As doações virtuais para campanhas eleitorais podem aumentar a participação política dos brasileiros. Com início na terça-feira, 15, essa modalidade entra em vigor pela primeira vez nas eleições de 2018 e é uma oportunidade de fazer os eleitores se engajarem com a política também de maneira econômica, afirmam especialistas ouvidos pelo Estado. Outros, no entanto, afirmam faltar clareza nas regras do novo instrumento de arrecadação de recursos.
Os candidatos já podem arrecadar recursos, mas não gastar, já que o registro da candidatura precisa ser validado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A data limite para usar a verba conquistada é 15 de agosto.
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Para Cristiano Vilela, advogado especialista em direito eleitoral, o novo formato é bem-vindo porque dá mais poder aos cidadãos e permite que os partidos arrecadem mais. “É uma forma de democratizar e trazer o eleitor para participar do jogo político não só a partir do voto”, afirma Vilela, que faz parte da Comissão de Estudos de Direito Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP). “Com doação em dinheiro, ele passa a se engajar mais e o próprio candidato fica mais diligente com o eleitor”.
O especialista acredita ser difícil um candidato pequeno conseguir arrecadar uma fortuna a ponto de fazer frente a um mais estruturado, mas diz que as vaquinhas online são um bom começo. Para ele, a quantia alcançada pelos candidatos, mesmo se for baixa, não deve ser vista como impeditivo para que o modelo continue vingando em outros pleitos eleitorais.
“É uma semente que está sendo plantada e vai surtir efeito no futuro”, diz. “Esse mecanismo não pode ser avaliado pelo resultado exclusivo dessa eleição porque vai representar uma pequena parte do total arrecadado”, diz.
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Pelas regras atuais, o limite de despesas na campanha de 2018 para presidente é de R$ 70 milhões e, em caso de segundo turno, de mais R$ 35 milhões. Para a disputa dos governos estaduais, o limite varia entre R$ 2,8 milhões e R$ 21 milhões. A diferença depende do número de eleitores de cada Estado.
Para uma cadeira no Senado, o teto vai de R$ 2,5 milhões a R$ 5,6 milhões, também de acordo com o eleitorado local. Os deputados federais não podem gastar mais de R$ 2,5 milhões e os estaduais não podem ultrapassar R$ 1 milhão.
Na avaliação de Tony Chalita, especialista em direito constitucional e eleitoral, o mecanismo também faz com que os cidadãos se insiram mais no processo político. “Mas é difícil imaginar que, no momento que o Brasil vive, o cidadão queira contribuir com uma campanha política”, diz.
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David Fleischer, professor emérito de ciência política da Universidade de Brasília (UnB), também acredita que as vaquinhas podem aumentar o engajamento, mas é preciso analisar como o sistema vai funcionar, especialmente para deputados federais e estaduais, que dispõem de menos recursos para os pleitos.
“Quando você coloca R$ 1.000,00 numa campanha, você está se engajando. Mas, mais do que isso, seria decidir trabalhar como voluntário em favor de um candidato ou um partido, o que foi muito forte, por exemplo, na corrida presidencial de 1989, com Lula (derrotado por Fernando Collor)”.
Riscos e incertezas
Tony Chalita critica o fato de haver um limite diário de doações por CPF, de R$ 1064,10. “Na medida em que se colocam muitas travas, pode se tornar um sistema ineficiente”. Segundo ele, se a ação for para impedir ações indevidas, seria uma maneira de punir de maneira antecipada o agente político.
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Para ele, também é preciso haver maior esclarecimento das regras eleitorais de pré-campanha para reduzir a insegurança sobre o limite entre pedir votos e solicitar recursos. “Quando um candidato pede apoio financeiro, está naturalmente pedindo apoio a um projeto. Mesmo que esse pedido de votos seja implícito, o político pode cair na margem da ilegalidade”, afirma.
Para Cristiano Vilela, o modelo novo pode trazer riscos como o uso de CPF de ‘laranjas’ que emprestam seus documentos para o registro do dinheiro. No entanto, ele acredita que a Justiça Eleitoral está preparada para lidar com essas eventualidades. “A existência de casos isolados não faz com que um bom instrumento de arrecadação seja considerado ruim”, afirma.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”