Política anticíclica é assim: por um motivo qualquer, as pessoas deixam de consumir, as empresas deixam de produzir e de investir, isso reduzindo a demanda; aí vem o governo e eleva seus gastos, dando um “estímulo fiscal” para esquentar a demanda e acelerar a atividade econômica.
Em tese, qualquer gasto público faz esse papel, mas há uma diferença importante. Se faz sentido elevar o gasto público quando a demanda privada se retrai, necessariamente estará certo fazer o contrário, ou seja, o governo reduzir suas despesas e investimentos quando a demanda privada está aquecida.
Daí a diferença: é melhor que os gastos públicos sejam de tal natureza que possam ser encerrados num determinado momento. Por exemplo: construir um viaduto. A festa de inauguração é a última despesa.
É o contrário quando o governo contrata mais pessoas e/ou concede reajuste salarial para o funcionalismo, especialmente no regime brasileiro. Esse tipo de despesa é para sempre, já que é impossível demitir funcionários e reduzir salários.
Ou seja, aumentar gastos com pessoal (e com previdência, custeio e programas sociais) terá um efeito, secundário, de esquentar a demanda, mas não é, a rigor, política anticíclica. Para fazer isso, o governo precisa se organizar de tal modo que possa encolher seus gastos nos momentos de bonança do setor privado e aumentá-los em crises como a atual.
Há um aspecto adicional nessa história. Em momentos de forte crescimento econômico, cresce a arrecadação de impostos. Qual o comportamento prudente? O governo fazer caixa, criar fundos, para gastar na recessão, quando caem a demanda geral e as receitas tributárias.
Esse caixa não é infinito, claro. Por isso mesmo, seus recursos precisam ser aplicados em projetos igualmente “finitos” – viadutos, estradas, portos, aeroportos etc., ou seja, em infraestrutura, que é uma acumulação de capital. Sem contar que tais obras melhoram a eficiência da atividade econômica.
Nesse sentido, o governo Lula não está fazendo política anticíclica. O diagnóstico é fácil: o governo eleva seus gastos em todos os momentos, na alta e na baixa da atividade econômica.
No ano passado, por exemplo, que foi de forte crescimento e extraordinário ganho de arrecadação até outubro, o governo concedeu aumentos salariais generalizados, compromissos que precisa cumprir agora, com as receitas em baixa e quando deveria era gastar mais em investimentos. Mas esses constituem a menor parte do gasto público, algo como 3,5% da despesa geral, no primeiro trimestre deste ano.
E, para prevenir reclamações, esclareçamos logo: é claro que o governo precisa contratar e pagar bem a seus funcionários. Mas isso deve ser feito tendo em vista o tipo de serviço público prestado, a eficiência e a produtividade dos funcionários, e nunca com o objetivo de esquentar a demanda.
A falta dessa visão e o entendimento de que o governo deve gerar emprego, tão comum por este Brasil afora, geraram as prefeituras cuja receita é quase inteiramente utilizada em pagar funcionários, que, entretanto, não prestam serviços porque não sobra dinheiro para financiá-los. Esse é um retrato que cabe na maior parte dos 5 mil municípios brasileiros. Serve também para alguns governos estaduais e, em parte, para o governo federal.
Neste último, costuma faltar gente nos serviços essenciais – educação, saúde, segurança – enquanto há excesso de funcionários em Brasília. Não por acaso, estes funcionários ganham mais do que aqueles que estão nas salas de aula, nos postos de saúde ou perseguindo bandidos.
Nesse aspecto, é fraco o desempenho do governo Lula. Aumentou o tamanho da máquina pública, elevou gastos com custeio e pessoal, e não se notam ganhos proporcionais na eficiência do serviço prestado ao público.
(O Globo – 21/05/2009)
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