Ao superproteger o trabalhador, o Estado o tornou incapaz de lutar por seus direitos e deveres
Após décadas de discussões, finalmente foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente da República uma reforma trabalhista que muda a essência da CLT. Como esta foi uma das reformas mais discutidas no País durante décadas, a crítica de que ela foi aprovada de forma açodada é, no mínimo, desinformação e, no máximo, desonestidade intelectual.
Alguns jovens acadêmicos estão certamente mal informados. Mas, como bons acadêmicos, deveriam se informar antes de se manifestar. Porém, as maiores críticas vêm de corporações, como a da Justiça do Trabalho e dos sindicatos, que sobrevivem do imposto sindical, por serem incapazes de convencer os trabalhadores de sua importância, que estão perdendo seus privilégios e o poder político.
A legislação trabalhista brasileira foi imposta à sociedade pela ditadura do Estado Novo, uma das mais violentas de nossa história. Como foi imposta por um regime fascista, tem estrutura fascista. Um dos objetivos da CLT é proteger o trabalhador da “sanha” das empresas por lucros e evitar o conflito entre trabalhadores e empresas. Sempre que tem um conflito, a solução é dada pela Justiça do Trabalho. E Justiça não se contesta, se obedece. Daí o enorme poder do Estado e a fraqueza dos sindicatos de trabalhadores.
Ao superproteger o trabalhador, o Estado o tornou incapaz de lutar por seus direitos e deveres. Não apenas na relação de trabalho, mas na vida em sociedade. O trabalhador não pode decidir quanto vai poupar para o futuro, isto está determinado pelo FGTS e pela Previdência Social. Não pode decidir como quer dividir suas férias, quantas horas por dia e quantos dias por semana quer trabalhar. Se prefere ter meia hora para almoçar e sair mais cedo para estar com seus familiares. Se prefere ter uma redução de salário, em vez de ficar desempregado. Se quer ou não contribuir para um sindicato ou se prefere ter um contrato individual de trabalho, e assim por diante.
Com a reforma, estas decisões e muitas outras serão negociadas entre o trabalhador e seu empregador. O empregador vai buscar o contrato de trabalho que dará a maior produtividade e o maior lucro possível. O que irá aumentar o potencial de crescimento e de geração de empregos da economia. E o trabalhador irá buscar o emprego que lhe dará o maior salário e bem-estar. Em lugar de esperar pela proteção do Estado, os trabalhadores terão de lutar por suas conquistas.
Se isso significa se filiar a um sindicato, ou investir em treinamento e qualificação, ou investir em educação, ou buscar ofertas de emprego mais compatíveis com suas disponibilidades, será uma escolha do trabalhador. Em momentos de desemprego alto os trabalhadores terão menos poder de barganha e vice-versa. Mas essa é uma característica de qualquer mercado e cabe aos trabalhadores se prepararem para aumentar seu poder de barganha em qualquer situação.
Será uma revolução nos incentivos. Teremos trabalhadores e cidadãos mais responsáveis, mais qualificados, mais produtivos, com mais incentivos a investir na relação de trabalho, mais empreendedores e, portanto, mais capazes de lutar por seus interesses. Teremos menos conflito, mais produtividade, mais crescimento e menos pobreza.
Já em 1994, o então presidente eleito Fernando Henrique Cardoso, em seu discurso de despedida do Senado, apontava para a necessidade de acabar com a chamada Era Vargas, “ao seu modo de desenvolvimento autárquico e ao seu Estado intervencionista”. Infelizmente, o ex-presidente pouco conseguiu fazer neste sentido.
A aprovação da reforma não é uma demonstração de força de um governo terminal, como sugerem alguns. É o início do fim da Era Vargas. Apesar da enorme crise política, com a aprovação da reforma trabalhista, o presidente Michel Temer começou a cumprir a promessa feita pelo ex-presidente FHC. E por um governo democraticamente eleito. Falta aprovar a TLP e a Previdência. Vamos em frente!
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 18/07/2017
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