Existem no Brasil algumas verdades que estão acima de qualquer discussão. Não há nenhuma dúvida, por exemplo, de que certas coisas só acontecem com o Botafogo. Também é perfeitamente sabido, até nos berçários, que o Brasil só vai resolver de fato os seus problemas quando a polícia achar os ossos de Dana de Teffé, como vem demonstrando há anos o cronista Carlos Heitor Cony — sem ser ouvido, infelizmente, por nossas autoridades. Ninguém discute que ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil. Essa lista é enriquecida, de tempos em tempos, por novas evidências — mais adequadas a uma potência emergente, que se orgulha de ser um Bric, ter um PAC e dispor de um crachá de entrada no G20. A última delas começou a aparecer quase dez anos atrás, com o primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e garante que estamos desfrutando os benefícios da mais brilhante política externa que este país já teve desde o barão do Rio Branco. Trata-se, aqui, de uma fé ao avesso. A política externa brasileira vai de fracasso em fracasso, como no samba de Antônio Maria. Mas a cada derrota sempre aparece algum comentário elogiando a sabedoria dos nossos chanceleres, o profissionalismo do Itamaraty (“é gente do ramo”) e coisas assim — e o problema, aí, é que o governo acredita nos elogios. Nossa diplomacia, em consequência disso, tornou-se uma notável sucessão de atos que vão contra os interesses brasileiros para satisfazer a teorias. Por causa delas, o Brasil é hoje, possivelmente, a nação do mundo que mais apanha dos países que escolheu como seus melhores amigos.
A mais recente vitória da política externa brasileira é sua resposta ao impeachment do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, um dos heróis latino-americanos do ex-presidente Lula. Esse Lugo, desde que foi eleito, em 2008, só bateu no Brasil. Extorquiu, em desrespeito aos contratos vigentes, um aumento nos dividendos que o Paraguai recebe pela sua sociedade na usina hidrelétrica de Itaipu; Lula aceitou na hora, por achar “justo”, e passou a conta para o contribuinte brasileiro. Manteve o Paraguai como o grande polo da recepção de carros brasileiros roubados e do contrabando maciço que custa bilhões de reais, todo ano, à Receita Federal do Brasil. Ultimamente vinha hostilizando os brasileiros que compraram terras em áreas do território paraguaio onde jamais se havia plantado um único pé de mandioca — e acabaram transformando o Paraguai, com o seu suor e sem ajuda de ninguém, no quarto maior exportador de soja do mundo.
O impeachment de Lugo, por todas essas razões, deveria ser um alívio, até porque foi feito dentro das normas estabelecidas na Constituição do Paraguai. Mas o Itamaraty não gostou; como o homem foi posto na rua num processo que durou apenas trinta horas, decidiu que havia ocorrido um “golpe”, embora não tivesse informado o número mínimo de horas — 100? 200? 300? — que considera aceitável para um país estrangeiro depor o seu presidente. Não conseguiu nada, é claro; é o que acontece quando um país quer interferir em questões internas de outro sem ter nenhum meio concreto para fazer isso. Mas junto com a Argentina, que toma medidas comerciais cada vez mais agressivas contra os produtos brasileiros, vingou-se excluindo o Paraguai das reuniões do Mercosul. E daí? Nenhum paraguaio vai perder um minuto de siesta por causa disso. Para completar o castigo, enfiou-se a Venezuela no Mercosul. A última contribuição venezuelana ao Brasil foi sua sociedade meio a meio com a Petrobras, fechada por Lula em 2005, para a construção de uma refinaria de petróleo em Pernambuco. Foi um conto do vigário, que deixou os brasileiros no seu costumeiro papel de otários — são eles, como sempre, que vão pagar o prejuízo. Até hoje, sete anos depois, a Venezuela ainda não colocou um único real no projeto.
O Brasil não está incluindo mais um país no Mercosul: está incluindo o coronel Hugo Chávez. Seu governo, em matéria de economia, consegue ser ainda mais irresponsável que o da Argentina, em cujos números oficiais nem o ministro Guido Mantega acredita. Amarra-se, assim, às duas economias mais doentes da América do Sul. Conta, enfim, com a Bolívia do presidente cocalero Evo Morales, outro irmão político de Lula. Ele já expropriou ativos da Petrobras na Bolívia, legalizou a circulação de veículos roubados no Brasil e tem seu governo infiltrado de alto a baixo por traficantes de cocaína, que despejam aqui, cada vez mais, a sua produção.
É um sucesso acima de qualquer discussão.
Fonte: revista Veja
perdoe-me, mas o impeachment de lugo não respeitou a carta magna do paraguai, além de ter sido uma das atitudes mais oportunistas de dilma e Kirchner para trazer o ditador chávez para dentro do mercosul. cordialmente. alexandre coutinho pagliarini
Faltar democracia também falta muito no Brasil ne? Uma verdadeira farsa a idéia de que existe mais democracia em países como Colômbia e o Paraguai Pós golpe hoje do que na Venezuela, Equador e Bolívia. Muito pelo contrário
Mesmo antes de Lugo, o Paraguai é um país marcado por golpes e a Venezuela é uma democracia desde os anos 50!!A fragilidade democrática e instituicional do Paraguai facilitou a quebra da democracia. Já estive duas vezes em assuncion e falo com propriedade, trata-se de um país complexo, de diferentes maneiras colonizado pelo Brasil, pela usina de itaipu, pelo papel que cumpre ciudad del leste como taxfree de muamba para SP, pela posse de mais da metade das terras, enfim tem conflitos no campo, uma oligarquia no senso clássico e uma grande apatia em Assuncion.
Acompanhem com seriedadeantes de lançar bravatas anti-bolivarianas, só porque hoje se faz política de estado, sul-sul, Brasil tam voz para tudoo e não a simples submissão a Washington, Alca etc.