Com crescimento de 0,3% neste ano e 1,4% no próximo, bem inferior ao da média dos emergentes e de outros sul-americanos, o Brasil aparece como um dos países de pior desempenho no cenário divulgado nesta terça-feira pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Em julho, o Fundo previa crescimento de 1,3% este ano e de 2% em 2015. Entre os Brics, só a Rússia está mais atolada, mas a economia russa vem sendo afetada pela crise com a Ucrânia e pelas sanções impostas pelas maiores potências ocidentais.
Os problemas brasileiros são primordialmente internos, segundo o chefe do Departamento Econômico do Fundo, Olivier Blanchard. Essa avaliação contraria o discurso da presidente Dilma Rousseff e do ministro Guido Mantega, habituados a culpar o resto do mundo pelos fiascos brasileiros. Mesmo com alguma recuperação nos próximos anos, em 2019 o produto interno bruto (PIB) do país ainda crescerá apenas 3%, enquanto a economia global avançará 4%, segundo as projeções da nova edição do Panorama Econômico Mundial, principal publicação periódica da instituição.
O Brasil tem crescido pouco por insuficiência de investimento, baixo grau de confiança dos empresários e, neste ano, também por causa da incerteza política, segundo o economista Gian Maria Milesi-Ferreti, diretor adjunto do Departamento Econômico e um dos autores do Panorama. Superada a incerteza política, deverá haver alguma elevação do investimento no próximo ano. Mas a recuperação será ainda insegura, disse.
O novo aperto da política monetária, com aumento dos juros a partir de abril do ano passado, também prejudicou o crescimento, de acordo com o economista. O impacto dessa política deve ainda permanecer por algum tempo, acrescentou, porque seus efeitos são defasados e ainda é preciso esperar o declínio da inflação. A piora do comércio exterior também afetou a economia brasileira, mas os principais problemas, repetiu, são internos.
Mesmo repetindo o mantra das autoridades brasileiras sobre os efeitos defasados do aperto monetário, os economistas do FMI preveem pouca mudança na inflação nos próximos anos. Segundo o Panorama, os preços ao consumidor devem subir 6,2% neste ano e 6% no próximo, projeções muito parecidas com as do mercado financeiro. Esses números indicam a alta acumulada entre janeiro e dezembro. A projeção para 2019 refere-se à média do ano: 4,5%.
Dentro de cinco anos, de acordo com essa tabela, a inflação brasileira ainda estará rodando em torno da meta de hoje. A maior parte dos sul-americanos deverá, como hoje, exibir taxas de inflação inferiores à brasileira. Projeções de prazo tão longo são em grande parte baseadas nas condições atuais da economia e da política econômica, mas embutem, com frequência, algumas apostas otimistas, como, no caso brasileiro, a superação da incerteza política e da insegurança dos empresários.
Peso
Três países – Brasil, Argentina e Venezuela – puxaram para baixo a média de crescimento estimada para os sul-americanos, 0,7% em 2014 e 1,4% em 2015. O PIB argentino deve encolher 1,7% neste ano e 1,5% no próximo. Para a economia venezuelana foram estimadas contrações de 3% e 1%. A situação da maior parte dos demais países é muito melhor, mesmo com alguma desaceleração neste ano.
As previsões incluem taxas de crescimento de 2% e 3,3% para o Chile, 4,8% e 4,5% para a Colômbia, 3,6% e 5,1% para o Peru, 4% e 4% para o Equador, 5,2% e 5% para a Bolívia e 4% e 4,5% para o Paraguai. Alguns fatores externos podem ter afetado os três países, mas os problemas primordiais são internos, disse Milesi-Ferreti, mencionando como exemplo os desajustes macroeconômicos na Venezuela.
O volume do comércio global de bens e serviços deve aumentar 3,8% em 2014 e 5% em 2015, segundo o Panorama. O crescimento econômico dos EUA deve ser um dos principais fatores de dinamização do mercado internacional. Isso ampliará as oportunidades de exportação para muitas economias. Mas a recuperação americana também deverá ser o sinal para um aumento dos juros na maior economia do mundo, provavelmente no meio do próximo ano, lembrou Milesi-Ferretti.
Para enfrentar a mudança no mercado financeiro, os países precisarão de ambiente macroeconômico estável, câmbio flexível para absorção de choques e uma política econômica com muita credibilidade, acrescentou o economista. Pelos dados e previsões do FMI, essas qualificações têm faltado ao Brasil.
Fonte: O Estado de S.Paulo.
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