janeiro. Precisava de uma pessoa com prática em eventos. E esse mesmo amigo indicou a Thuany . Não confrontamos nomes aqui. Analisamos o currículo e ela foi nomeada no lugar da Nicole. Não sabia que as duas eram parentes de Beira-Mar—disse a vereadora, que negou que as duas fossem funcionárias fantasmas.
Também passaram pela Câmara de Vereadores de Caxias, nos últimos anos:
– Alessandra da Costa, irmã de Beira-Mar: assistente de comissão no gabinete da vereadora Gaete, que não se reelegeu; salário de R$ 4.800; exonerada em 1º de janeiro de 2017
– Elisete da Silva Lira, ex-mulher de Beira-Mar: assessora de plenário no gabinete de Chiquinho Caipira; exonerada em 30 de janeiro de 2016; salário de R$ 2.500
– Ryan Guilherme Lira da Costa, filho de Beira-Mar: assessor de plenário no gabinete de Chiquinho Caipira; exonerado em 31 de dezembro de 2015; salário de R$ 2.500
– Jean Júnior da Costa Oliveira, sobrinho de Beira-Mar: assistente de presidente de comissão no gabinete do vereador Tato, atualmente sem mandato; exonerado em 1º de janeiro de 2013; salário de R$ 4 mil
– Nicole Cecília da Silva Monteiro, companheira de Jean Júnior, sobrinho de Beira-Mar: assistente de presidente de comissão no gabinete da vereadora Leide; exonerada em 1º de janeiro de 2017; salário de R$ 4 mil
– Carlos Wilmar Portela, alvo da investigação da PF por ligação com Beira-Mar: assistente de presidente de comissão no gabinete do vereador Chiquinho Caipira; exonerado em 30 de novembro de 2016; salário de R$ 4.800.
O “Extra” não conseguiu falar com o vereador Tato, atualmente sem mandato.
Bilhete picotado em marmita
A investigação sobre a quadrilha de Beira-Mar começou há cerca de um ano, após um bilhete picotado ser encontrado por agentes federais numa marmita, na Penitenciária de Porto Velho. A anotação foi reconstituída e um exame grafotécnico atestou que a letra era do traficante.
Foram apreendidos, ao todo, cerca de 50 bilhetes — alguns escritos por Beira-mar e outros dirigidos a ele. Graças às anotações, a polícia identificou ordens dos traficantes a cúmplices que estavam em liberdade. O esquema renderia ao traficante cerca de R$ 1 milhão mensais.
A PF esclareceu que as mensagens chegavam para Beira-Mar e eram enviadas por ele “por um esquema altamente elaborado e sofisticado”. E afirmou, ainda, que “não há sequer indícios, ao longo de toda a investigação, de participação ou facilitação por parte dos Agentes Federais de Execução Penal lotados no Presídio Federal de Porto Velho/RO ou demais servidores públicos envolvidos”.
Fonte: “Extra”
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