Tenho ouvido frequentemente a seguinte pergunta: “Por que se preocupar tanto com o crescimento se há pleno emprego?”. Na mesma linha, apareceu nova afirmação: “Ninguém come PIB”. Em comum, tratam de reduzir o peso atribuído ao crescimento econômico em troca de variáveis mais facilmente observáveis, como emprego ou o consumo de alimentos.
Como deve ser claro, exceto talvez por quem que tenha caído de paraquedas no meio do debate, trata-se de um caso clássico de uvas verdes. Os mesmos que hoje relativizam a importância do crescimento há pouco alardeavam a aceleração da economia no período 2003-2010, quando a expansão média se situou em torno de 4% ao ano, implicando aumento do PIB per capita da ordem de 2,8% anuais.
Independentemente disso, porém, é bom deixar claro por que a preocupação com crescimento é, sim, válida e por que vai bem além da questão do emprego e da comida. Não há dúvida de que tê-los é uma fonte de satisfação para todos nós, assim como o foi o fim da hiperinflação. O reconhecimento desta garantiu duas eleições a Fernando Henrique Cardoso, ambas com vitória em primeiro turno. Aquelas, por sua vez, traduziram-se em votações expressivas para Lula em 2006 e Dilma em 2010.
A verdade, porém, é que queremos sempre mais. Fôssemos uma espécie acomodada, não teríamos saído das savanas para nos espalhar mundo afora, e a história humana é, em boa parte, a crônica da luta incessante para melhorar as condições de vida. Isto dito, não escapa a ninguém a melhora extraordinária observada nos últimos 250 anos, quando a renda per capita mundial quase decuplicou, saindo de valores próximos a US$ 600 para algo como US$ 6.000.
Em contraste, estimativas sugerem que no ano zero a renda per capita equivalia a cerca de US$ 450, valor que permaneceu praticamente inalterado por mil anos, crescendo lentamente para os valores ao redor de US$ 600 observados no fim do século 18. As condições de vida que hoje observamos são reflexo direto da dramática aceleração do crescimento.
De volta ao Brasil, ao ritmo observado entre 2003 e 2010 nossa renda per capita dobraria a cada 25 anos; no ritmo registrado de 2011 a 2013 (ou 2014), contudo, seriam necessários 65 anos para obtermos o mesmo resultado. A equação do crescimento é, portanto, simples: queremos dobrar nosso padrão médio de vida para nossos filhos ou teremos que esperar até depois de nossos netos? A insatisfação que aos poucos transparece na sociedade brasileira sugere que a resposta não está na segunda alternativa.
Adicionalmente, tomando emprestada a saudável obsessão do meu coautor no livro “Complacência”, Fabio Giambiagi, com temas previdenciários, há promessas (feitas à minha geração e a outras) que não poderão ser cumpridas sem crescimento mais vigoroso que o atual.
Não se trata de um problema para hoje, bem entendido, mas, considerando que o país já gasta com aposentadorias e pensões o equivalente ao que gastam países com uma proporção de idosos na população três vezes maior que a nossa, parece claro que, sem a aceleração da nossa taxa de crescimento sustentável, teremos um encontro marcado com um problema sério daqui a 15 ou 20 anos.
O argumento, portanto, de que crescimento é secundário para a satisfação numa economia em pleno emprego é apenas uma justificativa (ruim) para o fracasso da “nova matriz macroeconômica” que (lembram-se?) nos levaria aonde neoliberal algum jamais esteve.
Sem uma mudança dramática de ênfase na política econômica, que passe a privilegiar investimento sobre consumo, produtividade sobre favores governamentais e forças de mercado sobre as intervenções desastradas que marcam a atual administração, o crescimento não se acelerará.
E, mais cedo ou mais tarde, os apologistas de plantão aprenderão que a gente não quer só comida, mas diversão e arte e, principalmente, uma saída para qualquer parte (salve Titãs!).
Fonte: Folha de S. Paulo, 09/04/2014
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