O Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC), conhecido como Fundo Eleitoral, é um mecanismo ineficiente para garantir isonomia aos cidadãos na democratização do acesso ao poder, segundo estudo produzido pelo Instituto Millenium. Embora o montante de R$ 4,9 bilhões tenha quase dobrado desde a sua criação em 2017, os recursos acabam viciados e destinados aos candidatos que detém maior poder econômico e que já exercem mandato. Estes, recebem – em média – dez vezes mais que os iniciantes.
O escopo do documento, que integra a quarta publicação da série Millenium Papers e é assinado em parceria pela diretora executiva do Instituto, Marina Helena, e pelo advogado Sebastião Ventura. “Uma das premissas da defesa de utilizar recursos públicos em campanhas era que isso democratizaria o acesso ao poder. Mas, ao contrário do que sugere a teoria, os dados mostram que a utilização do fundo vai exatamente na contramão disso. Ela, na verdade, concentra esse poder na elite política que já está lá”, explica Marina.
A partir de uma análise crítica baseada na divisão dos R$ 1,7 bilhões aportados no Fundo Eleitoral em 2018, o estudo revela que apenas naquele ano as 10 maiores legendas receberam 77% dos recursos, enquanto nas últimas eleições para o Congresso (2018), 9 partidos tiveram 50% dos recursos concentrados em menos de 5% dos candidatos.
Já os recursos destinados a candidatos a deputado federal em 2018 mostram que parlamentares em exercício receberam em média R$ 996 mil, mais de 10 vezes o valor médio de R$ 93 mil recebido por candidatos novatos, ou seja, que declaram outras profissões. Além disso, dentre os candidatos que declararam seu patrimônio no pleito de 2018, há maior concentração de recursos alocados em candidatos nas maiores faixas patrimoniais. Candidatos com patrimônio declarado acima de R$ 2 milhões receberam em média R$ 408 mil, mais de 8 vezes o valor médio de R$ 47 mil, recebido por candidatos que declararam patrimônio até R$ 100 mil.
Em contrariedade às evidências reveladas pelo documento, o Congresso Nacional propôs um incremento de R$ 2,1 bilhões para R$ 4,9 bilhões na proposta orçamentária enviada pelo Executivo neste ano; por esse motivo, está sendo discutido no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação do partido Novo que alega inconstitucionalidade no reajuste e que deve começar a ser julgada nesta quarta-feira (23).
Aumento de recursos em meio à crise
Diante da crise sanitária e econômica, altos índices de desemprego, o Brasil detém o maior fundo público de financiamento de campanhas eleitorais do mundo, concentrado em candidatos que já exercem mandato e inviabilizando a alternância no poder, distanciando os políticos das demandas populares e prejudica o fortalecimento das bases partidárias e ideológicas. Além disso, o estudo destaca que o aumento desenfreado do Fundo Eleitoral fere o sistema de pesos e contrapesos democráticos, crescendo ano a ano e sendo sequestrado por um séquito de parlamentares e partidos.
Para exemplificar a premissa, o Fundo Eleitoral é mais de sete vezes o orçamento da ANVISA e mais de vinte e oito vezes o valor destinado à prevenção de desastres pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, órgãos de vital importância no contexto de pandemia.
Alocação dos recursos e inconstitucionalidade
O estudo ainda revela que o valor de R$ 4,9 bilhões previstos no Fundo Eleitoral permitiriam construir 7,8 mil unidades básicas de saúde ou restituir R$ 47,30 em impostos para cada um dos 103,6 milhões de brasileiros economicamente ativos.
Por fim, os autores observam que a gestão de fundos públicos partidário-eleitorais fere os princípios da impessoalidade e transparência também de pesos e contrapesos que balizam as democracias, ferindo o princípio de igualdade constitucional (art. 5°, CF) por meio da perpetuação de grupos no poder e sublinha a importância da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o aumento do Fundo Eleitoral durante julgamento da ação direta de inconstitucionalidade que questiona o aumento do valor aprovado pelo Congresso.
“O Fundo legitima a captura do orçamento público por partidos e parlamentares, para garantir sua perpetuação no poder. Esse estudo espera contribuir para o debate, no sentido da criação de um mecanismo de freios e contrapesos que evite que isso aconteça”, finaliza Marina.
Pesquisa de opinião
No mesmo dia, o Instituto Millenium divulga também o resultado de uma pesquisa de opinião inédita, encomendada em parceria com os Institutos Locomotiva e Ideia. Nela, os entrevistados se mostraram em consonância com o resultado do paper. Mesmo sem conhecer os números, 68,9% disseram que a distribuição do fundo faz com que os mesmos sejam sempre eleitos, 65,6% discordaram que ele torna a eleição mais justa entre ricos e pobres, e 77,3% acreditam que ele não acabou com a corrupção, nem com o caixa 2 nas campanhas.
Além disso, a maioria expressiva (75,7%) dos 2 mil entrevistados se disse contra a existência do fundo eleitoral, nove entre 10 acham que o STF deveria reduzir o valor, e 96% preferiria que esse dinheiro estivesse sendo aplicado na Saúde e na Educação.
* Assessoria de Imprensa – GBR Comunicação