Mecanismos para contenção de despesas previstos na própria regra que criou o teto de gastos, podem, se forem acionados, levar o governo a economizar R$ 40 bilhões ao longo de dois anos, aponta estudo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal.
Chamados de “gatilhos”, esses mecanismos são restrições impostas ao poder público, entre elas à realização de concursos públicos, aumento de despesas obrigatórias, reajuste de salários do funcionalismo e do salário mínimo.
Eles podem ser acionados no caso de descumprimento do teto de gastos, regra criada em 2016 e que limita o aumento das despesas do governo. O objetivo dessa medida é auxiliar nos esforços para reduzir o rombo das contas públicas.
A divulgação do estudo da IFI ocorre num momento em que se tornaram públicos embates dentro do governo em torno de propostas para driblar o teto de gastos e ampliar os investimentos públicos no ano que vem, e que repercutiram no meio político e no mercado financeiro.
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De acordo com o estudo, ao disparar os gatilhos o governo evitaria descumprir o teto e, os R$ 40 bilhões de economia, equivalentes a 0,5 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB), poderiam justamente ser usados em novas despesas.
“Deve-se explorar com cuidado o futuro do teto de gastos e preservar a sua essência, viabilizando, se necessário, por ora, o acionamento dos chamados gatilhos ou medidas automáticas de ajuste previstos na Emenda Constitucional (EC) nº 95. Uma vez acionados, os gatilhos produziriam um ajuste de cerca de 0,5 ponto percentual do PIB, em dois anos, pelas contas da IFI”, diz o documento.
O governo está finalizando a proposta de orçamento para 2021 e existe uma disputa entre ministérios para manter e elevar os recursos disponíveis para o ano que vem, num cenário de restrições imposto pelas regras do teto de gastos.O Ministério da Educação, por exemplo, prevê redução de seu orçamento em R$ 4,2 bilhões no ano que vem.
Reforma fiscal
Segundo a Instituição Fiscal Independente, o acionamento dos gatilhos existentes no teto de gastos “daria tempo, inclusive, para que o Congresso e o Poder Executivo endereçassem eventuais discussões e alterações no arcabouço vigente, se assim desejassem.”
Questionado pelo G1, o diretor-executivo da IFI, Felipe Salto, avaliou que uma reforma fiscal pode ser necessária nos próximos anos.
Ele lembrou que a lei aprovada prevê a possibilidade de revisão das regras do teto depois de 10 anos do início da sua validade. Mas Salto diz acreditar que “vai ser praticamente impossível chegar até 2027 sem mudar algo.”
“Então, que isso seja feito, se for o caso, de maneira coordenada”, acrescentou ele.
No estudo, a IFI avalia que uma reforma fiscal “mais ampla” poderia aproveitar os vários dispositivos contidos nas Propostas de Emenda Constitucional nos 186, de emergência fiscal e 188, do pacto federativo. Ambas propõe o corte de jornada e de salários dos servidores, de 2019, que tramitam no Senado Federal, bem como na proposta no 423 – que muda a “regra de ouro” e propõe novos gatilhos para conter gastos obrigatórios – que está na Câmara dos Deputados.
Manobras contábeis
No estudo, a Instituição Fiscal Independente observou que as notícias de que setores do governo têm “buscado mecanismos de viabilização de despesas que não afetem o teto de gastos têm se tornado cada vez mais frequentes”.
“Pouco a pouco, a percepção de comprometimento com a sustentabilidade das contas públicas tem sido abalada”, acrescentou.