A crise no setor produtivo vai ganhando novos e preocupantes contornos. O contorno de crise financeira das empresas.
O contágio decorrente da piora das condições de mercado é mais um golpe sobre a atividade econômica, já penalizada pela desarrumação da economia nos últimos anos, que cobrou seu preço. Como agravante, após importante esforço para corrigir equívocos passados, o governo perdeu o fôlego e flertou com saídas fáceis, o que levou à perda do grau de investimento pela S&P. Isso em um contexto de baixa capacidade do governo e da política de responder à altura do desafio.
O risco de crise de solvência parece estar surgindo no horizonte.
Há uma rede de conexões no setor real da economia, de forma que a inadimplência ou insolvência de uma empresa gera efeito direto sobre fornecedores, prestadores de serviços e credores, e também indireto sobre parceiros destes, e assim sucessivamente. Movimento em cascata.
Isso significa que, a não ser que, tempestivamente, a política encontre caminhos para avançar na agenda de ajuste da economia, o risco de desestruturação do sistema produtivo aumentará, podendo inclusive contaminar o sistema bancário. É crucial afastar esse cenário de colapso.
Esse novo golpe impacta uma economia já bastante frágil. Os indicadores de inadimplência bancária (4,3% em julho na variação anual) e não-bancária (22,8%) aceleram, enquanto também crescem os pedidos de recuperação judicial (118%) e falência (23%), como indicado pela Serasa.
Na dívida bancária, segundo o Banco Central, os atrasos no pagamento (acima de 15 dias) e a inadimplência (atraso acima de 90 dias) seguem em alta, atingindo na soma 7,4% da carteira de crédito dos bancos. Valores inéditos considerando a série iniciada em 2001. Calculando, alternativamente, um índice da razão entre atrasos mais inadimplência e faturamento nominal das empresas (indústria, serviços e varejo), observa-se uma mudança de patamar no indicador, e para pior. A série, iniciada em 2011, que mostrava relativa estabilidade até meados de 2014, desde então só cresce, com alta de 28% em julho na comparação anual.
[su_quote]É crucial o estímulo e o apoio às medidas de ajuste estrutural da economia[/su_quote]
À luz do aperto das condições financeiras mais recentemente, aliado à queda do faturamento e compressão de margens, o quadro tende a se agravar. A elevação de custos, tanto pela depreciação cambial como pela pressão por reajustes salariais, pressiona margens e pode alimentar novas demissões. Na indústria, o indicador de horas pagas por trabalhador ainda não interrompeu tendência de queda, ainda que suave, mesmo após tantas demissões. Trabalhadores empregados, mas ociosos pressionando custos.
Diante deste quadro de dificuldade do setor produtivo e crise política, o índice de confiança dos empresários testa a cada mês novo recorde de baixa. O dado consolidado das sondagens de confiança da FGV em vários setores – indústria, comércio, construção civil e serviços – atingiu a casa de 70 pontos, em setembro, em um intervalo entre 0 e 100 (índice abaixo de 100 significa pessimismo).
Na sua composição, a componente “situação atual”, que entrou na zona de pessimismo ainda no início de 2014, mostra quedas sucessivas, estando em torno de míseros 50 pontos. O que a pesquisa indica é que as condições dos negócios pioram rapidamente, sem sinal de estarem chegando ao fundo do poço.
Enquanto isso, o componente “expectativas” rompeu a barreira da neutralidade recentemente e engatou tendência de queda (está em 90 pontos). Assim, até poucos meses atrás, os empresários mantinham alguma dose otimismo em relação ao futuro. Desistiram.
Uma recessão prolongada poderá gerar uma desorganização do setor produtivo, que adiará e dificultará a natural volta cíclica do crescimento adiante. Os economistas chamam esse fenômeno de histerese. É quando fatores cíclicos se transformam em estruturais, podendo afetar a capacidade de reação da economia. É como um indivíduo, que depois de período prolongado de enfermidade, não consegue recuperar sua condição física rapidamente, ainda que curado.
Será um importante teste para nossas lideranças impedir uma trajetória de rota de colisão, com nova onda de crise e demissões. É crucial o estímulo e o apoio às medidas de ajuste estrutural da economia.
São tantas as distorções e excessos a serem corrigidos que poderemos nos surpreender com a capacidade de resposta da economia diante do alívio proporcionado por cada medida na direção do ajuste.
Fonte: Agência Estado, 2/10/2015
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