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A aposta num atendimento mais preparado e na personalização de serviços tem motivado a criação de fintechs (startups financeiras) focadas na hipersegmentação de público – como mulheres, negros e LGBTI+. Por trás de negócios como Elas Bank, Pride Bank e D’Black Bank, estão empreendedores que perceberam oportunidade no modo que instituições financeiras lidam com alguns grupos da população – ainda que, em alguns casos (como mulheres e negros), eles sejam maioria no País.
Nas próximas semanas, será lançado o Elas Bank, plataforma digital de investimentos para mulheres idealizada por Hanna Schiuma, historiadora com especialização em finanças e economia, em parceria com o executivo de carreira Christian Zimmer. A aposta deles é um robô para guiar mulheres no caminho dos investimentos.
“Queremos salvar a dor de mulheres que foram mal atendidas pelo sistema tradicional. É uma cadeia: mulheres recebem salários menores, por isso têm baixo acesso a crédito e, consequentemente, menor patrimônio”, diz Hanna. Segundo a B3, Bolsa de Valores de São Paulo, em janeiro deste ano as mulheres representavam 23% do total de investidores, ainda que sejam 51,7% da população brasileira.
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A metodologia do Elas Bank é baseada em um conceito definido por Hanna como “fitness financeiro”: a mulher se cadastra na plataforma, escolhe um plano de acordo com as suas necessidades e as metas que quer alcançar, como em uma academia, e, a partir daí, é por conta do robô, que realiza as aplicações.
Do conservador ao arrojado, os planos – que não possuem valor de investimento mínimo – variam entre fit (para quem está começando e quer criar um fundo de emergência), intermediário (já começou a investir e quer comprar algum patrimônio) e avançado (de maior risco, para quem quer investir com maior rentabilidade). Segundo Hanna, a taxa de administração será menor do que 0,5%.
Com investimento inicial de US$ 500 mil (com ajuda de familiares e amigos) e uma expectativa de conseguir 7 mil clientes nos dois primeiros anos, o plano é acrescentar no futuro novos produtos à fintech, como conta corrente, cartões, empréstimos, seguros e também um marketplace para empreendedoras que usam a plataforma.
“Agora, queremos gerar engajamento, porque os dados que vamos coletar vão permitir que a gente construa ferramentas com mais detalhes. Uma executiva de 40 anos sem filhos é diferente de uma mulher recém-divorciada com dois filhos. Por isso, toda a plataforma se baseia em uma hipersegmentação de clientes”, explica Hanna, que reúne interessadas numa lista de espera antes do lançamento do Elas Bank.
Segmentação como fator competitivo
No universo das startups, a segmentação é vista como tendência global para se ter competitividade num meio em que a concorrência cresce a cada ano – hoje, são 510 fintechs no Brasil, com um crescimento de 6% no último ano, segundo a Associação Brasileira de Startups (Abstartups).
“Para exercer liderança, as empresas tendem a criar subcategorias. Como as fintechs, no geral, não concorrem de igual para igual com as instituições tradicionais, precisam atuar onde as instituições não têm foco”, explica Luis Ruivo, sócio da PwC Brasil, empresa de consultoria e auditoria.
Para Vinícius Machado, cofundador da Vortex.Ventures, grupo de empresas focado em inovação, segmentar é estratégia essencial para haver fidelidade. “Os bancos digitais conseguem ter apelo com nichos por entender que cada um deles tem problemas diferentes sobre a relação com dinheiro, serviços bancários e atendimento. O nível de empatia vai ser muito maior. Afinal, quem está do outro lado entende a minha dor.”
Ainda assim, a segmentação do público em geral não exclui outras parcelas da população. “Ser específico para um público e não impedir os outros de entrarem é bom. Mostra que, se fizer parte da estratégia, aquele negócio pode atender uma massa maior e mais diversa de clientes”, destaca Vinícius.
Lançado no fim do ano passado, o Pride Bank, banco digital focado na comunidade LGBTI+, nasceu com a ideia de ligar a prestação de serviços à geração de renda para causas sociais. Por enquanto, eles oferecem conta digital e cartão de crédito internacional pré-pago. A máquina de cartão está prevista para ser implantada no próximo mês.
“Além dos serviços, nós devolvemos os recursos para a comunidade em forma de apoio e cultura: 5% da receita bruta do banco é destinada ao Instituto Pride, que distribui para causas sociais e outros 5% são investidos em cultura e entretenimento LGBTI+”, explica o CEO Marcio Orlandi.
Um dos diferenciais do banco, segundo Orlandi, é a possibilidade de o cliente escolher o nome que vai registrado no cartão de crédito. “É possível exibir o nome social, o que poupa transexuais de serem constrangidos por terem um nome diferente na certidão de nascimento, e também respeitamos o nome artístico, como no caso das drag queens.”
Até o momento, para se tornar cliente da plataforma é preciso ser convidado por amigos, mas a previsão é que no próximo mês o banco atinja os 10 mil clientes e deixe de operar em modo beta.
Combate ao racismo estrutural
Também criado no fim do ano passado, o D’Black Bank nasceu como uma forma de combate ao racismo estrutural nas instituições financeiras tradicionais. “Ninguém aqui vai chamar a polícia porque acha estranho uma pessoa negra ter dinheiro. Não há recriminação pela cor, pela condição socioeconômica e oferecemos taxas mais justas – definidas de acordo com o cliente. Já conseguimos reduzir taxas em até 50%”, explica o sócio-fundador Alan Soares.
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A criação do banco digital ocorre em um cenário no qual os negros, maior parcela da população brasileira (54%, segundo o IBGE), ainda têm dificuldades em acessar crédito. De acordo com o Estudo do Empreendedorismo Negro no Brasil, realizado pela PretaHub, 32% dos empreendedores negros já tiveram crédito negado sem explicação.
Por enquanto, o banco digital oferece apenas máquina de cartão, apelidada de “pretinha”, para os seus cerca de 100 clientes empreendedores. A previsão é que, ainda no primeiro semestre, novos produtos como conta digital e marketplace integrem o cardápio da fintech. Até o fim do ano, a meta é conseguir implementar o serviço de empréstimos.
Na vanguarda do segmento, a Conta Black também mira o mesmo público. Criada em 2017 com o objetivo de desburocratizar o acesso da população desbancarizada – cerca de 45 milhões de pessoas segundo o Instituto Locomotiva -, a fintech oferece conta digital (para pessoas física e jurídica), linhas de investimento e crédito consignado a cerca de 3 mil clientes.
Para 2020, os sócios Sergio All e Fernanda Ribeiro planejam lançar uma carteira de criptoativos, máquina de cartão, seguros e recarga de celular.
Fonte: “Estadão”