Que o Estado brasileiro gasta muito e gasta mal, todos estamos cansados de saber. O cidadão brasileiro, porém, está cada vez mais atento aos desmandos da administração pública e consequentemente à noção de que governos não produzem riqueza — papel esse exercido unicamente pela força do trabalho e do intelecto de cada indivíduo. É neste cenário que os centros de pensamento, organizações independentes e o terceiro setor têm contribuído fortemente para mobilizar a opinião pública em torno do aprimoramento de mecanismos que deem ao cidadão ferramentas em prol da transparência, um dos mais eficazes antídotos contra a corrupção.
Nos últimos anos, para além do que é ilícito, a atenção da sociedade avançou na direção de questionamentos que envolvem a moralidade dos gastos públicos. Mais do que demandar a punição dos representantes acusados de roubar o que não lhes pertence, tornou-se imperativo o fim de privilégios e mordomias que distanciam o funcionalismo público, políticos e magistrados do resto da sociedade. Como pode parecer minimamente razoável que um deputado federal, cujo salário é de R$ 33.763, receba auxílio-moradia no valor de R$ 4.253 caso dê-se ao luxo de negar um apartamento funcional oferecido — com dinheiro público, diga-se de passagem — pela Câmara? Somam-se a isso valores mensais que variam entre R$ 30.788,66 e R$ 45.612,53, as chamadas Cotas para o Exercício da Atividade Parlamentar, além dos R$ 106.866,59 todo mês para a manutenção de contratos de secretários parlamentares. São valores que, dada a discrepância com a realidade brasileira, além de aprofundar o abismo fiscal das contas públicas, enfraquecem o significado da representação na democracia e refletem uma sociedade de ordens semelhante a do Antigo Regime e suas disparidades históricas. É o Estado promovendo a desigualdade da forma mais perversa.
A ineficiência estatal, entretanto, tendo no cidadão seu maior credor involuntário, não se limita ao desperdício de recursos e ao desvio de prioridades. Através de um arcabouço legal, trabalhista e tributário extremamente complexo, entre outras mazelas, a burocracia brasileira dificulta o desenvolvimento de negócios e torna distante a prosperidade econômica e social. É o que mostra a edição 2019 do relatório Doing Business, do Banco Mundial. Nele o Brasil amarga o 109º lugar, entre 190 nações, no ranking de ambientes para a realização de negócios. Mesmo com uma melhora considerável em relação ao ano anterior – quando o país chegou à posição de número 125, o fraco desempenho em índices que compõem o estudo deixa claro que nossa potencialidade continental é reduzida a resultados vexaminosos revertidos em desemprego, ínfimo investimento em infraestrutura, baixa competitividade e indicadores sociais subdesenvolvidos. A máquina dos privilégios, por outro lado, segue ligada a todo vapor numa constante que desafia qualquer lógica: dificultar, impedir e, ainda assim, extorquir o dinheiro dos trabalhadores e empreendedores.
A boa notícia, porém, a despeito de orçamentos institucionais que beiram o surrealismo e da presença disfuncional do Estado na economia, é que a insatisfação generalizada evidencia o primeiro passo em direção à mudança, e ela depende única e exclusivamente da livre iniciativa e do resgate da ideia de que é o indivíduo, através de seu exercício cidadão, o responsável por alterar os rumos de qualquer situação, seja em pequenos bairros, cidades, estados ou em um país. Mas por onde devemos começar? O voto, ferramenta número um da transformação através da política, não é suficiente. Cabe ao cidadão o acompanhamento permanente do funcionamento do Estado e de seus servidores, e isso não é uma tarefa fácil. A falta de autonomia do contribuinte para administrar o próprio dinheiro, por mais desanimadora que seja, não pode diminuir o interesse em saber para onde está indo o dinheiro conquistado através do seu trabalho. Seu dinheiro está pagando o quê? As contas de quem? Como ele poderia ser mais bem utilizado?
Pensando nisso, com o objetivo de empoderar ainda mais o indivíduo, o Instituto Millenium lança neste mês o Millenium Fiscaliza, projeto que acompanhará de perto os gastos públicos brasileiros. Estaremos de olho no dinheiro que sai do seu bolso, caro leitor, rumo ao desconhecido. A premissa é simples: valorizar ainda mais um dos pilares fundamentais de todas as relações, a transparência. Todo mês, no site do Imil, serão publicados artigos com dados informativos sobre para onde está indo o dinheiro do cidadão, com alertas para as áreas onde ele deveria estar de fato sendo investido. O Millenium Fiscaliza cobrará a melhor gerência dos bens públicos, permitindo uma análise clara dos resultados de governos e seu desempenho financeiro. Somente assim, junto ao trabalho constante da imprensa e de outras organizações, o indivíduo poderá cobrar a atuação responsável e ética de seus representantes. Fique de olho! Nós ficaremos também.